A Representação da Comissão Europeia em Portugal desafiou os eleitores a fazerem o seu discurso do Estado da União Europeia, uma iniciativa a que o Observador se associou. A equipa Beauties and the Beast foi a segunda classificada do Hackathon #SOTEU 2020 (State of the European Union).

Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados,

No último discurso do Estado da UE, estávamos longe de conceber as circunstâncias em que este seria proferido. Tampouco imaginávamos as atuais circunstâncias, quando me dirigi a este Parlamento para apresentar as prioridades da minha Comissão. A conjuntura da Europa revelou-se imprevisível e única.

Desde o início do ano, a crise sanitária da Covid-19 tirou a vida a mais de 200 mil europeus, aumentou a precariedade laboral e despoletou uma onda de desemprego, que atingiu os 7,1% em junho de 2020.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

A pandemia interrompeu vidas, de pessoas e empresas, e condicionou milhões de projetos; dificultando, inclusive, os da UE – é o caso do adiamento da Conferência sobre o Futuro da Europa.

Ainda assim, os europeus não baixaram os braços e, nesta crise, pudemos assistir ao melhor de cada um de nós e a uma clara manifestação de solidariedade. Dos profissionais de saúde que se viram impedidos de estar com a sua família para salvar vidas, aos jovens que mobilizaram recursos para proteger os mais frágeis – a nossa resposta coletiva não seria possível sem a sociedade civil.

Os europeus puderam contar com a UE. Alocámos 100 mil milhões de euros para a compra de material de saúde, encetámos esforços para o repatriamento de mais de meio milhão de europeus e adquirimos mais de 500 milhões de doses de potenciais vacinas. Este é o alerta para a necessidade de reforçar os mecanismos de resposta europeus a futuras crises, repensando as cadeias logísticas de material médico e revendo as competências da UE em matéria de saúde.

Mais do que mitigar o impacto sanitário desta crise, foi-nos exigida uma reavaliação dos desafios e das oportunidades da Europa em 2020. Desde logo, o desafio da recuperação e reconversão económica.

Pela primeira vez, a Comissão permitiu a flexibilização das regras do semestre europeu, a fim de possibilitar condições aos Estados-membros para responder à crise que vivemos. A par com as restantes instituições, desenhou-se o Plano de Recuperação para a Europa, histórico e em tempo recorde. Alcançámos um acordo que permitirá mobilizar 310 mil milhões de euros em subvenções e 250 mil milhões em empréstimos e cujo pagamento acontecerá, idealmente, através de receitas próprias da UE. O Conselho sinalizou essa possibilidade e é tempo de efetivá-la, através da emissão de obrigações sobre o digital, o carbono, plásticos não-recicláveis, ou multinacionais.

Este não pode ser um esforço isolado. Devemos empenhar-nos em aprovar um orçamento que salvaguarde os programas que impactam os europeus. A Comissão trabalhará para alcançar um acordo, consciente de que este é o tempo para mais Europa, não menos.

A crise económica não pode justificar a criação de uma competição entre Estados-membros na procura por receitas fiscais. O espírito da UE é o da cooperação. Trabalharemos no sentido de promover uma articulação fiscal entre os Estados-membros. Tampouco poderemos permitir que as situações resultantes da crise se traduzam numa diluição das garantias sociais e na degradação das condições laborais.

Ao desafio da recuperação, junta-se a necessidade de reconversão, uma prioridade desta Comissão que ganha agora maior significado e urgência. Em particular, na área do digital e do ambiente, nas quais os desafios e oportunidades se estendem para lá do económico.

No digital, é-nos exigida uma reflexão sobre como as novas tecnologias podem ser utilizadas. Tal implica enquadrar as liberdades fundamentais sem subestimar a adoção de novas tecnologias. Destaco o papel do RGPD, uma prova da capacidade da UE em criar instrumentos que servem de exemplo além fronteiras. Ou o PCEIA que declara a ambição de nos tornarmos a região líder mundial no desenvolvimento e implantação segura e democrática de inteligência artificial.

