O primeiro contacto com o ministro Fernando Medina sobre o Orçamento para o próximo ano deixou a oposição a queixar-se de insuficiências várias, a começar pela redução do IRS prometida e que adivinham estreita. Mas a crítica mais repetida à esquerda é antes pela parte do copo que está a vazar. O excedente orçamental previsto para este ano e o próximo são vistos como um mau sinal numa altura de emergência social e quando a crise está a chegar à classe média.

O ministro das Finanças não mostrou muito da proposta e, nas primeira reuniões, o PSD saiu mesmo de mãos a abanar sobre as perspetivas económicas sobre as quais o Governo está a desenhar o Orçamento. Só mesmo quando a Iniciativa Liberal saiu da reunião com Medina é que se soube que o crescimento deste ano ficará em linha com o previsto (aumentará entre 2,1% e 2,2%), mas para o próximo ano recuará para os 1,5%, com o ministro a repetir aos vários interlocutores da manhã que a responsabilidade é externa e que as dívidas de Itália e França estão a colocar a zona euro sob forte pressão. Além disso, o PAN acrescentou ainda que Medina espera que no próximo ano a inflação fique abaixo da previsão que tinha sido estimada (5,1%), detendo-se nos 4,6%.

Quanto ao saldo orçamental, o primeiro-ministro já tinha dado como certo o excedente deste ano e Medina confirmou-o aos partidos, dizendo que ficará, no entanto, abaixo de 1% do PIB. Para o próximo ano, a previsão do ministro é de um défice próximo do zero, segundo relatou no final da reunião o deputado João Cotrim Figueiredo.

“A grande novidade é relativa à existência da previsão do Governo de um excedente para o ano de 2023, o que mostra como durante o ano de 2023 o Governo não está a fazer tudo o que podia para ajudar as pessoas num momento tão difícil, seja na habitação, seja nos serviços públicos, seja no salário”, referiu Pedro Filipe Soares, do BE, depois do encontro com o ministro das Finanças. Para o líder parlamentar do BE, o Governo tem “insensibilidade social” e mostra ter como prioridade “ser o cobrador de fraque” e não responder às dificuldades das pessoas.

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Também no Livre Rui Tavares seguiu esta mesma linha. “Não nos digam que o país não tem folga porque tem dívida pública e que tudo tem de ir para pagar dívida pública. Um país que só paga dívida pública às tantas nem dívida pública paga porque não há dinheiro para o investimento, nem para a emergência social, nem para uma reforma fiscal progressiva, que diminua peso dos impostos sobre o trabalho e sobre a classe média e média/baixa”, declarou o deputado único do Livre nos Passos Perdidos.

No PCP, Paula Santos também não ouviu em nada do que foi referido pelo ministro na reunião “resposta” para as questões prioritárias e enumerou várias: o aumento do salário mínimo, a rede de creches gratuitas, o aumento dos salários e pensões, a valorização de carreiras na Administração Pública e ainda “pôr o lucro dos bancos a pagar o aumento das taxas de juro”.

Reduzir o IRS, mas pouco

Já no PSD, Joaquim Miranda Sarmento revelou que o Governo se prepara para fazer uma redução “bastante inferior” do que aquilo que o PSD propôs, seguindo o que já estava inscrito no Programa de Estabilidade. O líder parlamentar social-democrata disse que Medina mostrou que não se “afastaria” do que já estava no documento (e que prevê uma redução de 525 milhões em 2024, menos de metade do que o PSD prevê na sua proposta).

“Apenas na Habitação, em matérias fiscais, a redução de impostos sobre construção” (no caso, o IVA) e a redução do IRS e IRC sobre arrendamentos pode haver alguma abertura do Governo para propostas do PSD, resumiu o deputado. Medina “não fechou a porta” e pareceu “relativamente recetivo”, reconheceu o social-democrata que, ainda assim, considerou que “este OE segue a linha dos Orçamentos anteriores e os portugueses vão continuar a pagar impostos máximos para serviços mínimos”.

André Ventura pareceu sair com a maior novidade da manhã, mas nem as Finanças nem os restantes partidos que se reuniram com Fernando Medina confirmaram que haverá um “apoio direto” às rendas para fazer face ao aumento calculado para o próximo ano (6,9%). O primeiro-ministro disse no início da semana, em entrevista à TVI, que o Executivo ainda está a estudar uma solução para travar esse impacto, mas avisou que não será igual ao tecto de 2% imposto ao aumento das rendas este ano. E também disse que não o fará porque é preciso “equilíbrio”, entre os interesses dos inquilinos e a proteção da confiança dos proprietários — que quer que coloquem mais casas no mercado.

Travão às rendas, salário mínimo e pensões. O que Costa promete para o próximo ano

O líder do Chega também disse aos jornalistas que Medina tinha feito saber que em 2024 vai manter o desconto nos combustíveis, através da devolução do IVA a mais cobrado que resulta do aumento dos preços. E avançou que vai estar atento à promessa do fim das cativações, dizendo que o próprio ministro disse na reunião que as Finanças “deixarão de ter controlo sectorial sobre os ministérios”.

Já o PAN parece acreditar vir a ter ganhos na negociação com o PS, no processo orçamental, com Inês Sousa Real a sair da reunião com Medina a dizer ter visto abertura do Governo para analisar uma redução do IVA nos serviços médico-veterinários. Para a deputada estas despesas já representam um encargo de 12% para as famílias e, por isso, “é um sinal positivo” essa possibilidade. Para os jovens pediu a reposição do crédito bonificado. “O Governo transmitiu-nos que seria uma medida mais abrangente que o crédito bonificado”, mas não detalhou mais do que isso mesmo.