Iniciar este artigo com a expressão “Princípio do Poluidor Pagador” (PPP) é correr o risco de que alguns leitores possam reduzi-lo de imediato às grandes indústrias poluidoras, descartando qualquer responsabilidade. Não é o caso. Este é mesmo um assunto de todos, só não estamos todos a pagar por isso. São instituições europeias a dizê-lo.

Facto: todos somos utilizadores de recursos naturais – ar, água, energia, solo, flora fauna. Por muito que sobressalte a nossa consciência ambiental, não há outra consequência se não esta: todos somos também poluidores. Ou seja, a nossa existência, por si só, tem impacto ambiental.

Diminuir esse impacto, através da redução do consumo de recursos e da poluição é, obviamente, um necessário e valioso contributo para a sustentabilidade. Contudo, assegurar que esta consciência coletiva seja partilhada por todos é algo que nem a urgência climática em que vivemos vai fazer por nós.

É neste contexto que se torna relevante o Princípio do Poluidor/Utilizador Pagador (PPP). No fundo, a via económica para garantir que pagamos o verdadeiro custo, incluindo o ambiental, do que consumimos e poluímos. Ou seja, indica o PPP que os serviços ambientais, como o abastecimento de água e tratamento de águas residuais, devem refletir todos os custos necessários para fazê-los chegar aos consumidores.

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Outro facto: isto ainda não acontece e o problema está a ser estudado a nível europeu. A Comissão Europeia tem em curso um extenso trabalho de avaliação sobre a forma como os Estados-Membros estão a aplicar o PPP, depois de o Tribunal de Contas Europeu ter afirmado que “as políticas ambientais da UE refletem e aplicam este princípio em diferentes graus, sendo o seu alcance e aplicação incompletos”.

Numa primeira consulta pública sobre o tema, 67% dos inquiridos consideraram prioridade máxima colocar os poluidores a pagar e mais de metade das respostas atribuiu a situação atual à falta de vontade política das autoridades do seu país.

O caso português: da letra da lei à realidade dos factos

Como estamos em Portugal no que diz respeito ao PPP no setor da água? Bem e mal. Bem, porque temos uma excelente transposição das normas europeias para a Lei da Água, de 2005. Mal, porque a aplicação real é muito insatisfatória.

Isto é, reconhecemos, na letra da lei, o valor da água enquanto bem escasso que tem de ser usado com eficiência. Contudo, não transpomos esse valor para custo a imputar aos consumidores, estabelecendo preços económica, ambiental e socialmente justos.

É um facto (mais um) que, em mais de metade dos municípios portugueses, as tarifas não cobrem os custos de tratar, transportar e distribuir água, socorrendo-se de mecanismos de subsidiação que os contribuintes são depois chamados a pagar. Como consequência, temos um setor sem capacidade económica para investir na capacitação da gestão, na renovação das infraestruturas e na modernização da operação.

Portanto (e mais grave) temos um setor que se permite enormes ineficiências onde se destacam as perdas de água nas redes de abastecimento. Que exemplo estamos a dar aos consumidores a quem pedimos para reduzir consumos?

O Princípio do Poluidor/Utilizador Pagador assume um papel determinante na mudança (urgente) deste paradigma. É essencial que as autoridades nacionais, no setor da água e outros, se mostrem capazes de fazer cumprir este princípio, que faz parte da legislação europeia e nacional. A manter-se, a atual falta de vontade política vai conduzir-nos à ineficiência permanente, ao consumo excessivo e à degradação de recursos naturais. Vai afastar-nos das metas nacionais e europeias para o ambiente e clima. Vai tornar-nos incapazes de responder à urgência climática.

Esperemos que o trabalho que está a ser desenvolvido, a nível europeu, traga conclusões e orientações práticas, que alertem os Estados-Membros para a relevância do Princípio do Poluidor Pagador e os conduzam na sua efetiva aplicação.