Face aos novos desafios, a Europa terá de avaliar em que medida as importações de software e infraestrutura crítica chinesa representam uma ameaça para a segurança europeia e para os valores democráticos.  A UE deve explorar o desenvolvimento de alternativas para a infraestrutura sem fios 5G chinesa.

A nível corporativo, a Comissão quer garantir o equilíbrio na fusão de empresas europeias no setor tecnológico, permitindo desenvolver agentes económicos globais, sem comprometer o mercado interno e a concorrência.

O desenvolvimento científico e tecnológico é prioridade para o reforço da competitividade europeia. O Programa Europa Digital é crucial para construir capacidades digitais estratégicas que permitam moldar e apoiar a transformação digital da sociedade e economia europeia.

A inovação tecnológica e científica tem um valor instrumental para a transição para uma economia e um estilo de vida sustentável. O Pacto Ecológico Europeu foi pensado para dar solução a uma crise que, desta vez, é possível prever.

A Comissão quer assegurar a transição energética, preservar a biodiversidade e reduzir a poluição, permitindo, através do Fundo para uma Transição Justa, que nenhuma região “fique para trás” no seu percurso para uma economia mais sustentável.

Recentemente, a Europa apostou no hidrogénio por ser fácil de armazenar, ter baixas emissões e alta aplicabilidade. Este investimento é peça fundamental para atingir os objetivos do Acordo de Paris.

Mas este investimento requer coerência. A própria UE terá de cessar o financiamento de indústrias e práticas poluentes que, neste momento, representa 83,4% do orçamento anual. O Pacto Ecológico Europeu é o caminho traçado para, em 2050, sermos neutros na emissão de carbono e liderarmos a luta contra as alterações climáticas.

A UE assume um papel de liderança. Não se pode exigir menos ao bloco que, conjuntamente, representa cerca de 20% do PIB Mundial e que tem, apesar da saída do Reino Unido, uma expressão, sem paralelo, nos diferentes fóruns internacionais.

A UE tem que ser o espaço de todos os que acreditam na democracia e no multiculturalismo. Aqui reside a necessidade de, como Europa, sermos bons aliados, vizinhos leais e um ator responsável. Isto exige capacidade operacional no contexto internacional. A Comissão propõe que se transforme a regra de unanimidade em maioria qualificada para certas decisões de política externa.

Não é concebível que as condições que exigimos a terceiros não sejam cumpridas pelos nossos iguais. Permanecemos atentos ao evoluir das limitações de direitos e encorajamos o Conselho a ser condizente com os valores dos Tratados, efetivando as sanções do mecanismo 7º do TUE. Na UE, o Estado de Direito não pode ser letra morta.

Reconhecemos a legítima preocupação de alguns Estados-membros com os Critérios de Copenhaga. Acreditamos, contudo, que a mais elementar justiça dita que não podemos misturar os problemas de enforcement of the rule of law em Estados-membros da UE com processos de candidatura em curso. Só assim garantimos um processo justo, transparente e leal. O nosso idealismo e pragmatismo assim o exigem.

A dimensão humana que está na base do nosso projeto obriga a UE a intervir em crises humanitárias internacionais. A crise dos refugiados é um exemplo. No ano passado, 128536 refugiados chegaram ao que seria o seu “porto seguro”. Estas pessoas não são esquecidas pela Europa: redefiniremos a Política Europeia de Migração, para que esta se torne mais humanitária e respeitadora dos direitos fundamentais.

Não esqueçamos que a UE surgiu como um projeto de garantia de paz no fim da Segunda Guerra Mundial, promovendo e assegurando o valor da liberdade no período após a queda do Muro de Berlim. Mas sabemos também que nenhum projeto político sobrevive de vitórias passadas. As vitórias de amanhã constroem-se hoje e a vitória da Europa passará sempre pela sua capacidade de ser um agente global, a casa dos valores democráticos, a força motriz da sustentabilidade e o motor das concretizações das preocupações sociais do povo europeu.

A Comissão entende a necessidade fundacional que lhe incube: a de garantir que esta é uma UE que continua a escrever a História.

A equipa Beauties and the Beast, 2ª classificada no desafio Hackathon #SOTEU 2020, lançado pela Representação da Comissão Europeia em Portugal