Depois de quase dois meses imersos numa distopia digna de um filme de ficção científica, talvez seja um exercício interessante pensar no quão diferente esta quarentena teria sido há 10 anos. Há apenas dez anos, teria sido possível manter este nível de teletrabalho? Quantos negócios teriam caído na ruína quase imediata, sem um canal alternativo de vendas?

Em 2007, a Apple acabava de apresentar a primeira versão do iPhone. O primeiro iPhone foi um verdadeiro game-changer, um marco numa revolução digital que já teimava entrar em ebulição. Os números não mentem: em 2007 havia 776 empresas de TI em Portugal. Em 2017, eram 1489.

Subitamente, parecia que o mundo estava nas nossas mãos. Com os smartphones e tablets ao leme, as aplicações começaram a proliferar. Primeiro, a explosão das redes sociais. Tínhamos tido um leve sabor com o Hi5, o Orkut ou o MySpace, mas nada nos preparou para o que veio a seguir.

O Facebook, o Instagram, o Twitter e o LinkedIn foram um verdadeiro meteorito que entrou em rota de colisão com os media tradicionais, ao ponto de se tornarem canais de publicidade tão rentáveis, como a televisão ou a rádio. De repente, as marcas saltaram para a nossa esfera privada, para os espaços que partilhamos com amigos.

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Depois, começaram a surgir as plataformas de sharing. Trouxeram consigo, algo absolutamente novo e disruptor: a gig economy. Independentemente das nossas opiniões sobre este tema, é impossível ignorar o impacto de plataformas como o AirBnB, a Uber ou a Glovo. Afinal, quem diria que em 2020, no meio de uma quarentena, íamos escolher o que queríamos jantar com a ponta do polegar?

Pelo caminho, o Google tornou-se o nosso maior confidente, o nosso médico de cabeceira, o nosso dicionário, as nossas novas Páginas Amarelas. Perante um problema, muitas vezes o nosso primeiro instinto, é pesquisar. É com o Google que tiramos as nossas dúvidas mais íntimas. Mas, também está presente no trabalho. Cada vez mais partilhamos documentos no Drive ou armazenamos dados na cloud. Até já conversamos com ele: basta um ‘OK Google’ para iniciar o diálogo.

Tal como as redes sociais, o Google depressa se tornou num veículo de negócio. Os anúncios nos motores de pesquisa e a eclosão do SEO, foram um momento ‘eureka!’ no Marketing. Em vez de procurarmos Clientes, começámos a usar os motores de busca para atrair Clientes que estão à nossa procura, com tudo o que isso implica a nível de custos e de eficácia.

O passo seguinte era inevitável. Com a informação submetida em tempo real pelos próprios utilizadores, começámos a recolher mais dados e a deixar que influenciassem as nossas decisões. Incorporámos isso nas nossas vidas em tempo record: basta ver a adesão a apps como o Waze ou o Google Maps. Quantas vezes, em férias, escolhemos um restaurante com base nas críticas de estranhos? Quantas decisões tomamos com base nos dados recolhidos pelo Google Analytics?

Contudo, esses exemplos são uma simplificação do verdadeiro poder da nossa conectividade. A recolha massiva de dados, trouxe-nos a era da “big data”, das “smart homes” e cada vez mais das “smart cities”, cujo impacto ainda só agora estamos a experimentar. As possibilidades são infinitas – mas sobre isso falaremos daqui a 10 anos, em 2030.

Seria ingénuo, porém, pensar que tudo se tornou mais fácil. Todos estes avanços tiveram consequências profundas nos nossos comportamentos e hábitos de consumo. Estamos mais impacientes: procuramos respostas concretas e imediatas, não estamos dispostos a esperar. Até onde vai a nossa paciência agora? Até que ponto é que isto influencia a nossa fidelidade enquanto consumidores?

Habituámos-nos a fazer a nossa própria televisão com as plataformas de streaming e nem esperamos por ver um episódio a cada semana, porque nos dedicamos ao binge-watching (outro passatempo tão popular nesta quarentena!). Não esperamos pelo jornal do dia seguinte ou pelo noticiário – antes disso já estamos no Twitter, a ler vinhetas de 280 carateres que se espalham como um rastilho de pólvora. Não vamos além dos primeiros resultados do Google.

Para as empresas, obviamente, isto é um desafio. Estamos perante uma espada de dois gumes: nunca estivemos tão próximos do nosso público-alvo, mas os nossos concorrentes podem gabar-se do mesmo. Só resta uma alternativa, cada vez mais clara, que é levar o consumidor para o coração do funil de vendas e reconhecer uma nova dinâmica de poder. Mesmo à distância, como agora, nunca podemos perder de vista o sucesso dos nossos Clientes. E essa sim, talvez tenha sido a maior revolução destes últimos 10 anos. O foco no Cliente.