O líder do maior partido da oposição timorense, a Fretilin, criticou este domingo a decisão “extrema” da junta militar de Myanmar expulsar o encarregado de negócios de Timor-Leste, vincando que toda a liderança é consistente na defesa dos mesmos princípios.

“A questão da junta militar não participar nas reuniões da ASEAN demonstra que é a junta que está a excluir Myanmar da ASEAN e por isso mesmo a nossa posição é coerente”, disse à Lusa o secretário-geral da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin), Mari Alkatiri.

“Queremos ser membro da Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) mas não queremos trair os valores e princípios pelo que lutamos, a afirmação de liberdade, paz, democracia e respeito pelo Estado de direito e pelos direitos universalmente reconhecidos”, considerou.

Alkatiri, contactado telefonicamente em Lisboa, onde se encontra em visita, reagia à decisão da junta militar do Myanmar (antiga Birmânia) ordenar a expulsão do encarregado de negócios de Timor-Leste, em protesto com posições recentes das autoridades timorenses sobre aquele país.

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“O Ministério dos Negócios Estrangeiros em nome do Governo da República da União de Myanmar pede ao encarregado de negócios da embaixada da República Democrática de Timor-Leste, senhor Avelino Fernandes Ximenes Pereira, para deixar o Myanmar o mais tardar até 01 de setembro”, refere-se numa nota da diplomacia daquele país a que a Lusa teve acesso.

Na nota de duas páginas, a junta militar aponta o que considera ser vários atos cometidos pelas autoridades timorenses, incluindo referências à situação no país pelo Presidente da República timorense, José Ramos-Horta.

Alude ainda a declarações do primeiro-ministro Xanana Gusmão que a 03 de agosto disse que Timor-Leste poderia não aderir à Associação de Nações do Sudeste Asiático (ASEAN) se o organismo regional for incapaz de encontrar uma solução para o conflito no Myanmar.

“Enquanto for primeiro-ministro não entra na ASEAN se a ASEAN não convence a junta militar, se não encontrar uma solução. Somos uma democracia . Podemos ter problemas, mas não há golpes de Estado, há respeito pelas eleições presidenciais e parlamentar, mostrando ao mundo que nós temos uma cultura democrática”, disse Xanana Gusmão na altura.

Esses comentários levaram o Governo de Myanmar a convocar o encarregado de negócios, para um voto de protesto a 15 de agosto.

“As declarações imprudentes e irresponsáveis do primeiro-ministro não são apenas prejudiciais par a manutenção das relações bilaterais entre Myanmar e Timor-Leste, mas também negligenciam de forma grosseira os contínuos ataques violentos do grupo terrorista chamado de Governo de Unidade Nacional (NUG)”, refere a nota datada de 25 de agosto.

Mari Alkatiri disse que a posição de Timor-Leste demonstra coerência e respeito pelos “princípios e valores e convenções internacionais que o país ratificou”, considerando a decisão de expulsão uma “posição extrema”.

E considera que a decisão de expulsão “só veio comprovar que o regime não entendeu a posição de Timor-Leste, expressa pelo primeiro-ministro”.

O líder da Fretilin disse que Timor-Leste mantém, há décadas, a vontade de ser membro da ASEAN — organização regional de que Myanmar faz parte e onde Timor-Leste tem estatuto de observador — e que todos devem compreender a posição do país, vincada na sua própria história.

“Nós, os líderes de liberação nacional, viemos de uma luta muito difícil, mas conseguimos rapidamente entender-nos com o Governo indonésio, reconciliamo-nos com a Indonésia, depois deste prolongado conflito de 24 anos demonstrado sentido de Estado”, afirmou.

“Isso foi uma demonstração de coerência e consistência do nosso lado de que questões do passado, ainda que pendentes, não são de conflito e problemas. E acho que toda a ASEAN deve compreender isso”, afirmou.