Provavelmente não teria o prazer da companhia do estimado leitor do Observador se o título tivesse sido “Agricultura”. E isso é um problema. A agricultura não é “sexy”, nem parece mais fazer parte da nossa cultura. Numa sociedade ocidental, onde tudo nos é servido à mesa — ou nas prateleiras do supermercado — a agricultura perdeu reconhecimento. A sua importância fundamental para alimentar a crescente população mundial – e para garantir a estabilidade social – não é nem valorizada, nem devidamente respeitada.

Prevê-se ser necessário aumentar em mais de 50% a produção agrícola mundial para poder alimentar os mais de 9 mil milhões de habitantes do nosso planeta em 2050. Ou seja, aumentar a produtividade sem aumentar a área de produção (pois precisamos parar a desflorestação, que é responsável por 10 a 15% das emissões globais de dióxido de carbono!). Falamos, pois, do papel fundamental da agricultura sustentável — nas suas três dimensões: económica, ambiental e social – para dar resposta a este novo desafio da Humanidade.

Os epicentros deste desafio, onde também se espera o maior aumento populacional, são os chamados países de baixo e médio rendimento, principalmente na Ásia, África e América Latina. Nestes países, existem hoje cerca de 550 milhões de produtores de pequena escala, responsáveis por alimentar mais de metade da sua população. No entanto, a produtividade desses pequenos agricultores é muito limitada. Isto devido a muitos factores, como o parco acesso a tecnologia, informação ou ferramentas financeiras e oportunidades de mercado. Encontrar soluções para estes factores, em simultâneo, implica trabalhar em parcerias, envolvendo os sectores público e privado, assim como organizações não governamentais. Falamos de um verdadeiro sentido colectivo de missão, onde o tempo urge e é imprescindível confiar na Ciência, para assegurar que nos movemos dentro dos parâmetros da agricultura sustentável. Uma agricultura moderna, inovadora e apoiada por ferramentas digitais, de que tanto necessitamos para alimentar as gerações futuras num clima de estabilidade social.

Mas onde está a nossa “agricultura”? Em estudos realizados nos últimos anos, neste caso nos E.U.A. e na Alemanha, muitas das crianças questionadas responderam que a origem do leite era o pacote. Os produtores agrícolas – em especial dos países ditos “desenvolvidos” — são muitas (demasiadas) vezes colocados na ingrata posição de terem de se justificar perante alguma opinião pública que usa factos científicos para umas coisas (como as inegáveis alterações climáticas), mas por vezes se recusa a usar os factos da mesma “Ciência” para aceitar outras (por exemplo, o uso regulado de produtos fitossanitários ou sementes geneticamente modificadas). Tem havido mesmo casos de bullying em escolas secundárias na Alemanha com filhos de agricultores, simplesmente por serem filhos de quem são… E, pergunto eu, não será uma das profissões mais nobres trabalhar para alimentar a Humanidade? Acre cultura a nossa.

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