O setor da construção, contribuindo para mais de 15% do PIB e 10% do emprego, é reconhecidamente um dos principais drivers da economia portuguesa. Não obstante, mais de 99% do tecido empresarial é composto por micro, pequenas e médias empresas, destacando-se assim como uma indústria muito fragmentada e volátil, e por isso relativamente suscetivel a oscilações económicas: à medida que a economia retrai e os constrangimentos de crédito impactam no investimento, tende a nascer uma nova crise. Isto ganha particular importância num cenário de aumento dos custos de construção e de forte concorrência centrada no preço, diminuindo a rentabilidade das empresas; e, especialmente, perante o elevado endividamento e falta de liquidez do setor.

Sobre o endividamento, a maioria das empresas de construção financia-se em cerca de 70% com capital de terceiros, chegando em alguns casos a quase 90%, o que é deveras preocupante. Enquanto a dívida pode ser positiva por via de mais benefícios fiscais e maior eficiência na geração de lucros (maior rentabilidade do capital para os acionistas), pode também tornar-se prejudicial, caso os investimentos não sejam produtivos o suficiente para fazer face ao serviço da dívida, podendo criar problemas de liquidez (e.g. falta de capacidade para cumprir as obrigações financeiras de curto prazo); ou caso o endividamento seja elevado e prolongado no tempo, aumentando a vulnerabilidade a variações de mercado (e.g. aumento das taxas de juro).

Neste sentido, importa destacar a lei nº 41/2015 (regime jurídico aplicável ao exercício da atividade de construção), que define requisitos económico-financeiros mínimos a cumprir pelas empresas detentoras de alvará de construção (permissão para a atividade de construção consoante a categoria/tipo e a classe/valor máximo dos trabalhos), em particular para aquelas com contabilidade organizada e com títulos habilitantes superiores à classe 2 (limiar de 400 000€, segundo a portaria nº 212/2022). A título de exemplo, a lei destaca os indicadores de liquidez geral (capacidade para responder às responsabilidades de curto prazo) e de autonomia financeira (capacidade para vencer os compromissos financeiros utilizando capitais próprios – contrário ao endividamento), cujos valores de referência são fixados na portaria nº 274/2011. Estes valores, contudo, podem ser difíceis de cumprir devido a causas comuns como sobrecustos e atrasos nos pagamentos a receber.

Posto isto, os quadros superiores das empresas deverão assegurar uma gestão diligente e criteriosa, podendo, caso contrário, ser diretamente responsabilizados, civil e criminalmente. A saber, o património pessoal dos gestores pode ser chamado a responder pelas dívidas da empresa e, no limite, uma situação de insolvência (impossibilidade de cumprir as obrigações vencidas) pode implicar pena de prisão até 5 anos. O dever de indemnizar pelos danos causados por conduta ilícita (responsabilidade civil), ou seja, em violação de deveres legais ou contratuais (e.g. endividamento e prejuízo por celebração de negócios ruinosos em proveito próprio), pode abranger não só a sociedade mas também sócios e terceiros.

Os deveres gerais dos gerentes, administradores ou diretores podem ser encontrados no Código das Sociedades Comerciais (CSC), que prevê também, desde 2006 (pelo decreto-lei 76-A/2006), a figura do seguro de responsabilidade civil para este tipo de entidades (internacionalmente, “Directors and Officers Insurance”), enquanto instrumento para suportar a cobertura necessária para cumprir com as exigências legais (e.g. cauções, encargos jurídicos, indemnizações, etc.). Mais recentemente, pela lei nº 94/2021, o CSC foi reforçado no âmbito da aprovação de um conjunto de medidas previstas na Estratégia Nacional Anticorrupção.

A liderança assume assim um papel fundamental na saúde e sucesso das organizações, admitindo, além da esperada mobilização das pessoas em torno de uma visão comum (“soft skills”), adequadas competências técnicas (“hard skills”) que abranjam a parte financeira, mas, sobretudo, uma conduta pautada por princípios éticos. Eventuais benefícios de curto prazo são facilmente superados por consequências de médio e longo prazo que podem implicar, além da deterioração da reputação e respetivo impacto no negócio e nos intervenientes, suspensão ou anulação de licenças profissionais, multas ou coimas e, no limite, processos criminais.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR