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PEDRO_ROCHA

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Governo conta com PSD para salvar redução da TSU dos patrões

Com uma jogada, António Costa fechou um acordo na concertação social, deixou a esquerda a protestar e colocou o PSD com a batata nas mãos. Redução da TSU agita a "geringonça" e o Parlamento.

O Governo está a contar com o PSD para salvar o acordo de concertação social, caso os parceiros da esquerda tentem travar, no Parlamento, a redução da TSU que serviu de compensação aos patrões para o aumento de 27 euros do salário mínimo (para 557 euros), soube o Observador junto de dirigentes socialistas. Depois de firmado o acordo — que a CGTP não aprovou –, Bloco de Esquerda, PCP e Verdes contestaram publicamente a moeda de troca que o Executivo concedeu aos patrões para conseguir aumentar o salário mínimo nacional. Os partidos avisaram de imediato que vão pedir a apreciação parlamentar da medida com o objetivo de a chumbar. Nas contas que os socialistas estão a fazer, é ao PSD que cabe o papel de permitir que os patrões vejam a TSU reduzida para suavizar o impacto do aumento do salário mínimo. Ou então, o ónus de chumbar a medida ao lado da esquerda.

Os socialistas contam com a geometria variável que há um ano reina no Parlamento. Desta vez, basta a abstenção do PSD e do CDS (ou voto contra) para não permitirem que vingue o travão que a esquerda (BE, PCP e PEV) quer impor à redução da TSU em 1,25 pontos percentuais para os contratos antigos que recebam o salário mínimo. “Basta que PSD e CDS se abstenham. A questão não oferece perigo e não nos parece que venha a pôr em causa o acordo de concertação”, diz um socialista ao Observador. Outro é claro: “O Parlamento não vai votar contra o acordo. O PSD não o permitiria, isto nunca foi um problema“.

Apesar de se opor à medida, o Bloco de Esquerda também desvaloriza este cenário. “Não estou a ver o PSD a chumbar uma coisa que sempre defendeu”, diz José Manuel Pureza, em declarações ao Observador. Um eventual chumbo do acordo de concertação social às mãos de uma maioria negativa formada por Bloco de Esquerda, PCP, PEV, PSD e CDS obrigaria o Governo socialista a procurar uma alternativa. Mas não são contas em que os bloquistas depositem grande confiança.

No Governo, garante-se que o acordo do salário mínimo nacional foi fechado conhecendo-se à partida a oposição dos parceiros da esquerda. Ou seja, quando foi proposta a contrapartida aos parceiros sociais, o Executivo já sabia que os partidos que o apoiam no Parlamento estariam contra. Pedro Nuno Santos, secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, diz ao Observador que “era muito importante, para conseguir o aumento do salário mínimo nacional, ter o apoio dos patrões. Podíamos impor, mas é um ganho haver este acordo“.

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O responsável no Governo pelas relações com a esquerda parlamentar também diz que não foi surpresa o que aconteceu depois de fechado o acordo. Pedro Nuno Santos só garante — ao contrário do que diz o PEV — que as posições conjuntas com BE e Verdes “não foram violadas”. E desvaloriza que este capítulo signifique um sobressalto na “geringonça”: “Não vamos aumentar o salário mínimo nacional com o PSD e o CDS. Só vai aumentar porque este Governo existiu”.

"Não estamos a violar o acordo porque o que ficou escrito foi para dar expressão à anulação de uma medida do programa eleitoral do PS que defendia a redução da TSU para todos os trabalhadores", argumenta Pedro Nuno Santos.  

Pedro Nuno Santos esteve nas negociações dos acordos com PCP, PEV e Bloco, em 2015, e garante que “a norma que ficou nos acordos relativa à TSU só apareceu na sequência do que o PS tinha no programa” sobre aquela matéria. Os socialistas propunham uma redução gradual da Taxa Social Única dos empregadores em 4 pontos percentuais até 2018. A medida teve a oposição pronta, já naquela altura, dos partidos da esquerda e, ainda durante a campanha eleitoral das legislativas, chegou mesmo a ser colocada por Catarina Martins, líder do BE, como condição para entendimentos futuros que o PS deixasse cair a intenção.

