Com o recente pacote de medidas “Mais Habitação” o Estado vai conseguir duas coisas: Menos habitação e mais Estado na habitação. E também muito mais confusão fiscal.

Menos habitação, porquê? Porque o controlo das rendas nos novos contratos de habitação leva inevitavelmente ao fim do mercado de arrendamento.

Até agora os senhorios eram livres de fixar a renda nos novos contratos. Podiam também acordar a taxa de atualização, mas normalmente não o faziam, sujeitando-se aos coeficientes decretados pelo governo, sempre abaixo da inflação (este ano a diferença foi de 8%). Preferiam fazer contratos mais curtos para poder ajustar a renda e assim compensar as perdas com as baixas atualizações.

Aparentemente, as rendas nos novos contratos passam agora a ser fixadas a partir das rendas dos contratos anteriores. Digo aparentemente porque, como é costume, não é fácil perceber exatamente o que governo pretende fazer. A verificar-se o controlo das rendas nos contratos novos, as casas vão sair do mercado de arrendamento.

Para que haja mercado de arrendamento é preciso que o valor das casas se traduza no valor das rendas. Quando o valor das casas pode aumentar muito, mas o valor das rendas não pode, deixa de haver arrendamento.

As casas não ficam devolutas, porque normalmente as pessoas não gostam de perder dinheiro. Quanto mais compulsivo for o arrendamento, e esse é outro mimo deste pacote, mais rapidamente as casas vão ser vendidas, mas não certamente para arrendar.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Vai haver mais casas para comprar. É boa notícia para quem quer comprar, mas não para quem comprou e tem de pagar empréstimos com taxas a subir. Também não é nada boa notícia para a estabilidade financeira.

Se vai haver mais casas para comprar, porquê menos habitação? Porque há muita gente que não quer ou não pode comprar. Neste novo mundo de mobilidade digital cada vez há mais gente a querer arrendar e menos a poder comprar.

É aí que entra o Estado senhorio, com o novo Serviço Nacional de Habitação. Estive a rever a Constituição e não me parece que seja incumbência do Estado. Há uma obrigação de promover a construção de habitações económicas e sociais, mas suponho que seja para os pobres, e não para todos.

E depois, quanto é que vai custar esse novo serviço público, pago com que impostos, e quais são as credenciais do Estado para uma gestão minimamente eficaz? Não é certamente a capacidade de gestão da saúde pública.

Alguém me dizia no outro dia que nos anos 80, quando se casou, não havia uma casa para arrendar. Não é que fosse difícil, não havia uma única casa. A razão era ainda a herança do congelamento das rendas da primeira República. Uma lei de 1914, com a desculpa da guerra, congelou as rendas de antigos e novos contratos, com obrigação de arrendar casas devolutas pelo valor da renda à data da lei. Também incluía o arrendamento compulsivo. Só não se atreveram a pôr o Estado a arrendar casas. Os políticos da primeira República tinham uma visão mais realista do Estado e, neste capítulo, ficaram-se pela destruição do mercado de arrendamento.

A Constituição também obriga o Estado a adotar políticas que promovam um sistema de renda compatível com o rendimento familiar. Como é que isso se faz? É muito simples: Deixar que a economia funcione com impostos baixos, simples e estáveis, com uma justiça rápida e eficaz, e com intervenção mínima do Estado.