Quantas escolas estiveram totalmente fechadas, por decisão das autoridades de saúde, desde Setembro? Quantas turmas já tiveram de ir para casa e os seus alunos postos em isolamento? Quantos alunos estão actualmente impedidos de frequentar presencialmente as suas escolas? Quanto tempo de ensino presencial perderam, em média, os alunos portugueses (por nível de ensino) desde o arranque do actual ano lectivo (e, já agora, como é que isso compara com outros países europeus)? Olhando mais ao detalhe, quais as regiões ou concelhos onde os alunos foram mais prejudicados por suspensões do ensino presencial? Comparativamente ao ano lectivo passado, qual o impacto da vacinação dos adolescentes no contexto escolar — houve menos suspensões de ensino presencial, como seria expectável, e, se sim, qual o grau dessa diminuição?

Poderia enumerar perguntas para mais dois ou três parágrafos, mas seria inútil pois a resposta nunca se altera: ninguém sabe, visto não existirem dados. Aliás, perdoem-me a imprecisão: alguém sabe, mas esse alguém está no Ministério da Educação e faz questão que nenhum dos dados seja público, impedindo assim a avaliação da situação nas escolas e o escrutínio ao desempenho das autoridades (educativas e sanitárias) na resposta à pandemia.

Se isto lhe soa a história repetida, acertou em cheio: andamos nisto há mais de um ano. Repare na cronologia. Em Setembro de 2020, o ano lectivo começou com um enorme vazio informativo: ao contrário do que sucedeu noutros países, que publicavam regularmente dados actualizados sobre o impacto da pandemia nas escolas, Portugal navegou às escuras. Foram semanas de ruído alarmista nas escolas, plantado por números de fontes não-oficiais. Só em Novembro de 2020, após uma evidente impreparação, o Ministério da Educação anunciou-se capaz de compilar a informação sobre a Covid-19 nas escolas, através de uma recém-criada plataforma electrónica que permitiria acompanhar a situação “em tempo real”. Acontece que, mesmo assim, essa informação não foi disponibilizada, até que a Fenprof levou o Ministério da Educação a tribunal. Em Janeiro de 2021, o Tribunal Administrativo de Lisboa deu razão à Fenprof: o governo teria 10 dias para fornecer os dados. Com o lockdown e o encerramento das escolas decretados uns dias após a decisão, pouca diferença fez. Agora, avançando no calendário e chegando à actualidade, assiste-se a um déjà vu: desde Setembro de 2021, o Ministério da Educação não divulga os dados, a plataforma não contribuiu para qualquer informação pública e esta semana a Fenprof ameaçou recorrer novamente aos tribunais para aceder à informação.

Enquanto a história se repete, o tempo passa e as questões vão ficando sem resposta. O que é lamentável, visto que estas questões têm manifesta relevância. Nesta fase, já ninguém ignora os danos educativos, sociais e psicológicos que a suspensão do ensino presencial tem nas crianças — danos que importa monitorizar para que haja medidas compensatórias proporcionais. Também já ninguém ignora como o vazio de informação oficial é espontaneamente preenchido por desinformação, rumores e inquietação nas comunidades escolares. Mas não é apenas isso que está em causa. Por exemplo, as respostas às perguntas do primeiro parágrafo são determinantes para avaliar a adequação dos protocolos da DGS para as escolas — que tantos têm criticado como excessivos, mas que a DGS tem mantido no geral. Noutro exemplo, um dos argumentos que sustenta a recomendação da vacinação de crianças a partir dos cinco anos está no acabar com as repetidas suspensões de ensino presencial — mas como avaliar a força desse argumento sem dados sobre o que mudou (ou não) para os adolescentes, entretanto maioritariamente vacinados?

Com quase dois anos a viver em pandemia, no que diz respeito ao valor da comunicação e da transparência, o governo e as autoridades sanitárias aprenderam zero. Ao início, parecia incompetência ou impreparação. Agora, sem desculpas possíveis, percebe-se a opção deliberada pela retenção da informação. Ou seja, o governo mostra diariamente como não acredita em tratar os portugueses como adultos. Pode ser que, a 30 de Janeiro, os portugueses lhe respondam à altura.

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