A proposta de Orçamento do Estado para 2015 não contempla qualquer ajustamento orçamental no próximo ano, alerta a Unidade Técnica de Apoio Orçamental, que diz que esta será a primeira vez nos últimos anos que a política orçamental será neutra, e não restritiva. A redução do défice em 2015, diz, será feito à custa da melhoria da economia e de medidas temporárias.

“Após a adoção em 2014 de uma política orçamental de uma natureza restritiva e contra-cíclica, o saldo primário estrutural deverá permanecer inalterado em 2015, num contexto de melhoria da conjuntura económica”, escreve a UTAO no relatório preliminar, a que o Observador teve acesso, onde analisam a proposta de Orçamento apresentada na passada quarta-feira.

Os técnicos independentes que trabalham junto da Comissão parlamentar de Orçamento, Finanças e Administração Pública, explicam que o ajustamento orçamental – que medem usando o saldo primário estrutural (retira juros e efeitos de ciclo) – vai permanecer inalterado entre 2014 e 2015, de acordo com as contas do Governo, em 3,7% do PIB.

A composição faz de 2015, segundo os técnicos, o primeiro ano nestes últimos de crise em que a política orçamental não será restritiva: “para 2015, no OE/2015 projeta-se um contributo positivo do ciclo económico, todavia, a orientação da política orçamental revela-se neutra, no sentido de que não se antecipa uma alteração do saldo primário estrutural”, escrevem.

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A explicação para a redução do défice de 4,8% para 2,7% do PIB que é anunciada pelo Ministério das Finanças, diz a UTAO, acontece através de medidas temporárias, uma outra parte da redução resulta da melhoria do ciclo económico e uma parte mais reduzida da redução prevista nos gastos do Estado com juros.

“Elevada incerteza” nas projeções do Governo

Outro dos pontos apontado pelos técnicos são os riscos que rodeiam a projeção do Governo para a economia, em especial no que diz respeito aos preços.

Em primeiro lugar, os técnicos dizem que o Governo espera que o PIB nominal seja bastante superior ao esperado pelas instituições internacionais. O valor em euros do PIB, dizem, espera-se que suba significativamente apesar de em termos reais ter sido revisto em baixa.

As alterações até podiam estar relacionadas com a nova metodologia de cálculo do PIB, que entrou em vigo em setembro, mas esta só é responsável por um aumento de 0,2 pontos percentuais, a passo que o Governo espera um aumento de 0,7 pontos percentuais no deflator.

Entre estes pontos, a UTAO sublinha que o Governo usa para construir a proposta de Orçamento um valor projetado para o preço do petróleo que é inferior ao usado pelos restantes orçamentos da zona euro e alerta para os riscos para o valor do PIB (que é usado como base para calcular a percentagem do défice e da dívida pública) desta projeção.

“Contudo, note-se que a previsão para a evolução do preço do petróleo em dólares/barril é inferior à média das hipóteses apresentadas pelos restantes países da área do euro nos respetivos Orçamentos do Estado. Em euros, o cenário do OE2015 apresenta ainda uma redução do preço do petróleo. Note-se que tende a existir uma elevada correlação entre a evolução dos preços do petróleo (em euros) e os preços dos bens importados. Neste contexto, caso a redução do preço do petróleo não se verifique, ou seja de dimensão inferior, o deflator das importações poderá ser superior ao estimado, o que poderá implicar uma redução do deflator do PIB e, portanto, do PIB medido em termos nominais”, explicam os técnicos.

Também por isto, dizem os técnicos, o cenário macroeconómico está envolto em grande incerteza, que é qualificada como uma “enorme incerteza” no que diz respeito ao ajustamento externo para 2015 esperado pelo Governo, em especial tendo em conta os números de sinal contrário dos anos anteriores.

A UTAO calcula mesmo que a procura externa líquida dirigida à economia portuguesa seja mais baixa do que o Governo está à espera em 0,6 pontos percentuais, que seja igualmente mais baixa para a totalidade do presente ano, face à última estimativa revista do Governo.