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MÁRIO CRUZ/LUSA

MÁRIO CRUZ/LUSA

Candidatura de Seguro começa a rolar. Não espera "absolutamente nada" do PS, mas já junta tropas

Dose dupla de debates de António José Seguro (participou em dois em cinco horas) mostra o socialista lançado nas Presidenciais. Apresenta o perfil, posiciona-se ideologicamente e junta peças.

A realidade de António José Seguro é a das aulas que continua a dar na universidade, como a que deu esta quarta-feira à tarde (sobre marxismo, as divergências socialistas e a social-democracia), entre um debate organizado pelo International Club of Portugal e outro preparado pela SEDES Jovem. Já a perceção, é de que é um candidato presidencial em marcha adiantada, com um manifesto presidencial em preparação e até já com salas onde aparecem algumas figuras influentes, principalmente da sua era no PS (e onde cabe até um antigo candidato presidencial).

Nas duas intervenções que fez, com cinco horas de distância, esta terça-feira — e também na que tinha feito no dia anterior em Idanha-a-Nova — a garantia que deu sobre as presidenciais de 2026 foi sempre que é só um socialista em reflexão: “Todo o processo está a desenvolver-se na minha cabeça”. “Estou mesmo em reflexão. Não tenho nenhum prazo, mas também não estou à espera de absolutamente mais nada“, disse num misto de contenção e desafio. Se por um lado só está a pensar, por outro já avisa o PS que a definição do apoio do partido não é decisiva para o resultado da sua reflexão.

Por agora, a jogada parece mesmo a de adiantar-se no marcador de passos em direção a Belém, em relação a outras potenciais ambições na “área socialista” — o mínimo que Pedro Nuno Santos delimitou, por agora, sobre o perfil de um presidenciável apoiado pelo partido. “Vai ser como o Sampaio”, diz um dos próximos de Seguro, lembrando a estratégia do antigo Presidente socialista de se adiantar como candidato, condicionando todos os outros que pudessem estar interessados — e o PS já tere só de pensar em nova divisão em Presidenciais, sobretudo quando está há 20 anos fora do palácio.

"Muita gente vai à Constituição ver o que um Presidente deve fazer. Eu olho para o país para ver o que o Presidente da República tem de fazer nos próximos anos"

Na sala do hotel Sheraton de Lisboa, onde decorreu o almoço-debate do International Club (grupo de influência que se apresenta como uma associação de promoção e difusão da diversidade cultural), estiveram vários socialistas que integraram ou apoiaram a sua direção no PS como Álvaro Beleza (que se repetira na plateia do final da tarde na sessão de jovens da SEDES, a Associação para o Desenvolvimento Económico e Social a que preside), Eurico Brilhante Dias, João Soares, Óscar Gaspar, Afonso Candal, Pedro do Carmo ou Manuel Lage. À tarde, na SEDES, esteve ainda Henrique Neto (o empresário e histórico socialista que concorreu à Presidência da República em 2016). Na plateia e com uma pergunta sobre o PRR (ler mais adiante) esteve também o antigo ministro (de Cavaco Silva) Luís Mira Amaral.

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E se na sala havia nomes suficientes para compor uma comissão de honra para as presidenciais, no discurso de Seguro é clara a ambição por Belém, numa abordagem que tem a estrutura de manifesto presidencial. O socialista não só fez a apresentação do seu perfil — o homem do interior que conhece a pobreza –, como desfiou oito metas para o país — da ética política à qualidade da democracia, passando ainda pela reflexão sobre a criação de “critérios institucionais” para a governabilidade.

E no final do debate, em resposta a uma pergunta da plateia, já não deixava grande margem para dúvidas sobre o papel político que quer assumir, ao proclamar: “Muita gente vai à Constituição ver o que um Presidente deve fazer. Eu olho para o país para ver o que o Presidente da República tem de fazer nos próximos anos. O momento é singular.”

O seu momento vai sendo de semear ideias e medir apoios, já sem discrição. Falou nas “pessoas” que lhe falaram nos últimos tempos “nesse sentido” (o de Belém) e em como lhes perguntava “mas porquê” e tinha como resposta a referência à sua origem de jovem do interior (de Penamacor) que “percebeu o sentido das desigualdades e das injustiças”: “Sinto-me muito honrado por reconhecerem em mim características que podem ajudar o país na função do Presidente”.

