Por norma, e com grande dose de mérito próprio à mistura, os jogos do Sporting na presente época merecem ser contados do início para o fim. Porque, na maior parte das vezes, são bem jogados, têm harmonia, fazem sentido e até mesmo quando não ganham prolongamento no resultado por quebras físicas como aquelas que se acontecem nestas últimas semanas de maior densidade competitiva percebe-se a razão para isso. Lá está, é uma questão de lógica. No entanto, a eliminação dos leões da Liga Europa frente à Atalanta deve ser contada a partir do fim e a dois níveis, do festival de golos falhados a fechar à própria reação de Rúben Amorim.

“Olho para este jogo com frustração e zangado porque tivemos o jogo na mão, tivemos tudo para ganhá-lo. Fomos a melhor equipa. No início, os lances da Atalanta fomos nós a dá-los. Se olharmos para os 90 minutos, fomos superiores mas sofremos quando não podíamos. Foi como na fase de grupos, fomos penalizados por isso. Sobra a frustração mas agora há que seguir em frente. Não há outra forma de olhar para o jogo. Criámos oportunidades e não conseguimos marcar. O que mais me custa é que tínhamos o jogo na mão. A forma como sofremos os golos, não foi em lances de pressão. Tínhamos a bola na saída e depois num lançamento… Essas coisas custam e temos de crescer nestes aspetos porque faz a diferença”, comentou.

Com Morita de fora por se ter sentido pior no momento em que a equipa chegou ao aeroporto e Coates a ser “resguardado” não tanto por uma questão de gestão física mas mais para fugir a potenciais problemas que levassem a uma paragem mais prolongada, Rúben Amorim deixou apenas os alas Geny Catamo e Nuno Santos de fora entre as opções iniciais, promovendo o regresso de Pedro Gonçalves ao meio-campo ao lado do indiscutível Hjulmand. A ideia passava por assumir o encontro com bola mesmo que explorando sempre que possível as transições mas foi a Atalanta que passou essa teoria à prática com algo que ia faltando ao jogo leonino: verticalidade e pragmatismo. Scamacca deixou um primeiro aviso a Franco Israel, Djimsiti ainda acertou na trave na sequência de um canto, Kolasinac também ficou perto do golo numa bola parada.

Depois, foi havendo mais Sporting. O recurso ao passe longo para esticar jogo em Gyökeres continuava a ser uma arma recorrente mas foi de outra forma mais parecida com o futsal que os leões inauguraram o marcador: Pedro Gonçalves combinou com o sueco, o avançado qual pivô recebeu de costas para a baliza antes de assistir o internacional português para a entrada e estava feito o 1-0 (34′). Problema? O que se passou a seguir. E se inicialmente não se percebeu ao certo o porquê das lágrimas após marcar mais um golo na competição que o tornou célebre por aquele pontapé quase do meio-campo frente ao Arsenal na última temporada, de seguida a entrada em campo de Daniel Bragança contou o resto de uma história que pode deixar o jogador algum tempo de fora – sendo que a desejada chegada à Seleção tornou-se uma miragem.

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Em vantagem ao intervalo frente a uma Atalanta que habitualmente nunca acaba os encontros sem marcar qualquer golo, o Sporting teve depois aquele que foi o seu pecado capital: “ajudar” com erros próprios quem não precisa de ajuda. Foi assim que, logo no reatamento, Lookman apareceu ao segundo poste depois de bola ter passado por três defesas verde e brancos para encostar e fazer o empate a um (46′). Foi assim que, pouco depois, Scamacca recebeu de Miranchuk na área para voltar a bater Franco Israel com excesso de espaço para se enquadrar e atirar sem hipóteses (59′). As ações defensivas nos duelos 1×1 estavam lá, as fragilidades no momento de passar para um cenário sem bola após perdas em zonas proibidas deitaram tudo por terra.

Rúben Amorim tentava inverter essa espiral a partir do banco, trocando numa primeira instância os dois alas com efeito quase imediato na capacidade de projetar jogo pelos corredores laterais e dar largura às ações e depois lançando Paulinho para dar outro peso ao ataque. A Atalanta, que em contexto de vantagem entra em terreno preferencial para “matar” os encontros, não teve capacidade para muito mais a não ser tentar segurar o 2-1 e esse resultado acabou mesmo por subsistir até ao final entre um festival de golos falhados: Paulinho, sozinho perante Juan Musso, permitiu a defesa ao guarda-redes num chapéu (86′); o mesmo Paulinho, logo de seguida, surgiu isolado na área para desviar de cabeça mas a tentativa saiu ao lado (88′); Marcus Edwards, na sequência de uma defesa incompleta a remate de Nuno Santos, também não conseguiu fazer a recarga (90′). Oportunidades não faltaram mas a eliminação estava mesmo traçada.

Se antes do encontro uma derrota em Itália poderia não ter tanto impacto tendo em conta que a prioridade da formação verde e branca passa pelo Campeonato, a forma como a equipa voltou a falhar a oportunidade de sair de Bérgamo com a primeira vitória em solo transalpino deixou o técnico particularmente frustrado. Mais do que isso, ficou como novo alerta para o que sobra no resto da temporada. Mais do que provocar o erro no adversário, seja através da exploração do jogo mais direto em Gyökeres, seja em ataque organizado, o Sporting continua a precisar de não oferecer tantos erros aos opositores. Mais uma vez, das más abordagens defensivas aos golos desperdiçados, houve maior demérito próprio do que mérito adversário.