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Vladimir Putin descartou qualquer responsabilidade da Rússia relativamente ao deteriorar das relações com Bruxelas, culpando exclusivamente os Estados-membros da UE

POOL/AFP via Getty Images

Vladimir Putin descartou qualquer responsabilidade da Rússia relativamente ao deteriorar das relações com Bruxelas, culpando exclusivamente os Estados-membros da UE

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22 meses de guerra não fizeram Putin mudar de ideias: Ucrânia tem de ser "desnazificada" e "desmilitarizada"

Em conferência de imprensa, Putin diz ter visto melhorias das forças russas na Ucrânia e fala em "extermínio" das tropas ucranianas. E frisa que "operação militar especial" é quase uma "guerra civil".

Do preço dos ovos ao rumo da guerra. Numa longa sessão que durou quatro horas, num modelo misto entre uma conferência de imprensa e um town hall ao estilo norte-americano, o Presidente russo, Vladimir Putin, respondeu a cerca de 70 perguntas — algumas de jornalistas e outras do público — sobre os mais variados temas. O evento — habitual até 2019, mas que foi suspenso depois desse ano, primeiro por força da pandemia e, depois, pela guerra na Ucrânia — pretendia servir de balanço do ano 2023 na Rússia, e a “operação militar especial” foi um tema em claro destaque. Contudo, apesar de já ter passado quase dois anos desde o início do conflito no país vizinho, um cessar-fogo está muito longe de acontecer — e o Chefe de Estado russo mantém a retórica que esteve na origem da invasão a 24 de fevereiro.

“Quando termina a guerra?” Esta talvez seja uma das perguntas para que mais russos querem resposta — e foi logo a terceira a ser colocada durante a conferência de imprensa. Vladimir Putin deu uma resposta simples: “Quando os objetivos da operação militar especial forem atingidos.” Numa explicação que encontra paralelismos com o discurso do início da guerra, o Presidente russo continua a defender que a Rússia tem o dever de “desnazificar” e “desmilitarizar” a Ucrânia. 

Vladimir Putin lembrou, na conferência de imprensa, que a Ucrânia tem como “ídolo” o nacionalista Stepan Bandera, que colaborou com os nazis, estando o neonazismo enraizado na sociedade ucraniana. Sobre a desmilitarização, o Presidente russo lamentou que o Ocidente ainda forneça armas a Kiev, ainda que se tenha mostrado confiante de que isso vá “acabar num dia” que, prevê o Chefe de Estado, estará a chegar.

epa11028707 Russian President Vladimir Putin gestures as he answers questions during his annual press conference with Russian federal, regional, and foreign media at the Gostiny Dvor forum hall in Moscow, Russia, 14 December 2023. Russian President Vladimir Putin on 14 December holds his end-of-year press conference, followed by the 'Direct Line with Vladimir Putin' televised event, where he will answer citizens' questions focusing on domestic issues. The President's Big Press Conference is an annual event that has been held since 2001. This year the format is combined 'Direct Line' (questions from citizens) and 'Big Press Conference' (questions from journalists). The event takes place months before the presidential election scheduled for 17 March 2024, in which Putin decided to run for re-election.  EPA/ALEXANDER ZEMLIANICHENKO / POOL

Vladimir Putin na conferência de imprensa desta quinta-feira

ALEXANDER ZEMLIANICHENKO / POOL/EPA

Ao longo dos últimos meses, Vladimir Putin tem igualmente justificado a invasão com o facto de a segurança nacional da Rússia estar em risco, principalmente por conta da expansão da NATO para regiões mais próximas das fronteiras russas. Nesta conferência de imprensa, a primeira pergunta foi sobre quais são as suas “principais tarefas” enquanto Chefe de Estado — e o líder indicou que passa por fortalecer a “soberania russa”. “Sem o fortalecimento da soberania é impossível existir. Todo o país entende perfeitamente que sem soberania a Rússia não será capaz de existir.”

