De uma forma simplista podemos caracterizar um Estado falhado como sendo todo aquele que não consegue assegurar à sua população as suas funções básicas, como a segurança/defesa, saúde ou educação.

Quem olhar de forma honesta e imparcial para evolução destas funções no nosso país não pode deixar de constatar um agravamento gradual e constante dos serviços (não) prestados.

A nível da segurança são recorrentes as falhas não só de pessoal, mas principalmente de material operacional, em muitos casos são as próprias autarquias a tentar compensar a ineficácia do estado central ao substituírem-no na aquisição de viaturas e outros equipamentos, no entanto esta ajuda é limitada e não ultrapassa as dificuldades existentes. Quem mora nos centros urbanos depara-se diariamente com as dificuldades da Polícia de Segurança Publica não só para acudir a todas as solicitações, mas também para assegurar o policiamento de proximidade, o que resulta muitas vezes numa dificuldade tremenda para que um simples telefonema a pedir ajuda seja atendido. O mesmo se passa com os corpos de bombeiros que apresentam recorrentes dificuldades para a aquisição de equipamento, especialmente nos casos em que se trata de valores mais elevados. A título de exemplo, as corporações do concelho de Sintra têm apenas ao seu dispor uma autoescada para 400.000 habitantes e cerca de 319 km2 de área.

Nas áreas rurais e interior do país o panorama não é melhor. Meios insuficientes e muito dispersos atrasam irremediavelmente e deitam por terra qualquer hipótese de policiamento preventivo. Quem não se lembra da icónica imagem dos Nissan Patrol com 30 anos, ainda em uso pela Guarda Nacional Republicana?

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Também na defesa é claro o definhar do estado português, a começar num quadro de pessoal em que existem mais oficiais do que praças, (considerando sargentos como oficiais) e em que nem dinheiro há para encaminhar 14 blindados para ajudar a Ucrânia. A perspetiva de cumprirmos com os compromissos internacionais de reservarmos 2% do Orçamento de Estado para defesa revela-se como uma miragem só possível de cumprir recorrendo a manigâncias financeiras para mascarar a realidade.

Será talvez na saúde que nos apercebemos melhor da degradação constante a que temos assistido. Se há alguns anos as queixas eram de falta de médicos de família nos centros de saúde e os tempos de espera nas urgências nos picos de gripe no inverno, agora já chegámos ao ponto de diariamente ter urgências gerais e de obstetrícia fechadas por falta de médicos. Se já há uns anos era consensual que para certas especialidades, como medicina dentária ou oftalmologia, não era de contar com o SNS, a não ser em situações inquestionavelmente graves, agora já se começa a enraizar a ideia de que é melhor escolher o dia e hora para ter um acidente ou doença grave.

Para não me alongar demasiado termino esta abordagem atendendo à educação, onde cada vez mais se nota uma gritante falta de professores e onde, como consequência, os resultados dos alunos pioram de ano para ano. Os resultados do PISA deterioram-se e as notas nos exames nacionais, principalmente a Matemática, são miseráveis, isto num país que no futuro necessita de jovens altamente qualificados se quer ter alguma hipótese de crescer, e a Matemática terá aqui um papel primordial.

O retrato não é portanto bom. Pior que isto é, no entanto, não vermos no governo, apesar de uma maioria absoluta recentemente conquistada, qualquer vontade de enfrentar este problemas e concretizar reformas essências para arrepiar caminho. Pelo contrário, assistimos de há uns anos a esta parte ao enraizamento na sociedade portuguesa de um discurso de desculpabilização e de normalização da incompetência e da incapacidade por parte das entidades competentes, suportada por atitudes de responsabilização da população pelos inconseguimentos do país. Se na educação os resultados não são bons, sugere-se acabar com os exames nacionais; os alunos não estão preparados para transitar de ano, pressiona-se os professores até ao limite para que não existam “chumbos”; não há médicos para assegurar urgências, apela-se aos portugueses que não fiquem doentes; não há urgências de obstetrícia, cria-se uma app para as grávidas saberem onde podem parir e se for a mais de 100km de distância ainda dá para passear até ao hospital; não há material circulante na CP para assegurar o serviço em quantidade e qualidade suficiente, apela-se aos portugueses para andarem menos de comboio, de preferência em horas de menor calor.

Dito isto, enquadrado na filosofia política de gestão ora vigente, aguardo apenas pelo momento em que para baixar a sinistralidade rodoviária o governo apele ou proíba os portugueses de utilizar as estradas nacionais.