Com a entrada em funções do XXIV Governo Constitucional é chegado o tempo de responder de forma efetiva aos desafios e aos problemas profundos e estratégicos, com que o nosso Portugal se confronta ao cabo de 50 anos de democracia.

Bem sabemos que o Governo liderado por Luís Montenegro tem dossiers urgentes em mãos, como são a recuperação do tempo de serviço dos professores, a dignificação das carreiras dos polícias, a resolução do caos nas urgências, ou a nuvem que paira sobre a introdução ou não do Serviço Militar Obrigatório (SMO).

Do meu ponto de vista e mesmo considerando a necessidade de dar uma resposta imediata a estes problemas, todos eles refletem questões mais profundas de organização e Reforma Estrutural do Estado.

Na Educação, é necessário rever a Lei de Bases, um documento com quase 40 anos, que urge reformar. Dos vários contributos e iniciativas para a sua revisão destaco o contributo feito pelo Conselho Nacional de Educação, em 2017, e que pode servir para estruturar e aplicar um novo e necessário sistema de ensino em Portugal.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Como já aqui escrevi, “Reformar a Educação, é Reformar Portugal”. Devemos ter consciência de que nos últimos 20 anos, a estrutura económico-social do País, os circuitos de mobilidade social, os empregos e as áreas de investigação já se modificaram diversas vezes, existindo hoje no mercado de trabalho profissões, que não eram possíveis de imaginar há menos de 10 anos.

A Educação deve ser assim o primeiro desígnio do novo Governo, pelo contributo indelével que esta área de Governação do País conduz, no médio-longo prazo, sendo a peça chave para o bom funcionamento do elevador social e vetor fundamental de um Portugal mais competitivo, com Cidadãos mais instruídos e mais capazes.

Em segundo lugar, a reforma profunda da Justiça em Portugal, cumpre um papel igualmente importante, na reorganização do Estado e principalmente no aumento da confiança dos Cidadãos no sistema judicial.

É importante que a reforma da Justiça não se perca na mediatização provocada pelos “megaprocessos” e pela corrupção, que apesar de serem áreas da maior relevância e que necessitam da atenção do Governo, correspondem a uma parte relativamente pequena da atividade judicial em Portugal.

O Governo e a Assembleia da República devem envidar os seus esforços no combate à lentidão da justiça e à simplificação da tramitação processual, que na justiça administrativa e fiscal, são matérias que impactam fortemente no desenvolvimento social e económico de Portugal.

O aumento da eficiência pela adaptação do sistema à realidade digital e virtual do século XXI, a simplificação dos rituais jurídicos ou a redução do tempo que duram os processos em primeira instância, serão alterações imprescindíveis para a reforma da Justiça, que deve ter como principal objetivo a proteção dos Cidadãos com menos condições ou em situação de vida mais frágil. É com esse desígnio que devemos avançar para esta reforma, terminando com várias décadas de cuidados paliativos, a uma das áreas imprescindíveis ao Estado de Direto Democrático.

Por último, mas não menos importante, a questão da Política Externa e da Defesa Nacional e Europeia, assumirá uma relevante fatia das preocupações do atual Governo, nomeadamente devido à guerra provocada pela Rússia, na Ucrânia e as ameaças que daí advém para a União Europeia e para a conceção de mundo livre e democrático que defendemos.

Existem duas dimensões de que é preciso cuidar nos próximos meses e anos.

Em primeiro lugar e de ação direta do Governo de Portugal, a capacitação global das Forças Armadas, com a reorganização e requalificação das infraestruturas militares, a renovação e o investimento no equipamento militar permanente e, principalmente, o aumento dos recursos humanos que estão em permanência ao serviço das Forças Armadas Portuguesas.

Independentemente da discussão, de alguma maneira, estéril, sobre o regresso ou não do Serviço Militar Obrigatório, é muito importante que todos tenhamos consciência que os valores da liberdade e da democracia que hoje nos permitem recusar o próprio SMO, estarão em causa, se os Governos não tomarem as medidas que se exigem, sem estarem constantemente a medir o pulso à popularidade das suas ações.

A desmilitarização nacional e europeia, provocada pela inação e impopularidade das medidas, principalmente ao longo das últimas três décadas, pode ter consequências devastadoras para a paz na Europa. Esta afirmação facilmente se constata, no quadro europeu, pela história recente, desde as guerras na antiga Jugoslávia (anos 90), no Afeganistão e no Iraque (anos 2000), ou mais recentemente na Ucrânia (2014 e 2022), onde ficou provada a total dependência da Europa, dos Estados Unidos da América e da NATO.

Neste quadro, que é a segunda dimensão desta área, o Governo Português deve defender a progressiva criação de um Exército Europeu, no âmbito do definido na Política Comum de Segurança e Defesa e do Tratado de Maastricht.

Um continente largamente representado na União Europeia, com mais de 500 milhões de habitantes, com a importância económica amplamente reconhecida à escala planetária, não pode continuar sem um exército europeu comum, capaz de defender a herança de cerca de 70 anos de construção europeia pelos valores da paz, da livre circulação, da democracia e da liberdade de expressão.

São estes os desafios que se colocam no curto médio prazo a Portugal e para os quais devemos trabalhar: a Educação pensando no futuro das novas gerações e do País, a Justiça para devolver aos Cidadãos a confiança no Sistema Político e Jurídico, com relevantes contributos para a Nação, para os Cidadãos e para a Economia, e a Defesa, sob pena de que, a falta de ação nesta área, redunde na ameaça séria e objetiva à Liberdade e à Democracia.