“A guerra na Ucrânia deixou-me mais forte, também psicologicamente. Já não encaro os momentos difíceis como catástrofes porque há coisas piores na vida.”

O facto de ter comprado bilhetes para o concerto de Harry Styles em Viena no último fim de semana prova que a própria não considerava sequer a possibilidade de poder chegar pelo menos aos oitavos do torneio de Wimbledon – sendo que essa situação já está resolvida, com o próprio cantor inglês a escrever à tenista para garantir que teria lugar num dos quatro outros espectáculos que terá nos próximos dias. Afinal, não era um quadro fácil. Venus Williams, que tinha também um wildcard para a 24.ª presença na prova. Elise Mertens, bem mais à frente no ranking WTA. Sofia Kenin, que pela forma como afastara Coco Gauff parecia apostada a chegar a nova final do Grand Slam. Viktoria Azarenka, também ela mãe recentemente. Iga Swiatek, número 1 do mundo e amiga próxima. Quem apareceu, caiu. Mas ainda havia mais contas por acertar.

Foi mãe, voltou, venceu número 1 mundial, está nas meias e tem Harry Styles garantido: depois das lágrimas, Svitolina começa a sorrir

A história de Elina Svitolina já arrebatou há muito os corações dos adeptos britânicos, que só mesmo naquele jogo a abrir com a norte-americana Venus Williams não estiveram maioritariamente ao seu lado. Aliás, o difícil mesmo é escolher a perspetiva que faz imperar essa química: o regresso ao melhor nível de jogo após a paragem no circuito que lhe permitiu igualar o registo mais alto num Grand Slam que vinha desde 2019; o facto de ser sido mãe há nove meses (ainda para mais com outra cara conhecida do ténis, Gaël Monfils), o que motivou essa longa ausência que parou há três meses; a maneira como tem sido uma das principais caras no desporto ucraniano a pedir o fim da guerra. Agora, deparava-se com um encontro histórico na carreira aos 28 anos. E tinha pela frente a adversária que lhe ganhou no outro encontro histórico na carreira.

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Depois de um percurso nos Jogos Olímpicos de Tóquio onde foi eliminando jogadoras como Maria Sakkari ou a surpreendente Camila Giorgi, Svitolina acabou por cair nas meias-finais frente a Markéta Vondrousová, checa que assumiu o papel de grande surpresa no quadro feminino de singulares a par da campeã Belinda Bencic. Com isso, a possibilidade de ganhar uma medalha na principal competição desportiva mundial ficou mais complicada, caindo de vez na luta pelo bronze com Elena Rybakina. A cazaque, campeã em título de Wimbledon, caiu nos quartos frente a Ons Jabeur. A ucraniana e a checa discutiam a primeira vaga na final de 2023, sendo que no encontro seguinte a tunisina iria enfrentar a bielorrussa Aryna Sabalenka.

Aos 24 anos, Vondrousová continua a mostrar que é capaz do melhor e do pior – e que quando está no seu melhor, é uma jogadora de top, como se viu não só nessa prata olímpica em Tóquio mas também na final de Roland Garros em 2019. Daí para cá, nunca passara da quarta ronda de um Grand Slam; agora, na sequência de um caminho onde afastou Veronika Kudermetova, Donna Vekic, a compatriota Marie Bouzková e Jessica Pegula com uma recuperação fantástica que deixou a própria incrédula, estava a um triunfo de nova final de um Major. Não perdoou. E aquele que foi dia menos conseguido de Svitolina nesta edição de Wimbledon acabou por cruzar com o melhor jogo de Vondrousová, que ganhou num encontro que teve 1h14.

O encontro até começou com o esperado equilíbrio nos quatro primeiros encontros de serviço mas foi aí que se viu uma viragem radical na marcha de rendimento das duas jogadoras, com Svitolina a começar a somar vários erros não forçados no fundo do court e até nas subidas à rede e Vondrousová a ganhar pontos que pareciam impossíveis mas que mostravam bem a confiança com que estava a jogar. Com isso, o 2-2 passou para 6-3 a fechar o primeiro set. Com isso, o 2-2 em jogos passou para oito em nove triunfos da checa logo a seguir até ao 3-0. A ucraniana procurava a sua melhor versão sem saber se isso seria suficiente.

O que estava no resultado não era a real diferença entre as jogadoras mas refletia o confronto entre o melhor de uma jogadora e o pior de outra. Era por isso que o quarto jogo do segundo set parecia quase decisivo para o resto da partida, com Svitolina a chegar com pontos muito consistentes e bem trabalhados ao 40-15 antes de Vondrousová acelerar o seu jogo com bolas fantásticas em catadupa até chegar aos pontos de break nas vantagens entre erros que caíam então para os dois lados. Ao quarto, chegou mesmo o 4-0. E a checa só tinha depois de gerir a sua vantagem até ao final. No entanto, a ucraniana de 28 anos tinha mais uma vida.

Quando a partida caminhava para o seu epílogo, Svitolina conseguiu aproveitar uma fase em que o primeiro serviço da checa deixou de entrar, fez o primeiro break da partida, segurou o seu encontro de serviço com uma grande confiança perante os erros da adversária e voltou a quebrar o serviço de Vondrousová quando nada parecia sair. Wimbledon acreditava numa meia-final prolongada e com a sua “menina querida” a ter possibilidade de discutir ainda o encontro com o 4-3 mas esse oitavo jogo seria o decisivo, com Svitolina a voltar a perder o seu serviço e a estender a passadeira para a checa tornar-se a primeira jogadora não cabeça de série na Era Open e a segunda com ranking mais baixo a chegar à final de Wimbledon.