O Governo alega agora que o que está acordado com os parceiros sociais é diferente de uma descida generalizada e que, por isso, não põe em causa os acordos com a esquerda. Nas posições conjuntas assinadas com o PEV e o BE, ficou inscrito que “não constará do Programa de Governo qualquer redução da TSU das entidades empregadoras”. De facto, não constou no Programa, mas surgiu já duas vezes na negociação para o aumento do salário mínimo nacional. O secretário de Estado argumenta: “Estamos a falar de uma medida temporária“. Quando a questão chegar ao Parlamento, com a oposição de Bloco, PCP e PEV, resta o PSD para o Governo conseguir que se mantenha a redução da TSU dada aos parceiros como compensação para o aumento do salário mínimo.

Os argumentos do Governo socialista não convencem o Bloco. Ainda antes de o Governo socialista ter fechado o acordo para a redução da TSU em sede de concertação social, José Soeiro, deputado bloquista, tinha deixado claro que o partido seria contra no caso de o aumento do salário mínimo ser “compensado com uma descapitalização da Segurança Social” ou se “fossem os contribuintes” a pagar uma medida que é do “mais elementar bom senso”. Os bloquistas nunca foram ouvidos nesta matéria, tendo sido apenas informados da intenção do Governo. Depois de fechado o acordo, as críticas à medida só subiram de tom.

Jorge Costa, deputado e dirigente bloquista, chegou a reforçar, na TSF, a posição de princípio do Bloco. E deixou um desejo: “Ainda estamos a tempo de garantir que, na segunda metade do seu mandato, o Governo não degrade, entre adiamentos no tempo e bónus do orçamento, esta medida emblemática da atual solução política: a valorização do salário mínimo“.

Posição semelhante têm PCP e PEV. A deputada comunista Rita Rato chegou a afirmar que o Governo tinha “decidido ceder” a “uma inaceitável manobra de chantagem” dos patrões. Heloísa Apolónia, d’Os Verdes, foi mais longe e chegou mesmo a defender que a redução da TSU viola a posição conjunta assinada entre os dois partidos. Nesta matéria, as posições são inconciliáveis.

Resta saber o que farão Os Verdes nessa situação, já que no debate quinzenal antes do Natal Heloísa Apolónia assumiu perante o primeiro-ministro que a proposta (que àquela hora ainda não estava fechada e era apenas uma hipótese) punha em causa a posição conjunta assinada com o PS. No texto firmado com Os Verdes, além da frase já citada, consta ainda outra norma onde se pedia a revisão das isenções e descontos da TSU já existentes. E a norma até ficou inscrita do Orçamento do Estado para este ano, o que foi decisivo para Heloísa Apolónia, desta vez, enfrentar Costa.

A bancada socialista está alinhada com o Governo nesta matéria: não há motivos para alarme, só estamos obrigados ao que está no acordo, no resto trabalhamos tentando posições conjuntas, mas sem obrigações. É uma espécie de mantra que é repetida no Governo e na bancada socialista e assumida publicamente por Pedro Nuno Santos. Este governante, confrontado pelo Observador com outros pontos concretos — as Parcerias Público-Privadas na Saúde e a reposição dos 25 dias de férias –, diz que “são matérias que não estão nas posições conjuntas. Todos os dias trabalhamos para ter posições comuns” noutras matérias, afirma.

Fora de questão, sabe o Observador, está a hipótese de uma renovação de votos na “geringonça”: entre o Governo, não há vontade de assinar novas posições conjuntas. As novas medidas vão ser negociadas uma a uma, nos corredores do Parlamento.

Na direção da bancada do PS, João Paulo Correia também desdramatiza que estas questões estejam a levantar problemas entre os parceiros da esquerda. “Não estamos mais preocupados do que estávamos há um ano ou no fim do ano. Não há qualquer alteração estratégica por parte do Bloco de Esquerda e do PCP“, garante ao Observador. E sobre as divergências que venham a aparecer também existe uma ladainha: “Não nos vamos entender em todas as matérias. Cada partido tem a sua agenda, vamos vendo caso a caso”.

Nas gestão de uma relação delicada, Pedro Nuno Santos acredita que “é muito importante para esta solução governativa que os partidos continuem a sinalizar as suas diferenças” e diz mesmo que “a maioria é mais larga quanto mais os partidos afirmarem as suas diferenças“. A cúpula socialista mostra-se pouco preocupada com o efeito-“geringonça” nas autárquicas que se realizam no próximo outono e prefere ver nestas manifestações de divergências à esquerda a afirmação de autonomia por parte do PCP e do BE.

