[A propósito das eleições na Ordem dos Advogados, marcadas para os próximos dias 27, 28 e 29 de novembro, o Observador convidou os seis candidatos ao cargo de bastonário a escreverem textos de opinião, que publicamos esta semana. A cada um deles foi feito o mesmo desafio: destacar o tema/prioridade que cada um considera mais relevante no contexto atual da justiça e da advocacia.]

Todos somos ou já fomos jovens advogados. Todos tivemos um determinado percurso de ingresso na profissão. Os mais antigos quase de porta escancarada e os mais recentes com entradas espinhosas e alçapões de permeio. Mas todos fazemos parte da mesma Advocacia da atualidade que muito mudou, socialmente a montante, mas sobretudo em exigência a jusante.

São essas camadas jovens que asseguram o futuro da Advocacia e por isso merecem ser acarinhados, apoiados e acolhidos como iguais. Desde logo no apoio judiciário pois é nessa janela de oportunidade que, em via de regra, irão fazer tarimba judiciária que não tiveram no estágio e começar a constituir uma carteira própria.

É preciso assumir que são a sociedade e a Ordem que convocam os advogados estagiários para si e é a Advocacia que carece de novos advogados qualificados e de renovação geracional contínua, pelo que estes profissionais não podem ser ignorados ou amesquinhados, mas acarinhados e apoiados, técnica e deontologicamente.

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É necessário intervir ativa e empenhadamente para integrar os novos advogados na profissão, com formação prática qualificada segundo critérios revistos, gerando programas concretos de apoio à instalação, organização e funcionamento de um escritório, incluindo a abertura de salas e espaços partilhados nas Delegações e nos
Conselhos Regionais, ou em locais alternativos, segundo regras a definir, mas sempre com o apoio da Ordem dos Advogados. A Ordem não serve apenas para disciplinar, mas, antes disso, para acolher, para incluir, para formar. Antes de exigir, a Ordem tem que oferecer.

Ora esta postura de princípio implica estabilidade pessoal e familiar destes e dos demais advogados que dão corpo e alma, por exemplo, no sistema de apoio judiciário. Isso, por sua vez, implica resolver duas magnas questões: a dignificação com o aumento atualizado da velha tabela de honorários do sistema, que data de 2004, e o seu enquadramento na Caixa de Previdência dos Advogados (CPAS), com assistência garantida tanto na velhice como também na saúde e na doença.

A CPAS é cara e insuficiente, está degradada, pode não ter sustentabilidade a prazo.

Há que intervir ativa e empenhadamente na margem de gestão da CPAS que é conferida à Ordem e ao Bastonário, estimular um clima de negociação tripartido (Ordem, Governo e Solicitadores) para melhorar a proteção social dos advogados, no âmbito da CPAS, e garantir um sistema de proteção e assistência completo e adequado às exigências do nosso tempo e amigo da família e do bem-estar.

Para tal, deve-se estudar a viabilidade e termos para a realização de um amplo debate prévio, seguido de um referendo aos advogados acerca do futuro e reestruturação da CPAS, incluindo a possível integração na Segurança Social. Esta é uma urgência social porque quem, como os Advogados, defende os Direitos dos outros, também deve ter Direitos económicos e sociais. É essa indispensável marca da sociedade democrática com direitos, que se ajusta ao Estado de Direito que os advogados, no seu todo, diariamente garantem.

A outra questão relaciona-se com o facto de, na maioria das vezes, os jovens advogados, que não têm avenças mensais, viverem essencialmente dos baixos honorários que auferem dos processos oficiosos, cuja tabela não é atualizada desde 2004. É preciso, com urgência, atualizar a tabela de honorários devidos pelo Estado aos advogados inseridos no apoio judiciário, assumindo a dignificação desses advogados, no contexto de um serviço público já exigido pela Constituição.

Aqueles que colaboram para outros colegas nos escritórios destes não deixam de se confrontar com uma outra situação que requer uma resposta célere e adequada, porquanto, na sua grande parte, estes colegas trabalham sem qualquer autonomia técnica, cumprindo um horário de trabalho, diretrizes superiores e com instrumentos de trabalho alheios — logo, em regime de subordinação jurídica.

É preciso assumir de vez que os milhares de advogados que estão ao serviço de outros colegas, sobretudo em grandes sociedades, trabalham por conta de outrem, logo, devem estar sujeitos às regras e direitos e deveres da legislação laboral.

É necessário intervir ativa e abnegadamente para acabar com a prática das falsas avenças com colegas de profissão, convertendo essa relação jurídica mascarada em relação laboral transparente, estável e com os Direitos conferidos pela lei do trabalho. Só assim será possível reafirmar e restabelecer a imagem dos Advogados e recolocá-los, junto com a Ordem, no eixo central da administração da justiça a que o Estado de Direito nos convoca.

Devemos, pois, intervir ativamente para dar voz oportuna, credível e audível à Ordem no seu todo e, com isso, aos advogados na defesa da sua profissão e na sua qualificação contínua, através do apoio à formação, a assegurar também no interior do país, com vista à promoção e defesa dos Direitos, Liberdades e Garantias fundamentais face à sociedade, aos órgãos do poder e, mesmo, no seio dos próprios advogados.

Este programa corresponde a uma nova visão para a nossa Ordem dos Advogados, subordinada à ideia de pôr Ordem na Ordem e, com isso, Justiça na Justiça, que, reciprocamente, dependem uma da outra. Essa nova ideia para a Ordem deve assentar no respeito e consideração pelos demais órgãos nacionais, regionais e locais da Ordem dos Advogados e também pela inclusão das capacidades técnicas e acervo de experiência que a Advocacia portuguesa hoje tem. Com esse instrumento, daremos a volta, reconduziremos a Ordem ao seu lugar próprio, de que se afastou, e garantiremos à sociedade portuguesa uma Advocacia de excelência e com futuro.

Ana Luísa Lourenço é candidata a bastonária da Ordem dos Advogados