A Dinamarca, favorita, atacou. A Finlândia, estreante nestas andanças, provavelmente queria mais, mas restou-lhe defender. Jogou-se futebol, os primeiros do Grupo B do Euro 2020, mas, como é de imaginar, e por mais cliché que seja, o jogo mais importante deste sábado à tarde foi o da vida. E Christian Eriksen, figura maior da equipa dinamarquesa, foi também o MVP do dia.

Decorria o minuto 43 da primeira parte e o craque preparava-se para responder ao passe de um colega, através de um lançamento de linha lateral. Tocou com o joelho na bola e caiu, como caíram depois os semblantes de todos os presentes no Parken, em Copenhaga. Como caiu um silêncio assombroso em todo o estádio. Rapidamente os colegas perceberam que o jogador não estava bem. Sinais, equipas médicas a correr, mas também lágrimas e mãos na cabeça. Os jogadores finlandeses, sempre preocupados e até de reações atadas durante vários momentos, afastaram-se do local.

Depois, naquela que deverá ser uma das imagens do ano, por mais que aconteça um 7-0 ou um 5-5 na final do Euro, a equipa dinamarquesa reuniu-se numa roda, protegendo o jogador e a equipa médica. Podia muito bem ser uma pintura, um tratado de coragem e proteção. Algumas vezes, quase como quem queria mas não queria, alguns espreitavam para trás. Foram longos, longos minutos, até o jogador sair de maca do terreno de jogo, ladeado dos colegas, que não o abandonaram. O jogo foi então suspenso e as equipas recolheram todas ao balneário.

Sem futebol, por esta altura o menos importante, foram chegando notícias positivas, quer por informação da UEFA, quer, por exemplo, pelo empresário de Eriksen, Martin Schoots: “Não sei muito mas soube das boas notícias. Acabei de falar com o pai dele, que me disse que ele conseguia respirar e falar”.

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E quando já nada o fazia prever, volta o futebol. Num ato de coragem absolutamente extraordinário, os jogadores decidem voltar ao encontro e terminá-lo. Os atletas foram entrando em campo e noutro dos grandes momentos desportivos deste ano, toda a equipa da Finlândia aplaudiu o conjunto adversário.

Mesmo sem os seus principais pés (Eriksen é um dos craques, sem dúvida), a Dinamarca continuou a morar no meio-campo finlandês, com coragem, sempre, desde que o jogo regressou. Em nome de Eriksen, jogavam e insistiam no ataque, mas os estreantes do Euro não se deixaram cair e, contra a corrente do jogo, totalmente contra a corrente do jogo, Pohjanpalo fez o 1-0.

Aos 74′ aconteceu pela primeira vez algo lógico no Parken: a equipa favorita e que mais atacou tem um penálti a seu favor. Hojbjerg chegou-se à frente para ser o herói, mas acabou por ser Hradecky, guarda-redes opositor, que agarrou a confirmação da sua bela exibição.

A Dinamarca perdeu um mero jogo de futebol mas, e voltando aos clichés, a vitória foi noutro jogo, que ainda não terminou. E nesse desafio, espera-se que continue a goleada, pela força de Christian Eriksen.

O jogo a três toques

Para recordar

Começando pelo futebol jogado, há a destacar um encontro bem disputado e em que as duas equipas, cada uma à sua maneira, tentou levar a bom porto a sua estratégia. A Dinamarca? Joga bem e esteve por cima todo o encontro. E destaca-se a coragem e o coração dos seus jogadores, que após uma situação absolutamente devastadora, voltaram a correr atrás da bola. Do lado finlandês, bem, foi o que se esperava. Muito esforço, muita alma, mas muitas, muitas dificuldades em construir e chegar ao seu craque, Pukki. Pode parecer efetivamente estranho, mas esquecendo (e já lá vamos em parte) o drama de Eriksen, foram 90 minutos bastante interessantes.

Para esquecer

Não é possível esquecer o que aconteceu a Eriksen, as lágrimas, as mãos na cabeça e o pânico generalizado, completamente palpável mesmo à distância de uma qualquer transmissão televisiva. Mas, depois da “estabilidade” noticiada, podemos esquecer o medo e as ideias que passaram pela cabeça de muitos, dos que estavam perto aos que estavam à distância. Vai sempre ser recordado, mas os maus sentimentos serão esquecidos, se tudo correr bem.

Para valorizar

O comportamento dos dinamarqueses, emotivos mas lógicos e frios, ao rodear Eriksen enquanto esteve estava a ser assistido, e mesmo sem saber que a realização já tinha mostrado, infelizmente, mais do que era suposto, foi irrepreensível. E não foi só então, porque voltarem ao jogo, mesmo que algo fragilizados, foi de uma coragem extraordinária. E, mais fragilizados, a equipa da Dinamarca pôde contar com o apoio dos colegas de profissão que, num momento fantástico, ovacionou o conjunto adversário quando este regressou ao campo.