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Promover a governabilidade e orçamentos que não vão a votos

Sobre o conteúdo, Seguro aparece depois de dez anos de afastamento e a tentar tirar proveito da parte dessa ausência que representa distância face aos “casos e casinhos” dos últimos anos (sobretudo nos governos do seu próprio partido). Fala na necessidade de “aumentar a qualidade da democracia”, dizendo ser “inaceitável que não exista uma dimensão ética quando se exercem cargos políticos” e que é também “inaceitável” fazer “leis à medida”, numa referência indireta (porque não referiu o caso) à mais recente nomeação falhada para a secretaria-geral do Governo e a alteração legislativa que foi feita para responder a uma questão salarial.

Outra proposta que tem alinhada — e que insiste que faz apenas parte dos pensamentos que tem acumulado nos últimos anos de observação distanciada — é a de “criar condições de governabilidade”. Uma incumbência que tem sido assumida pelos Presidentes da República, exercida sobretudo através do poder da palavra e da magistratura de influência, mas que Seguro parece querer que vá além disso. E isto porque fala em “encontrar critérios institucionais” para resolver situações parlamentares complexas.

"Precisamos de governos de projeto e não de turno, com políticas que resistam aos ciclos eleitorais e com compromisso"

Começa pelo problema: “O Parlamento tem nove forças, três delas relevantes. As condições de governabilidade deterioraram-se para essas forças criarem alianças. Mas se não tivermos governabilidade como podemos decidir?” Quanto à solução, vai muito além da influência da palavra, já que fala na necessidade de “encontrar critérios institucionais, já que na cultura política não há disponibilidade para isso, para garantir que futuros governos estão em condições de fazer neste pais aquilo que é necessário”.

Questionado pelo Observador, no final,  qual a ideia em concreto, Seguro falou na necessidade de promover a reflexão sobre o assunto, mas também disse que uma das soluções poderia passar por não ter orçamentos do Estado a votos, por exemplo, funcionado como os programas do Governo. Quem apresenta uma rejeição, terá de ter uma alternativa de governação, havia de acrescentar mais tarde da SEDES. Depois de o Presidente Marcelo fazer a ligação direta entre o chumbo de Orçamentos e a dissolução da Assembleia da República, o exemplo parece ir direito ao desligamento dos dois pontos de vez.

Seguro defende que existe a “urgência de um salto qualitativo que liberte o país deste constrangimento e que mobilize os portugueses”, diz ainda o proto-candidato já quase em tom de candidato-candidato. “Precisamos de governos de projeto e não de turno, com políticas que resistam aos ciclos eleitorais e com compromisso”, numa altura em que se vive, diz, “numa cultura de trincheira“. “Precisamos de governos de projeto e não de turno”, disse ainda a este propósito e para defender um espírito de “compromisso” que permita “políticas que resistam a ciclo eleitorais”.

Para trás fica uma das últimas páginas que deixou escrita na política nacional, a recusa em aderir ao “compromisso de salvação nacional” que o então Presidente Cavaco Silva propôs, em 2013, para um “entendimento de médio prazo” para ultrapassar a crise política aberta pela demissão de Paulo Portas (dava eleições antecipadas em troca do apoio à conclusão do memorando da troika). É “outra encarnação”, como diz agora Seguro relativamente a essa época da sua existência política.

A verdade é que, até aqui, a única interrupção que fez na vida política foram estes últimos dez anos. De resto, António José Seguro tem um percurso que foi da juventude partidária até à liderança do partido (passando pelo Governo), com uma prática bem conhecida de trabalho do aparelho — que cultivou muito tempo e lhe valeu a conquista fácil do partido em 2011, no pós-Sócrates. Mas agora, Seguro parece querer desvincular-se da ideia de um político de carreira, atirando aos que “são maus a executar e bons a falar” e que se “refugiam na cultura política” que diz “desprezar” da “trica e do passatempo”.

