Uma das nossas principais riquezas é o tempo. Já pensou a sério nisso?

Certamente já deu conta que repetimos muitas vezes “não tenho tempo para nada!” ou “estou cheio de trabalho”. A resposta do outro lado é quase sempre a mesma: “bom sinal”. Será? Trabalhar mais tempo significa mais rendimento? Não necessariamente. Contudo, no processo de investimento, se investirmos na carteira certa e de acordo com o nosso plano, investir durante mais tempo pode mesmo significar mais rendimento.

Atrevo-me a dizer que o tempo é um fator deflacionário. Com o tempo ganhamos experiência, conhecimento, disciplina, maturidade, o que nos faz fazer muito mais no mesmo período. E isto leva-nos à produtividade, pois apesar de trabalhamos muitas horas, a realidade é que nem sempre produzimos o que devíamos e não somos remunerados pelo tempo dedicado.

Como vivemos num cenário de clara mudança de paradigma em relação à inflação, também é caso para questionar: poderíamos viver num sistema deflacionário em vez de num sistema inflacionário onde a moeda está constantemente a ser desvalorizada e onde a solução para tudo parece ser, mais dinheiro?

Vivemos e antevemos tempos conturbados. Os sinais estão aí e os dados não parecem viciados. Estamos pacientemente à espera de uma recessão, ansiosos pela adversidade, mas sem tempo para poupar e investir. Contudo, há conselhos intemporais e, neste momento, é essencial recomendar prudência, mais poupança, reduzir dívida e investir o nosso dinheiro de forma reprodutiva.

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Life is very short and there’s no time

Temos a sensação de que vivemos abaixo das nossas necessidades e desejos, mas a realidade é que vivemos quase sempre acima das nossas possibilidades. No fundo, esperamos que com o tempo o rendimento aumente e compense esta discrepância da nossa realidade financeira.

Olhamos para a vida dos nossos antepassados e percebemos que temos um nível de vida muito acima do que eles tiveram. Vivemos melhor e esperamos o melhor, mas não nos preparamos para o pior. Procrastinamos as tomadas de decisão ao nível financeiro, vivemos muito depressa e esquecemos que o futuro é já amanhã. A vida é curta e não há tempo para poupar.

Também a economia parece desfasada da realidade. Deparamo-nos com um sistema que se desinteressou completamente das pessoas. Utilizamos métricas um pouco anacrónicas e irrelevantes como o PIB (como referiu Thomas Sowell em Basic Economics), olhamos para a taxa de desemprego como um indicador da saúde da economia e não da sociedade, acreditamos num mundo imenso de subsídios e burocracia sem perceber que ficamos cada vez mais dependentes, um fator trabalho valorizado muito abaixo das expectativas e, lá está, castigados pela falta de tempo.

Talvez seja, então, este o momento de nos virarmos para o verdadeiro ativo desta equação: o tempo. A economia, como disciplina social, deveria também preocupar-se com o tempo e não apenas com a maximização da produção de bens e serviços num mundo de recursos limitados e necessidades ilimitadas, autoalimentado por uma máquina de produção de incentivos e dinheiro. A economia deveria estudar de que forma poderemos maximizar o tempo, sabendo que vivemos num sistema onde esse recurso é limitado.

Em 1930, o economista John Maynard Keynes escreveu um paper, Economic Possibilities for our Grandchildren, no qual previa que no futuro a evolução tecnológica seria tal que iriamos trabalhar menos, não ter preocupações com dinheiro e ter mais tempo. Lá está, o tempo é o mesmo, o que muda é a utilização que fazemos dele.

É aqui que me lembro do exemplo Warren Buffett. Buffett aliou-se ao tempo. Teve sempre o tempo do lado dele. Não se importou com o presente, não teve pressa nem procurou o lucro rápido e não se distraiu com as flutuações diárias dos mercados. Aproveitou oportunidades onde outros viram problemas, cometeu erros, tomou decisões, definiu estratégias e teve paciência.

Investing in yourself

kendrick Lamar e Ray Dalio também se juntaram para uma mensagem reforçando a importância de investir para nos tornarmos mais independentes e resilientes em termos financeiros. Destacam a importância do “slow money” que, nas palavras de Dalio, significa aproveitar os benefícios do efeito de capitalização ao longo do tempo. O próprio dinheiro faz dinheiro. E para isto precisamos de conhecimento e confiança, num processo que se quer aborrecido e sem a adrenalina ou o glamour de Wall Street e da especulação financeira.

Temos falado muito em literacia financeira. Ainda bem. Muitos programas, muitos artigos, muitos podcasts. É bom. Mas ainda seria melhor se aproveitássemos este conhecimento para colocar em prática um plano, por mais simples que este seja. Um plano que tenha pelo menos estes 3 fatores em harmonia: tempo, capacidade de poupança e otimismo. E depois é seguir o plano. “Stay the course”, como bem definiu John Bogle n’O Pequeno Livro do Investimento (The Little Book of Comnon Sense Investing).

Neste contexto é bom relembrar o propósito das finanças: ajudar as pessoas a poupar, a gerir e a fazer crescer o seu dinheiro.

Mas se a literacia financeira é importante para investir, não é a falta de conhecimento que nos impede de o fazer – é a falta de confiança. Há muitas pessoas com conhecimento que não investem.

A verdade é que há sempre dúvidas no caminho. Se não é por uma razão é por outra. Será este o melhor momento para investir? “Time in the market” – investir de forma consistente e continuada ao longo do tempo – é melhor do que market timing – tomar decisões com base em previsões sobre o comportamento futuro dos ativos – e com a vantagem de exigir muito menos esforço mental.

Peter Lynch, um dos maiores investidores de sempre, defendia a consistência. John Bogle, no seu livro já citado, também. Não precisamos de grandes ideias de investimento. Investir com tempo é melhor do que tentar encontrar o melhor timing, confiando na sorte ou no azar e no custo dos erros emocionais.

A minha experiência como investidor está repleta de erros, mas também de descoberta e aprendizagem. Às vezes não encontro forma de poupar, outras vezes tenho medo de investir, noutras deixo-me influenciar pelo ambiente que me rodeia, mas não me esqueço que ainda vou a tempo e que devo recentrar-me naquilo que são os meus objetivos de longo prazo, na minha tolerância ao risco e nas minhas preferências e restrições.

Não é preciso bater o mercado

Um dos problemas mais comuns no processo individual de investimento é tentarmos investir como os profissionais e como os gurus. Mas a verdade é que a maior parte deles tem uma performance pior do que o mercado.

Não precisa de tentar. Pare de tentar lutar com o mercado e esperar controlar algo que é incontrolável. Invista de forma consistente, diversificada e no longo prazo. Pense em controlar o seu processo, não em controlar o impossível: se o mercado vai ou não descer hoje.

Sabemos que investir assim é contraintuitivo. As notícias, os analistas, os gestores, os amigos, todos nos avisam que investir é estar atento a cada notícia, a cada movimento do mercado, às dicas de investimento, a procurar a agulha no palheiro. E para isto não temos tempo. Ninguém tem. Por isso, desistimos e mantemos o dinheiro parado, a ser corroído pela inflação, a ser transferido de forma silenciosa para impostos e a diminuir drasticamente o nosso poder de compra.

Se ainda não começou a poupar, comece agora. Se já poupa, aumente o valor da poupança. Se já poupou o suficiente, continue a investir tendo em atenção os seus objetivos, as suas preferências e restrições de investimento. Tenha o tempo como seu aliado. Pare de tentar e invista!