FC Porto e Roma chegavam ao jogo desta quarta-feira em situações algo semelhantes: pelo menos no que toca a estados de espíritos. Se os dragões perderam no passado sábado com o Benfica, o principal rival, os italianos foram derrotados na mesma noite pela Lazio no dérbi de Roma, naquele que é um dos jogos mais importantes da temporada da equipa italiana. É verdade que, ainda assim, o FC Porto está no segundo lugar a dois pontos da liderança e a Roma segue em quinto, já muito longe da Juventus — mas o orgulho ferido era semelhante.

Depois da primeira mão no Olímpico de Roma, em que os italianos venceram com um bis de Zaniolo e o golo de Adrián já nos instantes finais do jogo deixou a eliminatória em aberto — e principalmente depois do clássico de má memória com o Benfica –, Sérgio Conceição surpreendeu ao tirar Brahimi e Óliver do onze inicial. Sem Manafá, que não está inscrito na Liga dos Campeões, Éder Militão foi titular na direita da defesa e Pepe voltou a ocupar o lugar ao lado de Felipe. Jesús Corona assumia a esquerda do meio-campo, Otávio jogava descaído na direita, Danilo voltava à titularidade perto de Herrera e Marega e Soares formavam uma dupla inédita na frente, com Fernando Andrade e Adrián no banco.

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Ficha de jogo

FC Porto-AS Roma, 3-1 (após prolongamento)

Segunda mão dos oitavos de final da Liga dos Campeões

Estádio do Dragão, no Porto

Árbitro: Cuneyt Çakir (Turquia)

FC Porto: Casillas, Militão (Maxi, 103′), Felipe, Pepe, Telles, Corona (Brahimi, 69′), Danilo, Herrera, Otávio (Hernâni, 94′), Soares (Fernando Andrade, 78′), Marega

Suplentes não utilizados: Vaná, Adrián, Óliver Torres

Treinador: Sérgio Conceição

AS Roma: Olsen, Karsdorp (Florenzi, 55′), Manolas, Juan Jesus, Marcano (Cristante, 76′), Kolarov, De Rossi (Pellegrini, 45+3′, Schick, 96′), Nzonzi, Perotti, Dzeko, Zaniolo

Suplentes não utilizados: Mirante, Santon, El Shaarawy

Treinador: Eusebio Di Francesco

Golos: Soares (26′), De Rossi (p, 37′), Marega (52′), Alex Telles (p, 117′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Zaniolo (15′), Herrera (18′), Danilo (45+2′), Karsdorp (55′), Pepe (59′), Dzeko (59′), Pellegrini (81′), Florenzi (116′), Alex Telles (118′)

Do outro lado, Di Francesco fazia cinco alterações face à equipa que perdeu com a Lazio: saíam El Shaarawy, Pellegrini, Cristante, Fazio e Florenzi; entravam Perotti, N’Zonzi, Karsdorp, Marcano e Manolas. Mais do que isso, a Roma voltava a jogar com três centrais, algo que não acontecia desde dezembro e desde o jogo frente à Juventus de Cristiano Ronaldo (que os giallorossi perderam por 1-0). Três centrais que, aparentemente, pareciam formar toda a linha defensiva dos italianos — mas rapidamente se percebeu, com os minutos iniciais da partida, que essa linha seria formada por cinco jogadores, com Kolarov e Karsdorp a funcionar enquanto falsos laterais.

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Os primeiros minutos do jogo mostraram que o FC Porto iria atrás da eliminatória e do golo mas com cautela e parcimónia, tal como Sérgio Conceição havia pedido na antevisão da partida. Os dragões controlaram grande parte da primeira parte com um jogo de paciência que assentou na posse de bola e no controlo dos acontecimentos e beneficiaram da má exibição de Karsdorp, que sozinho e com Corona pela frente — Zaniolo pouco desce, De Rossi não tem a velocidade de outros tempos — teve muitas dificuldades para parar o mexicano. O fluxo ofensivo dos dragões descobriu então um filão na ala esquerda, com Corona enquanto principal desequilibrador, Telles muito ativo no corredor, Danilo seguro na costas e Marega em permanente transição lá à frente.

Depois de dois remates perigosos para Corona (3′ e 20′) e uma grande oportunidade para Alex Telles (10′) — tudo pelo lado esquerdo –, o FC Porto chegou de forma quase natural ao golo, já que conseguiu secar por completo a criatividade da equipa italiana e estava totalmente por cima do jogo, sem arriscar demasiado mas a conseguir penetrar entre os blocos da Roma. Depois de uma grande recuperação de bola de Marega, que deixou Manolas pregado ao chão, Corona conduziu até à grande área e devolveu ao maliano; o avançado levou a bola até ao limite da linha de fundo e serviu Soares, que sozinho e com a baliza à disposição só precisou de encostar para colocar o FC Porto em vantagem tanto no jogo como na eliminatória. O Dragão explodiu de alegria e a lógica do jogo inverteu-se: a partir daqui, seria a Roma a procurar o golo e a ir atrás do resultado. Soares, por seu lado, estreou-se a marcar na Liga dos Campeões e chegou aos 16 golos pelos dragões.