Posicionamento ideológico: social-democrata. Mas “sem apoios sociais perpétuos”

À tarde, a intervenção foi mais de posicionamento ideológico, à boleia do debate sobre a social-democracia dos jovens da SEDES. Entre a assistência estavam alguns alunos de Seguro, que virou “professor” no tratamento da sala, mas continuou candidato na postura. Voltou a falar na necessidade de mudar a “cultura política”, apelou “à indignação”. “inquietação” e “revolta” dos jovens e à “ética política”. E declarou-se “otimista” nessa mudança: “Tenho esperança senão, não estava aqui a conversar convosco”.

Sobre a sua área política, declarou-se “um social-democrata, um socialista democrata”, considerando que “a proposta é válida, mas carece de atualização”. Os valores, disse, continuam a ser os da “liberdade e igualdade” e os de uma “economia de mercado”, com “solidariedade entre gerações” e a “igualdade de oportunidades”. Mas “as propostas, os políticos e os instrumentos não estão a resolver. Temos de ir à procura de soluções para resolver os problemas concretos das pessoas de acordo com essa matriz”. “A social-democracia tem de atualizar a sua proposta política”, porque está “viva nos seus valores mas morta nas suas propostas”, disse sem apresentar uma solução: “Não tenho uma varinha mágica”.

"Houve líderes sociais-democratas que "a única coisa que quiseram foi o trade-off para os seus países ou para cargos e isso paga-se caro"

Queixa-se de, nos últimos anos, ter visto pela Europa o “rótulo da social-democracia”, mas por dentro, líderes socialistas com quem não se identificava. “A democracia está a recuar” e, sem referir nomes concretos, disse que houve líderes sociais-democratas que “a única coisa que quiseram foi o trade-off para os seus países ou para cargos e isso paga-se caro“.  Aqui foi mesmo às “famosas eleições Europeias do ‘poucochinho’” — a expressão que António Costa usou para depois fazer um assalto à liderança do PS  — em que os partidos sociais-democratas “ganharam em cinco ou sete países” e o PS, “nos partidos da oposição foi dos que teve mais votos. Mas ninguém me ouviu”, queixou-se alegando que a social-democracia estava a perder terreno porque não estava a responder aos problemas. Sobre isto rematou: “A coerência e autenticidade na política pode não render votos no imediato, mas é o que melhor contribui para densificar e introduzir qualidade na vida política”.

Para Seguro, a prática da social democracia faz-se agora pelo “financiamento do estado social está na economia”. “Como está, vai dar asneira”, diz o socialista que defende “apoios sociais que não sejam perpétuos”. “Um país só pode discutir a distribuição da riqueza se a criar”, referiu avisando que o país tem “de se preparar para viver sem fundos comunitários” e que “há que criar riqueza”. E, depois, há que “progressivamente substituir apoios sociais, colocando mais gente a não precisar deles. Se forem permanentes são um estigma e o reconhecimento que o elevador social não está a funcionar”. “Os apoios sociais devem ser transitórios” para que “as pessoas não estejam de mão estendida”, defendeu na sessão da SEDES.

Na Europa, define-se como “um federalista” e não um “aglomerado de lideranças” em que quando se liga “não se sabe quem atende do lado de lá”. Até criticou a lógica de hoje, questionado se “faz sentido ter uma União Monetária quando não há um orçamento económico”.  Queixou-se do “tempo que levou” a Europa a “responder à pandemia” e, a propósito de uma pergunta de Mira Amaral, durante o almoço-debate, ainda atirou à lógica do principal instrumento que foi produzido durante esse período, o Plano de Recuperação e Resiliência (o PRR).

O antigo ministro perguntou-lhe de que lado está, se dos empresários ou dos políticos, quanto aos investimentos do PRR. “Vejo tudo preocupado com a execução do PRR, mas ninguém preocupado com a qualidade dos investimentos financiados pelo PRR”, comentou Mira Amaral. Na resposta, Seguro disse “não alinhar com a classe política”, dizendo mesmo que na habitação o que está a ser investido é sobretudo em reabilitação e não na construção de nova habitação.

O dia acabou já perto das oito da noite e a agenda vai continuar nas próximas semanas. Seguro diz que é porque com o seu reaparecimento no espaço público tem trazido mais convites, que agora já aceita. E enquanto faz esse caminho, o conta-quilómetros das presidenciais vai contando.

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