Foi quase um reinado que se criou, com ou sem coroa. Desde 2007, quando Nelson Évora se sagrou campeão mundial em Osaka a preparar aquele que seria o seu maior salto da carreira para o ouro olímpico em Pequim no ano seguinte, Portugal teve sempre pelo menos um atleta na final do triplo salto dos Mundiais. Por sinal isso acabou muitas vezes (ou quase sempre) por significar a conquista de uma medalha mas havia quase uma “cábula” para os adversários, que tinham em conta a existência de um atleta nacional nas contas dos 12 que entravam na decisão pelo pódio. Este ano, em Budapeste, não foi exceção. Contudo, noutras condições.

O legado de Évora e Pichardo foi mantido: Tiago Pereira coloca Portugal numa final do triplo salto pela oitava edição consecutiva

Primeiro houve a era Nelson Évora. Ganhou a medalha de ouro em Osaka-2007 com qualificação a 17,22 e vitória a 17,74 que estabeleceu um novo recorde nacional. Ficou com a prata atrás do britânico Phillips Idowu em Berlim-2009, com 17,44 no apuramento e 17,55 na final. Acabou em quinto em Daegu-2011, com 17,20 na qualificação e 17,35 na decisão. Recuperou de lesões para conquistar o bronze em Pequim-2015 atrás de Christian Taylor e Pichardo (então por Cuba), com 17,01 no apuramento e 17,52 na final. Ainda conseguiu mais um bronze em Londres-2017 atrás de Taylor e Will Claye, com 16,94 na qualificação e 17,19 na decisão.

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A seguir, começou a era Pedro Pablo Pichardo. Terminou em quarto em Doha-2019 perdendo o pódio para Taylor, Claye e Hugues Fabrice Zango com 17,38 na qualificação e 17,62 na final (Nelson Évora não passou a fase de apuramento com 16,80), conquistou a medalha de ouro em Oregon-2022 com 17,16 no apuramento e 17,95 no primeiro salto da final. Nos EUA, também Tiago Pereira chegou à final, com 16,69 na qualificação e na final que lhe valeram o décimo lugar. Agora, perante a lombalgia do campeão olímpico, mundial e europeu que forçou à desistência ainda antes do arranque dos Mundiais, era no saltador de 29 anos que recaíam as atenções nacionais, sendo que um cenário de medalhas estava quase colocado de parte.

Integrado no grupo B de qualificação, Tiago Pereira teve duas tentativas iniciais com nulo mas conseguiu depois fazer um salto a 16,77 que lhe valeu a melhor marca do ano e o apuramento para a final com o nono melhor registo combinado da qualificação. Olhando para o que fez por exemplo nos Europeus de Pista Coberta de Istambul em março, quando ficou em quarto lugar a seis centímetros da medalha de bronze, os indicadores eram positivos. No entanto, e vendo a concorrência que teria pela frente, o saltador do Sporting partia como outsider, tendo em conta as presenças de Jaydon Hibbert (jamaicano que foi o único apurado de forma direta com 17,70), Yaming Zhu (China, 17,14), Lázaro Martínez (Cuba, 17,12), Hugues Fabrice Zango (Burquina Faso, 17,12) ou Cristian Nápoles (Cuba, 16,95), entre outros.

“O meu primeiro objetivo era conseguir season best, não era muito difícil com a época que tive [16,51], e o segundo era estar na final. Consegui ambos. Agora, vamos aos outros objetivos que é conseguir o recorde pessoal e marca para os Jogos. Quero estar na luta por objetivos maiores. O primeiro salto foi incrível. É um salto que dá a sensação que podes estar na luta com os melhores dos melhores. Passei um pouco a tábua, mas caí bem acima dos 17 metros. Até olhei para o lado e fiquei admirado com a marca depois de um ano destes. Depois, estava a sentir-me bem, vi as marcas e percebi que não era preciso assim tanto e que não podia ficar de fora. Se as coisas correrem bem, e com sorte, que também é preciso, consigo fazer algo bonito na final”, assumira Tiago Pereira após a qualificação do triplo salto, em declarações à agência Lusa.

Ficando na quarta posição entre a ordem dos 12 atletas, Tiago Pereira voltou a não ter um início de concurso fácil com um primeiro salto apenas a 16,26 e uma segunda tentativa nula. Entre os principais candidatos, a surpresa acabou por ser o jovem fenómeno Jaydon Hibbert, que sentiu um problema na coxa na primeira tentativa que foi nula e acabou por prescindir do segundo salto. Lá na frente, Zango começou na liderança com 17,37 mas Lázaro Martínez não demorou a responder com 17,41 na segunda tentativa. Yaming Zhu (17,12), Cristian Nápoles (17,02) e Yaoqing Fang (17,01) também já estavam acima dos 17 metros. Ao contrário do que tinha acontecido na qualificação, o terceiro salto não saiu e o português acabou em 11.º.

Hibbert foi forçado também a passar a terceira tentativa e abdicou de uma derradeira hipótese de arriscar uma medalha que se perfilava como provável depois do grande salto na qualificação. Assim, a discussão da vitória iria passar por nomes mais “conhecidos” e com maior experiência no atletismo internacional, com Nápoles a intrometer-se na discussão com o melhor resultado do ano a 17,40 que o colocava na segunda posição só atrás do compatriota Martínez. No entanto, havia ainda um último capítulo em falta: na quinta e penúltima tentativa, Hugues Fabrice Zango chegou aos 17,64 e assegurou a medalha de ouro à frente dos dois cubanos, conquistando a primeira vitória após o bronze de 2019 e a prata de 2022.