“Nunca ninguém disse que isto ia ser um mar de rosas. As divergências nunca foram escondidas”, lembra José Manuel Pureza

Novo ciclo na “geringonça”? A multiplicação das divergências

Mas o braço-de-ferro na TSU não é o único ponto de divergência que tem vindo a público entre os parceiros parlamentares. A imagem que fica deste arranque de ano é que, esgotada parte substantiva das posições conjuntas que une os socialistas aos restantes três partidos, a tensão na “geringonça” vai aumentando. Foi assim na questão da reposição dos dias de férias, mas também na questão das Parcerias Público-Privadas (PPP) na Saúde, depois de o Governo socialista ter anunciado a intenção de lançar um concurso internacional para a gestão do Hospital de Cascais. Até a gestão do “caso Almaraz” mereceu duras críticas de Bloco de Esquerda e PEV. Questão para perguntar: abriu-se um novo ciclo político?

José Manuel Pureza desdramatiza. Para o bloquista, depois do “primeiro embalo” provocado pela reposição e devolução de rendimentos e direitos sociais — uma prioridade absoluta para todos os partidos da atual maioria parlamentar –, é “natural” que todas as medidas que agora são discutidas no Parlamento e que não constem nas posições conjuntas “obriguem a um maior esforço de negociação”. “Nunca ninguém disse que isto ia ser um mar de rosas. As divergências nunca foram escondidas”, sublinha.

Pureza acredita que é exagerado “falar de um novo ciclo político” ou sugerir que os socialistas “querem pôr um travão” ao esforço de convergência em matérias fundamentais. Quando existirem dissonâncias inultrapassáveis, e elas vão existir, reconhece o deputado, serão compreendidas com naturalidade. Os partidos vão sempre manter a identidade até porque há um eleitorado a respeitar.

O dirigente bloquista não deixa, no entanto, de reconhecer que vê um Governo socialista cada vez mais comprometido com os ventos que vêm de Bruxelas. Até porque existe a perceção de que um bater de asas em Bruxelas ou uma surpresa nos mercados pode provocar uma hecatombe em Lisboa. Os socialistas estão em permanente estado de alerta e movem-se cautelosos. Os parceiros parlamentares desesperam e exigem o fim das grilhetas. “Há sempre o muro da dívida”, lamenta José Manuel Pureza.

De resto, a reestruturação da dívida pública é o elefante no meio da sala que ninguém ignora. Todos sabem que sempre esteve lá, mas foram olhando para o lado enquanto foi possível repor rendimentos e direitos sociais. Um ano mais tarde, e depois de o Governo socialista ter enchido a loja de porcelanas caras à maioria, o espaço tornou-se exíguo. A margem tornou-se mais curta. Mas é preciso mais, muito mais, pedem Bloco e PCP.

Isto porque, vão lembrando bloquistas e comunistas, é impossível investir mais em setores estratégicos como a Educação e a Saúde, onde as cativações do Governo socialista tê tido mais efeitos. Portugal teria um excedente orçamental de mais de 5 mil milhões de euros, se não tivesse de pagar os 8 mil milhões de euros anuais em juros da dívida, argumentam Bloco e PCP.

E se dúvidas houvesse sobre a crescente tensão, o PCP, que não quis prestar declarações sobre estas questões, veio dissipá-las: de janeiro a junho, os comunistas vão para a rua com uma campanha para discutir a “libertação da submissão ao euro”, exigir a renegociação da dívida pública e o controlo do sistema financeiro. A pressão sobre o Governo socialista aumenta.

As próximas semanas trarão novo tema quente para a geringonça: a manutenção ou não manutenção do Novo Banco na esfera pública. Bloco e PCP já apresentaram uma série de iniciativas no sentido de pressionar António Costa a não vender o banco. Os socialistas vão mantendo todos os cenários em aberto, mas existe o risco de a decisão não agradar definitivamente a bloquistas e comunistas. Os golpes na “geringonça” vão sendo infligidos, resta saber se serão suficientes para destruir o cimento que une os quatro partidos.

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