O novo coronavírus foi detetado inicialmente na China, antes de se espalhar por todo o mundo e de a Covid-19 ter sido declarada pandemia pela Organização Mundial da Saúde. Desde que se soube da origem do novo coronavírus, os boatos e informações falsas sobre a origem do vírus têm-se multiplicado.

Pode ver alguns deles já desmentidos pelo Observador aqui, aqui e aqui e ainda aqui (entre outros que pode consultar aqui). Sobre as vacinas, pode consultar também outros artigos aqui e aqui ou aqui. Neste caso, a publicação é tem por base uma série de “coincidências” que, na verdade, não se verificam, pelo simples motivo de que as afirmações feitas são todas falsas.

Publicação no Facebook com “coincidências” sobre Covid-19

Esta publicação extensa já foi desmentida também pela AFP no início do mês e circula em várias línguas, mas a tradução é ipis verbis e não é a alteração de língua que torna as afirmações verdadeiras. Vejamos, então, frase a frase, as insinuações que são feitas.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

  • “O laboratório biológico chinês em Wuhan é propriedade da Glaxo!”

Não é verdade. O laboratório biológio de Wuhan, sobre o qual também circularam várias informações falsas, é propriedade do governo chinês. Foi inaugurado em 2015 e recebeu luz verde da Academia de Ciências da China para a sua construção em 2003. O Centro Internacional de Investigação em Infecciologia Francês ajudou à construção do laboratório, que trabalha com alguns dos patogénicos mais perigosos no mundo e, desde a identificação do Sars-Cov-2, tem trabalhado para encontrar a cura para a doença. A administração do laboratório de Wuhan cabe à Academia de Ciências da China, do governo chinês.

Virologista, militar, mãe. Quem é a major-general Chen Wei, a criadora da vacina chinesa para o coronavírus

  • “Que, por acaso, é dono da Pfizer! (aquele que produz a vacina!)…”

A Glaxo, diminutivo de GlaxoSmithKline, conhecida também pela sigla GSK, não é dona da Pfizer. Não tem qualquer participação na empresa, não constando na lista de acionistas que a detêm. É o grupo Vanguard Group que detém 7,67% das ações da Pfizer.

  • “Que, por acaso, é administrado pelas finanças do Black Rock…”

A BlackRock Investment Managment tem, de facto, uma participação na Pfizer, mas de apenas 0,85%. Bem distante do grupo Vanguard, que detém a maioria do capital, com uma participação de 7,67%, ou da SSgA Funds Management, com uma participação de 5,20%. Não é a Black Rock que “administra as finanças” da Pfizer. A BlackRock é a principal administradora de ativos no mundo e, posto isso, tem participações em dezenas de milhares de empresas, entre elas a Pfizer. Enquanto investidores, constatam-se o investidor e filantropo George Soros, por exemplo, mas a farmacêutica Pfizer também recebeu dinheiro do fundo de investimento estratégico da fundação Bill&Melinda Gates, por exemplo, ainda que isso não os tenha colocado na lista de principais acionistas da Pfizer.

  • “Que, por acaso, administra as finanças da Open Foundation Company (SOROS FOUNDATION)!”

Acima já ficou clara a participação do filantropo George Soros, um entre tantos outros que investe na maior administradora de fundos a nível mundial.

  • “Que, por acaso, atende a francesa AXA!”

Também esta afirmação é uma mentira. Não há qualquer registo de participação de Soros na companhia de seguros francesa. Os organogramas da empresa deixam isso bem claro.

  • “Coincidentement, ele é dono da empresa alemã Winterthur… Que, por acaso, construiu o laboratório chinês em Wuhan! Comprado acidentalmente pelo alemão Allianz… Que, aliás, tem a Vanguard como acionista… Que é acionista da Black Rock… Que controla os bancos centrais e administra cerca de UM TERÇO do capital de investimento global…”

A Winterthur Group, companhia de seguros suíça, foi comprada pela AXA em 2006, extinguindo-se. Como tal, considerando que só em 2015 foi inaugurado o laboratório, seria impossível que tivesse “construído” o laboratório em Wuhan. Até porque, como já vimos acima, foram os franceses do Centro Internacional de Investigação em Infecciologia  que estiveram envolvidos na construção do avançado laboratório biológico. Mas esse centro não ficou com qualquer participação na administração, já que é propriedade total do governo chinês.

  • “Que, aliás, é um dos principais acionistas da MICROSOFT… Propriedade de BILL GATES, que por acaso é acionista da PFIZER (que vende o milagre VACCINE) e atualmente é o primeiro patrocinador da OMS…”

Já está cansado? A longa publicação anda em círculos mas não consegue chegar a ponto nenhum. Além disso, vai acrescentando informação falsa, com uns pozinhos de realidade conveniente, para chegar ao fim e insinuar que a Black Rock é um dos principais acionistas da Microsoft, propriedade de Bill Gates, que este é acionista da Pfizer e, pasme-se, “primeiro patrocinador da Organização Mundial de Saúde”. E, aqui, cabe mais um dos fact checks que o Observador já fez, em abril. Nem oito meses foram suficientes para que caíssem por terra as histórias por trás de um alegado interesse de Bill Gates na criação da pandemia para vender depois a vacina. Com vacinas já desenvolvidas é só acrescentar pormenores à primeira — e já muitas vezes desmentida — história.

Bill Gates não é acionista da Pfizer, ainda que a sua fundação tenha feito doações para ajudar no desenvolvimento da investigação científica. Já sobre o filantropo Soros ser o “principal patrocinador da OMS”, é mentira. E também não é a Fundação Bill & Melinda Gates (que surge em segundo lugar na lista). Em primeiro lugar, está mesmo a Alemanha. Pode consultar detalhadamente a informação no site da OMS aqui e constatar que George Soros nem surge na lista.

Conclusão

Nenhuma das muitas afirmações ao longo da publicação corresponde à verdade. A utilização de várias referências parece conferir-lhe alguma credibilidade, mas com alguma pesquisa é fácil verificar que não se tratam de factos, mas de referências erradas. Com a chegada da vacina a vários países — depois de autorizações de emergência por parte dos reguladores dos Estados Unidos, Europa ou Reino Unido —, têm-se multiplicado as publicações falsas para criar uma sensação de insegurança face à vacinação contra a Covid-19. É uma das preocupações que vários países estão a colocar no topo da lista: combater as fake news em relação à vacina que podem desencorajar as pessoas em relação à vacinação e dificultar o controlo da pandemia.

Assim, de acordo com a classificação do Observador, este conteúdo é:

ERRADO

E de acordo com a classificação do Facebook, este conteúdo é:

FALSO: as principais alegações do conteúdo são factualmente imprecisas. Geralmente, esta opção corresponde às classificações “falso” ou “maioritariamente falso” nos sites de verificadores de factos.

Nota: este conteúdo foi selecionado pelo Observador no âmbito de uma parceria de fact-checking com o Facebook.

IFCN Badge