No passado dia 29 de fevereiro, o mais raro do calendário, assinalou-se o Dia Mundial das Doenças Raras, data em que também foi divulgado o relatório “Centros de Referência para as Doenças Raras e a Relação de Proximidade com as Redes Europeias de Referência”, promovido pela RD-Portugal, União das Associações das Doenças Raras de Portugal.

Este relatório compila os contributos resultantes da 2.ª Reunião do Conselho Científico da RD-Portugal, abordando medidas e soluções que permitirão facilitar a vida dos doentes e melhorar o trabalho dos profissionais de saúde.

Um dos pontos de partida foi o inquérito às Pessoas com Doença Rara apresentado. Verificou-se que quase metade das pessoas com doença rara (48%) não são acompanhadas em nenhum centro de referência. Tal acontece por vários motivos: porque são acompanhados em consulta específica, são acompanhados em Centro de Referência, mas não da sua Doença Rara ou simplesmente não existe Centro de Referência para a sua Doença Rara ou ainda por desconhecimento do conceito de Centro de Referência.

É importante, por isso, ressalvar e comunicar que os centros de referência são instituições altamente especializadas que desempenham um papel crucial no tratamento de quem dele necessita.

Por outro lado, verificou-se que mais de 90% dos inquiridos (91,8%) não tem acesso a consultas multidisciplinares, mas sim separadamente. Ou seja, isto reflete uma potencial melhoria no sistema de saúde, uma vez que tal poderia melhorar a partilha de conhecimento sobre doenças raras e levar a antecipar diagnósticos, tratamentos mais adequados e uma compreensão abrangente das necessidades específicas dos doentes.

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É, portanto, importante promover a marcação de consultas multidisciplinares, para evitar deslocações dos doentes a várias consultas em diferentes dias e potenciar a discussão de casos entre diferentes especialistas.

O segundo aspeto que gostaria de evidenciar é que 51% dos inquiridos considera que não existe uma comunicação regular entre os clínicos de várias especialidades. Neste âmbito, é imperativo implementar uma abordagem multidisciplinar e promover a comunicação regular entre os diferentes especialistas no processo de acompanhamento ou tratamento.

Verificámos que 61,5% das pessoas com doenças raras referem nunca ter sido informadas sobre a existência de uma associação de doentes. As associações de doentes são fundamentais para proporcionar suporte, informações e outros recursos a todos aqueles que precisam. A RD-Portugal, enquanto federação agregadora de 45 associações  que defende os direitos das Pessoas com Doença Rara e/ou deficiência por esta gerada, vem proporcionar essa ligação entre as entidades de cuidados e as associações e os seus respetivos associados, as famílias afetadas.

Em suma, este relatório, no respetivo questionário, permite perspetivar inúmeras mudanças no que aos centros de referência diz respeito.

Em primeiro lugar, equipas multidisciplinares com psicólogos, assistentes sociais e fisioterapeutas que garantam as necessidades dos doentes e uma superior qualidade de vida da família. Ao nível psicológico é expressivo percebermos que 86,7% dos cuidadores das pessoas com doenças raras não têm acesso a apoio psicológico, quando estes são o garante e suporte na vida das pessoas com doenças raras.

Outra medida proposta é o reforço no apoio administrativo e de secretariado, bem como no número de enfermeiros nos centros de referência (CR). A consolidação da informação num registo nacional único, incluindo a informação específica das doenças raras, permitirá um acompanhamento adequado, especialmente em situações de emergência, bem como a produção de informação estatística e outros dados complementares.

No que concerne à relação com as Redes Europeias de Referência, é proposto que se cumpra a legislação europeia para tratamentos transfronteiriços através da criação de uma organização local como ponto de contacto bem identificado para tratamentos em CR europeus.

Outro aspeto crucial corresponde à compra centralizada de medicamentos órfãos por forma a reduzir custos globais e de cada estado membro. Em resumo, os CR são entidades dinâmicas e multifacetadas, indispensáveis para além do tratamento, englobando também a educação, investigação e inovação em saúde.

No entanto, um esforço organizado e contínuo é absolutamente crítico para melhorar a formação, a gestão, a comunicação e a colaboração dentro do sistema, visando uma abordagem mais holística e integrada no tratamento das Doenças Raras. A avaliação e monitorização dos CR, realizadas de forma eficiente e integrada, são cruciais para assegurar o acesso e a utilização adequada dos serviços, beneficiando todos os cidadãos e fortalecendo o sistema nacional de saúde.

Artigo de opinião de Paulo Gonçalves, presidente da RD-Portugal, União das Associações das Doenças Raras de Portugal