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A negação da Ucrânia enquanto Estado independente e Odessa ser uma “cidade russa”

Interrogado sobre o estado das relações entre a Rússia e a União Europeia (UE), Vladimir Putin descartou qualquer responsabilidade da Rússia relativamente ao deteriorar das relações com Bruxelas, culpando exclusivamente os Estados-membros da UE, que “negligenciaram” os interesses russos. Referiu, no entanto, duas exceções de dois líderes europeus que acredita que “não se comportam daquela maneira”: o primeiro-ministro da Hungria, Viktor Orbán, e o novo chefe do executivo da Eslováquia, Robert Fico.

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Para explicar as atuais relações conturbadas entre Bruxelas e Moscovo, o líder da Rússia remontou, tal como já tinha feito outras vezes no passado, a 2014. Foi neste ano que ocorreu o Euromaidan, uma série de protestos nas ruas ucranianas que culminou com o fim o regime do antigo Presidente pró-russo ucraniano, Viktor Yanukovych, e que motivou uma aproximação de Kiev ao Ocidente.

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O estúdio de televisão em que Vladimir Putin deu a conferência de imprensa

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O Presidente russo argumentou que a União Europeia — juntamente com os “amigos norte-americanos” — apoiou o Euromaidan. “Eles forçaram [os ucranianos] a tomar algumas decisões. Os Estados Unidos organizaram tudo e a Europa acompanhou-os. Como se consegue construir boas relações com eles?”, questionou Vladimir Putin, lamentando logo a seguir que os europeus “façam escolhas tendo em conta apenas os seus interesses”.

Designado como “golpe de Estado” por Vladimir Putin, o Euromaidan foi um momento de viragem também nas relações entre Kiev e Moscovo. Até aí, a Rússia tentou a “todo o custo”, durante décadas, “construir relações normais com a Ucrânia”. Isto porque, alegou, o “povo russo e ucraniano são apenas um povo”: “O que está a acontecer é uma tragédia.”

Esta não é a primeira vez que Vladimir Putin equipara o povo ucraniano ao russo. Nesta  conferência de imprensa, ainda foi mais longe e comparou a “operação militar especial” a uma “guerra civil”, partindo da tese de que a Ucrânia ainda devia ser parte da Rússia. “A Crimeia é da Rússia e todos sabem isso. Eles [o Ocidente] é que começaram a inventar uma série de disparates históricos”, afirmou.

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Putin comparou "operação militar especial" a uma "guerra civil"

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Nesta ordem de ideias, o líder da Rússia decidiu focar o exemplo de Odessa, uma cidade ucraniana que, neste momento do conflito, ainda está controlada pelas autoridades ucranianas. “Todos sabem que Odessa é uma cidade russa”, atirou o Chefe de Estado, reforçando que existe um revisionismo histórico alimentado pelo Ocidente que dissocia aquela localidade da Rússia.

O conflito na Ucrânia. As “melhorias” russas e o “extermínio” ucraniano

O desempenho da Rússia durante a “operação militar especial” foi um tópico comentado durante a conferência de imprensa, mas o Presidente russo manteve-se na defensiva. “Com modéstia”, o Chefe de Estado da Rússia notou “algumas melhorias” no desenrolar da invasão que já dura há 22 meses, em contraposição ao que diz estar a acontecer com as tropas ucranianas, encaminhadas por Kiev para o que Putin define como um “extermínio”, ao envolvê-las no conflito.

Neste sentido, Vladimir Putin aproveitou a ocasião para comentar as viagens oficiais de Volodymyr Zelensky ao estrangeiro, numa semana em que Zelensky passou pelos Estados Unidos, pela Noruega e pela Alemanha. Para o chefe de Estado russo, o Presidente ucraniano — cujo nome nunca mencionou, optando pela referência ao “regime de Kiev” — tem “viajado e implorado por dinheiro”, ao tentar mostrar resultados da contraofensiva. “É estúpido e irresponsável, mas é da sua conta”, atirou Vladimir Putin.

