A proposta do Orçamento do Estado para 2024 foi apresentada no passado dia 11 de outubro com a habitual pompa e circunstância.

A boa notícia é que em termos fiscais não há grandes surpresas, mantendo-se na linha dos orçamentos dos anos anteriores.

O Governo enaltece o enorme esforço na redução do IRS, afirmando o Sr. Ministro que a carga fiscal diminui.

Porém, numa análise mais atenta verifica-se que não é verdade. A carga fiscal vai aumentar e no final do ano os portugueses, na sua maioria, pagarão mais impostos.

É certo que a proposta prevê a atualização dos limites de cada escalão do IRS em 3%, sendo igualmente atualizadas as taxas aplicáveis até ao 5.º escalão.

Contudo, não só esta medida não é suficientemente compensadora pela não atualização dos escalões do ano passado, como, não sendo atualizadas as deduções à coleta e sendo essas despesas maiores por força da inflação, o contribuinte, no geral, será prejudicado.

E a classe média, a mesma que vem sendo prejudicada há anos, continuará a sê-lo, uma vez que as atualizações das taxas serão apenas até ao quinto escalão. Logo, para rendimentos brutos até aos dois mil euros por mês. Ou seja, esta medida não vai abranger toda a classe média.

Aliás, tendo em consideração o aumento do salário mínimo nacional para 820 euros, este rendimento já nem deveria ser referido como de classe média.

E relembre-se que a taxa máxima do IRS – 48% – que se aplica aos contribuintes que tenham rendimentos ilíquidos superiores a 81.199 euros, foi fixada em 2003 e manteve-se inalterada nestes últimos 10 anos!

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No final do ano, a generalidade dos contribuintes irá perceber que, também por força do drástico aumento dos impostos indiretos, pagará, em 2024, mais impostos do que em 2023.

De facto, é estranho que o governo fale em redução da carga fiscal quando termina com o IVA 0% nos bens essenciais e aumenta, de forma clara, todos os impostos indiretos.

De acordo com a proposta apresentada, iremos ter aumentos da receita fiscal com todos os impostos indiretos, sendo que, no IUC, esse aumento supera os 20% e nas bebidas alcoólicas é de 37,3%.

E tudo isto acontece porque se aumenta a despesa do estado, não com propostas estruturais que fossem aceites pelos contribuintes como um esforço atual com benefícios no futuro, mas com despesas para a máquina do estado, que continua a ser muito pesada para as receitas que o País tem.

E voltam a esquecer-se das empresas, essas que estão a estrangular e precisavam nesta altura de um alívio fiscal para, por exemplo, possibilitar um aumento aos salários dos trabalhadores em 5%.

A falta de estratégia das medidas fiscais é notória e, mais uma vez, percebe-se quando se tenta explicar o fracasso das medidas da habitação com o fim de um regime – regime de residentes não habituais (RNH) – que tem por fim a atração de investimento estrangeiro.

O RNH será revogado, sendo ainda aplicável àqueles que estejam inscritos como residentes não habituais a 1 de janeiro de 2024 e por 10 anos. Também se manterá para aqueles que até 31 de dezembro de 2023 reúnam as condições para inscrição como residentes não habituais, ou sejam titulares de um visto de residência válido àquela data, devendo fazer a sua inscrição até 31 de março de 2024.

É criado um regime de “incentivo fiscal à investigação científica e inovação” para contribuintes que se tornem residentes fiscais em Portugal e não tenham sido residentes em território português em qualquer dos cinco anos anteriores.

Neste novo regime serão enquadráveis aqueles que tenham carreiras de docentes de ensino superior e de investigação científica, integradas no sistema nacional de ciência e tecnologia; postos de trabalho qualificados no âmbito dos benefícios contratuais ao investimento produtivo, nos termos de legislação específica; postos de trabalho de investigação e desenvolvimento, com habilitações literárias mínimas de Doutoramento, em determinadas condições.

Prevê-se, na mesma medida, que o RNH, uma taxa especial de 20% sobre os rendimentos líquidos do trabalho (Categoria A e B) decorrentes das atividades acima referidas, durante o prazo de dez anos consecutivos, sendo também isentos os rendimentos do trabalho dependente, empresariais e profissionais, de capitais, prediais e mais-valias obtidos no estrangeiro. Quem já tenha beneficiado do RNH ou do programa regressar não pode beneficiar deste novo regime.

Sendo, portanto, um regime com alguma complexidade e nada atrativo.

O fim do RNH é uma medida incompreensível para um país que continua a necessitar muito do investimento estrangeiro, contrariando, inclusive, as políticas fiscais de países concorrentes – como a vizinha Espanha – que saberão certamente aproveitar esse investimento.