A Parpública obteve, em 2023, lucros de 183 milhões de euros, mais 18% face a 2022, um dos melhores resultados dos últimos anos, mas conseguido à custa do recebimento de 148,5 milhões em dividendos, sendo que 91 milhões foram surpresa. E possíveis porque o Governo, na altura com Fernando Medina no Ministério das Finanças, determinou a entrega de reservas por parte da Águas de Portugal e Casa da Moeda (INCM). A polémica levou a esclarecimentos do Governo anterior, já que com isso teria ajudado à dívida pública.

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Agora percebe-se que também a Parpública foi instrumental para as operações que contribuíram para colocar a dívida pública abaixo dos 100%. A holding pública comprou, no final de 2023, parte de um empréstimo obrigacionista de 130 milhões de euros “por contrapartida ao saldo de gerência de 2022″. No relatório e contas agora conhecido, a Parpública garante que esta operação teve um ganho estimado de 20 pontos base ao ano”, o que levará a uma redução de 5 milhões de euros de encargos anuais com juros. No entanto, teve um custo extraordinário em 2023. O empréstimo era de 250 milhões, restam 120 milhões. A empresa quer comprar as obrigações em dois anos, amortizando, antes da maturidade (2026), 60 milhões em cada um dos anos. “Após a recompra a holding ficará sem endividamento”.

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A Parpública assume mesmo, no relatório, que o objetivo da amortização do empréstimo foi reduzir a dívida pública. “Com o intuito de reduzir a dívida pública, o IGCP solicitou que se avaliasse a possibilidade da Parpública adquirir em mercado uma parte das obrigações do seu empréstimo obrigacionista”. Mas se no momento da compra a Parpública considerou a operação como uma aquisição de ativos financeiros, o IGCP deu instrução diferente.

Após a concretização da operação, o IGCP informou a Parpública de que havia necessidade de efetuar a amortização das obrigações. Posteriormente, a Parpública instruiu o Euronext no sentido de cancelar os registos associados às obrigações adquiridas em 2023. Estes dados adicionais conduziram a que a operação em apreço não fosse considerada como aquisição de ativos financeiros, mas antes amortização de empréstimos/passivos financeiros”.

O que levou a um pagamento adicional aos obrigacionistas pelo prémio de reembolso pela amortização parcial e antecipada, para o qual foi autorizada pelo Governo.

No final do ano, a Parpública amortizou o empréstimo obrigacionista, mas teve de comprar títulos de dívida pública. “No final de 2023, foi realizada uma aplicação em CEDIC (Certificados Especiais de Dívida de Curto Prazo) no montante de 208,8 milhões de euros”, indica a Parpública. Esta é uma aplicação que tem feito no final do ano, consolidando dívida pública. A dívida consolidada do sector das Administrações Públicas exclui a dívida detida por entidades das Administrações Públicas. Em 2022, a subscrição de CEDIC tinha atingido no final desse ano 319 milhões de euros.

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Também a Parpública foi chamada a pagar dividendos ao Estado. No seu caso dividendos que tinha em atraso de 2021 e 2022. Foram entregues em 2023 e totalizaram 25 milhões, de acordo com o relatório e contas. “Enquadrada ainda nas operações de capital, a Parpública transferiu para o seu acionista o valor total de 25 milhões de euros, valor líquido de IRC respeitante aos dividendos de 2021 e de 2022”, lê-se. Em 2023, foi, por outro lado, deliberado em Assembleia Geral que 25% resultado líquido apurado no exercício de 2022, no montante de 4 milhões, fosse afeto à distribuição de dividendos.

Já em relação ao pagamento este ano, por referência ao exercício de 2023, a administração demitida por Joaquim Miranda Sarmento, liderada então por José Realinho de Matos, propôs o pagamento de 27,9 milhões de euros.

A Parpública esperou pelo último dia útil de agosto para publicar as contas. O Observador tinha questionado a empresa sobre a demora, que tinha referido que a aprovação das contas aguardava que “a circularização da informação seja finalizada, para que o Revisor Oficial de Contas (ROC) esteja em condições de emitir a Certificação Legal das Contas (CLC) de 2023 da Parpública”. A circularização é o processo de recolha de dados para verificação da informação financeira que é feito pelos auditores. Ainda assim o relatório divulgado não tem a certificação legal das contas disponível.

Isto a propósito do ano em que a Parpública foi chamada a vender a Efacec, pelo qual foi “ressarcida” pela Direção Geral do Tesouro e Finanças pelos encargos “suportados com os apoios de tesouraria atribuídos à Efacec, que ascenderam a 202,9 milhões de euros”.

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No final de 2023, a Parpública realizou ainda a subscrição e realização de um reforço de capital no Hospital da Cruz Vermelha (SGH-CVP)”, através de prestações acessórias no montante aproximado de 11,2 milhões de euros”. A holding pública garante que “esta entrada de capital teve subjacente a situação financeira que se encontra a empresa e foi efetuada de acordo com a percentagem de cada acionista na participação do capital da mesma, Parpública, 5.025.938,42 euros, e SCML, 6.140.13313 euros”.

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Um outro caso problemático envolvendo a Parpública diz respeito à Inapa, que entrou em insolvência. Pelas contas agora divulgadas, a Parpública voltou a registar uma perda pela participação desta empresa, com um reforço da imparidade de 8,7 milhões de euros, ascendo aos 19 milhões as imparidades, o que leva a que fique registada com um valor de zero euros.

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