António Costa pode ser um génio político: conseguiu abafar o caso Tancos com uma grande remodelação surpresa no governo, chamando políticos da sua confiança para as legislativas que aí vêm. António Costa pode ser o rei do défice: conseguiu os números mais baixos da democracia, mesmo descontando que esse valor que ainda promete reduzir foi alcançado à conta de investimento zero e da degradação de serviços públicos como os da saúde ou dos transportes. Mas António Costa é também o rei da insensibilidade. E se alguém ainda tinha alguma dúvida sobre isso depois de o ter visto e ouvido o ano passado nos incêndios que deixaram mais de 110 mortos. Ou após aqueles declarações inenarráveis após o fogo de Monchique deste verão. Já ninguém pode questionar a frieza do primeiro-ministro face ao distanciamento que manteve este fim-de-semana sobre o furacão que devastou o centro do país.

Passou quase uma semana. Foi o maior furacão em 170 anos. Houve ventos recorde. Ainda há sítios sem electricidade. Locais que estiveram dias sem comunicações. Zonas completamente devastadas. Autarquias entregues a si próprias a limpar os estragos. Hospitais sem zonas a funcionar. Lojas e restaurantes fechados. Pessoas que perderam muitos dos seus bens, parte da sua vida. É verdade que não houve vítimas directas (as duas mortes foram consideradas indirectas). Mas houve 28 feridos. Mais de 60 desalojados. Prejuízos de 50 milhões de euros.

A dor de quem viveu aquela noite de desespero merecia pelo menos uma palavra de conforto. Passou por lá Marcelo, como de costume. O ministro da Administração Interna deu um saltito a Montemor-o-Velho. Mas António Costa não conseguiu ter tempo. Nem para viagens, nem para uma frase simpática. Para quem faz da descentralização uma bandeira, e está sempre a encher a boca com o palavrão, ignorar uma catástrofe no centro do país revela além da insensibilidade genética uma outra verdade: que tudo são promessas lançadas (literalmente) ao vento.

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