Com a partida praticamente controlada e o resultado favorável, os dragões desceram no terreno mas mantiveram uma sobriedade digna de nota que, à exceção de um remate enrolado de Dzeko pouco depois do golo de Soares, impediu a equipa italiana de chegar perto da baliza de Casillas. Mas a sobriedade não se estendeu a toda a equipa. Éder Militão, tantas vezes associado a um critério acima da média, a uma responsabilidade muito para lá da idade que tem e permanentemente dado como certo no Real Madrid na próxima temporada, cometeu um erro como raramente comete e anulou os esforços de Corona, Marega, Soares e companhia. Num lance que nem se afigurava propriamente perigoso, o brasileiro cometeu grande penalidade sobre Perotti e ofereceu o empate à Roma e a De Rossi: Casillas levou as mãos ao rosto, Conceição permaneceu quase incrédulo e o Dragão silenciou-se. De um momento para o outro, o FC Porto deixava de estar em vantagem na eliminatória para estar obrigado a marcar um golo se quisesse levar tudo para prolongamento.

Até ao intervalo, Herrera ainda obrigou Olsen a uma grande defesa e De Rossi saiu lesionado nos últimos instantes do primeiro tempo, depois de um lance com Danilo. A Roma voltou a recuar, reorganizou os setores defensivos e desistiu das transições ofensivas até ao final da primeira parte. O FC Porto precisava de regressar para a segunda parte e recuperar tudo o que havia feito até ao golo de De Rossi.

O FC Porto voltou para a segunda parte sem qualquer alteração mas com um objetivo claro e assumido: chegar à baliza de Olsen, sufocar a equipa da Roma e voltar a marcar o mais depressa possível. Depois de duas oportunidades claras, com um cabeceamento de Soares após cruzamento de Militão (49′) e um remate de Marega na diagonal (51′), adivinhava-se o golo e os dragões chegaram lá da mesma forma que tinham criado perigo durante toda a primeira parte: pela esquerda e aproveitando a benevolência de Karsdorp. Depois de uma perda de bola, Corona fez o que quis do defesa holandês pela enésima vez e cruzou largo à procura da entrada de alguém ao segundo poste; esse alguém foi Marega, que apareceu sozinho e fez o segundo do FC Porto. O Dragão voltou a explodir, Marega correu para junto dos adeptos e os dragões empatavam a eliminatória.

Eusebio Di Francesco só precisou de três minutos para perceber que, mesmo sem uma grande exibição por parte da Roma, Karsdorp era claramente o jogador menos dos italianos e lançou Florenzi na direita da defesa. O FC Porto desceu as linhas e tirou o pé do acelerador depois do jogo — ainda que Sérgio Conceição continuasse a pedir pressão alta e reação imediata à perda da bola — e o treinador dos dragões também reagiu à alteração de Di Francesco, tirando Corona para a entrada de Brahimi. O mexicano, provavelmente o melhor elemento da equipa portuguesa até ser substituído, saía para Conceição jogar a bala mais valiosa rumo ao xeque-mate.

Otávio, que também realizou uma exibição notável, passava então a jogar em terrenos mais interiores e Militão aproveitava a dobra exímia de Danilo para assumir o corredor e ser o apoio necessário junto à ala. Di Francesco tirou Marcano e passou a jogar com quatro defesas, Conceição lançou Fernando Andrade no lugar de Soares e Casillas continuou enquanto mero espectador enquanto o FC Porto apertava o cerco e procurava o golo para evitar o prolongamento. Brahimi esteve lá perto, com assistência de Otávio (77′), mas Pepe quase deitou tudo a perder com um mau passe que deixou Perotti em boa posição para o remate (82′). O FC Porto dominou a segunda parte mas não conseguiu chegar ao terceiro golo que resolveria tudo e a eliminatória foi mesmo para prolongamento.

Depois de muitas substituições nos primeiros instantes do prolongamento, Marega esteve perto de marcar e Dzeko teve duas oportunidades para decidir a eliminatória. O acentuado desgaste físico, provocado não só pelo alongar da partida como também pela elevada exigência do encontro, retirou qualidade ao jogo e tornou a meia-hora de tempo adicional um autêntico suplício para FC Porto e Roma. Mas, tal como tinha acontecido com Éder Militão na primeira parte do encontro, faltou sobriedade e critério a Florenzi. Maxi cruzou a partir da direita, Fernando Andrade tentou chegar à bola mas foi impedido pelo italiano: o árbitro consultou o VAR e assinalou grande penalidade, convertida de forma exímia por Alex Telles.

O FC Porto manteve a tradição e eliminou a Roma, carimbando o passaporte para os quartos de final da Liga dos Campeões (onde também já estão Ajax, Tottenham e Manchester United). Éder Militão cometeu um erro na primeira parte e foi imitado por Florenzi, que deitou tudo a perder a três minutos do fim do prolongamento. Com uma das melhores exibições dos dragões esta temporada, Sérgio Conceição continua uma caminhada notável na Europa e tem toda a capacidade para acreditar que, dependendo do sorteio, pode voltar a fazer história.