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Jornalistas e público podiam fazer perguntas a Presidente russo

POOL/AFP via Getty Images

Adicionalmente, desde fevereiro de 2022, são poucos os dados revelados sobre os militares russos que combateram na Ucrânia. Porém, esta quinta-feira Vladimir Putin desfez o tabu e revelou que estão 617 mil efetivos destacados na Ucrânia, fornecendo assim uma estimativa precisa das forças atualmente envolvidas na guerra contra o país vizinho.

Estes não foram os únicos dados trazidos por Vladimir Putin. Segundo as suas estimativas, as tropas russas destruíram, desde o início da contraofensiva — que começou no início de junho deste ano —, 747 tanques e 2.300 carros de combate ucranianos. E garantiu que todos os dias 1.500 voluntários mostram-se disponível “para defender a pátria” e lutar na Ucrânia.

Tendo em conta o número de voluntários e de combatentes no terreno, o Presidente russo descartou uma segunda mobilização total para a guerra na Ucrânia. “Aqueles que estão dispostos a defender os interesses da pátria com armas não está a diminuir”, justificou Vladimir Putin, que assegurou aos russos esta quinta-feira que o país vencerá a “operação militar especial”.

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“Aqueles que estão dispostos a defender os interesses da pátria com armas não está a diminuir”, diz Putin

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O conflito em Gaza — e a situação que não é comparável com a Ucrânia

Num tópico virado para a política externa, durante a conferência de imprensa Vladimir Putin comentou a situação no Médio Oriente. E, relativamente à ofensiva israelita em curso na Faixa de Gaza, o Presidente russo considera que a ação de Jerusalém tem sido um “desastre”. “Infelizmente, as Nações Unidas e as potências mundiais não conseguem parar esses ataques”, lamentou o Presidente russo, que destacou, ainda assim, o papel “de charneira” do homólogo turco, Recep Tayyip Erdoğan, neste assunto.

Sobre a Palestina, e voltando a focar Recep Tayyip Erdoğan, o Presidente russo disse que, tal como a Turquia, Moscovo quer construir um Estado palestiniano e criar as bases para relações estáveis entre Israel e a Palestina. “Precisamos de manter as pessoas em Gaza e garantir que têm ajuda humanitária.”

Adicionalmente, na opinião do Presidente russo, há uma “grande diferença” entre o que acontece em Gaza e na Ucrânia. “Olhe-se para a operação militar especial e para a operação em Gaza e sinta-se a diferença: não acontece nada assim na Ucrânia.”

epa11028325 Russian President Vladimir Putin gestures as he answers questions during his annual press conference with Russian federal, regional, and foreign media at the Gostiny Dvor forum hall in Moscow, Russia, 14 December 2023. Russian President Vladimir Putin on 14 December holds his end-of-year press conference, followed by the 'Direct Line with Vladimir Putin' televised event, where he will answer citizens' questions focusing on domestic issues. The President's Big Press Conference is an annual event that has been held since 2001. This year the format is combined 'Direct Line' (questions from citizens) and 'Big Press Conference' (questions from journalists). The event takes place months before the presidential election scheduled for 17 March 2024, in which Putin decided to run for re-election.  EPA/ALEXANDER ZEMLIANICHENKO / POOL
“Olhe-se para a operação militar especial e para a operação em Gaza e sinta-se a diferença: não acontece nada assim na Ucrânia”
Vladimir Putin, Presidente da Rússia

Ao final de quatro horas de conferência de imprensa, Vladimir Putin acabou por tocar vários tópicos, incluindo a indústria automóvel na Rússia — em que não resistiu a mandar um recado para o Ocidente, que esperava que tudo “colapsasse” em solo russo e que acabou por não ver isso acontecer —, até à inteligência artificial, em que o Chefe de Estado da Rússia falou com um deepfake.

A última pergunta foi mais pessoal — e foi dedicada à sua candidatura para as eleições presidenciais de 2024. Um jornalista perguntou a Vladimir Putin que conselho daria a si mesmo se pudesse voltar a 2001, ano em que assumiu pela primeira vez a presidência da Rússia. “Estás no caminho certo”, respondeu o líder russo, acrescentando que o seu eu mais jovem devia confiar em todos os momentos “no grande povo russo”.

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