Portugal é um país extraordinário, que é atlântico e mediterrâneo ao mesmo tempo, ibérico e com ligação ao resto do planeta, com uma vitalidade, convivialidade e cordialidade extraordinária”, afirmou Edgar Morin, em 2019, na apresentação do meu livro O Devir da Lusofonia, no Porto. Mesmo antes da pandemia chegar, quem não o ouviu nessa altura pensou, certamente, que não mais teria essa oportunidade. Até porque era a segunda em dois anos, já que em 2017, ele tinha apresentado o meu outro livro, Lusofonia e Francofonia: A aliança da latinoesfera, na Fundação Gulbenkian, em Lisboa.

Mas o destino e a determinação de Edgar Morin supreendeu-nos a todos e, na passada semana, aos 102 anos, ele voltou Portugal, desta vez para nos encantar com uma reflexão sobre o Humanismo e a Lusofonia – não fosse ele um dedicado amigo do Institut du Monde Lusophone (IMULS), tendo acompanhado a sua criação desde a primeira hora, quando éramos colegas do CNRS.

Desde esses tempos, muito tenho aprendido com ele sobre a importância e o alcance do universo lusófono no século XXI e sobre as vantagens de criarmos laços com a francofonia no âmbito da globalização. Foi também inspirada pelo seu pensamento que fundei o IMLUS e é por essa razão que o IMLUS veio complementar uma necessidade da própria CPLP, que até então tinha apenas organizações de carácter governamental ou diplomático.

O IMLUS é a prova de que se podem criar projectos nobres a partir da sociedade civil e com o apoio do mundo empresarial, que tem aqui um papel determinante para escrever com as cores da lusofonia uma nova página, mais moderna e progressista. Chegou o momento de zelar pela construção de uma verdadeira união económica lusófona e estruturar melhor as redes económicas da lusofonia, baseadas na sua singularidade cultural.

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Felizmente, o IMLUS é hoje uma instituição com trabalho reconhecido, tanto no mundo lusófono como no francófono, e cada vez mais solicitado pela sua expertise na Educação, o suporte ao desenvolvimento económico e não só. Mas, como nos explicou agora Edgar Morin, há muito mais para fazer na valorização da riqueza da multiculturalidade lusófona.

É nessa missão que o IMLUS está focado, empenhando-se em desenvolver o conhecimento nas grandes apostas da mundialização das economias, acentuando as relações entre o mundo lusófono, o mundo francófono, fortalecendo de forma construtiva e consequente os laços entre a comunidade lusófona e francófona.

Temos já parceiros privilegiados, como o Senado francês, a UNESCO, a empresa Total, a Région Île-de-France, o Museum Naturel, várias universidades, a Câmara de Comércio e de Indústria da Région Île-de-France e várias empresas da lusofonia e da francofonia. Mas precisamos de todas e de todos os que acreditam neste propósito, que acreditam ser possível ir mais além como nos incentiva Edgar Morin. Porque é desta união de esforços, de vontades, de inteligências e saberes diversos que pode nascer – muitas vezes nasce – a solução para os inúmeros problemas económicos (e não só) de cada sector, de cada realidade social e económica, de cada um de nós.

Há, porém, uma dúvida que permanece e sobre a qual todos os lusófonos têm uma palavra a dizer. Neste mundo cada vez mais digital, mais acelerado e universal, falta saber até onde o Português poderá continuar a ganhar relevância no panorama dos negócios a nível internacional. A língua portuguesa é uma mais-valia, frequentemente, negligenciada no plano económico, mas que representa uma dimensão essencial, que não pode ser minimizada. Uma coisa é certa – tendo em conta os indicadores macroeconómicos e populacionais e a forte cultura que os une, nomeadamente a língua –, a lusofonia tem todas as condições para vir a ser uma zona económica de importância global, à semelhança da União Europeia.

Parece um desafio inalcansável? Não é! Veja-se o vigor com que, aos 102 anos, Edgar Morin reflectiu sobre a lusofonia, agora, na Fundação Oriente. E lembremo-nos de quem ele tantas vezes nos fala: Bento de Espinosa, descendente de portugueses e considerado um dos grandes filósofos da sua época (a par de Leibiniz e Descartes), que, a partir de Amesterdão, acabou por influenciar profundamente, o pensamento europeu moderno.