Conseguimos algumas respostas de Kurt Wagner nos intervalos dos concertos que compõem a atual digressão dos Lambchop pela Europa. A banda apresenta o álbum FLOTUS, o tal que surgiu no ano passado para nos dizer que Wagner quer fazer música diferente sem deixar de ser o mesmo compositor de sempre. Intenso, melancólico, dramático e irónico, nada disso é novo e está tudo nestas canções. O herói de uma espécie muito particular de americana voltou a congregar músicos para desfiar dores e lamentos. Mas fê-lo através de eletrónicas ambientais, de camadas e camadas de sons que incluem vocoders, lições aprendidas com o hip hop e sintetizadores.

É um disco surpreendente e brilhante e é também um documento que parece não ter hipótese de ser repetido em palco. Ora isso só faz com que os concertos que os Lambchop apresentam no Maria Matos e no Auditório de Espinho sejam ainda mais importantes. Foi por aí que começámos. Antes de Wagner nos dizer que estes são “tempos verdadeiramente estranhos” e que “não há caminhos fáceis para nada”. Kurt sabe bem.

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“FLOTUS”, o disco editado pelos Lambchop no ano passado (Merge; Popstock)

Como é que é tocar este álbum ao vivo? Foi preciso fazer mudanças, na música ou na banda?
Acima de tudo, tem sido ótimo descobrir como tocar este álbum em palco. Optámos por fazer um compromisso, entre a música que está gravada e aquilo que queremos tocar. E quando temos em palco o Andy Stack, dos Wye Oak, ele consegue ainda dar mais profundidade ao que fazemos, àquilo que somos como banda. Ainda assim, quando estamos só os três conseguimos ir por caminhos diferentes e acrescentamos novidades à música antiga. Resumindo, é incrível.

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As novas canções não parecem Lambchop, mas, ao mesmo tempo, não podiam ser de mais ninguém. É meio estranho mas qual é a sua opinião?
Na verdade, foi quando acabámos o disco que chegámos à conclusão que tudo isto continua a soar a Lambchop, mas com mais soluções sonoras. O que conta na identidade de um grupo não é tanto a ferramenta utilizada, é mais a atitude, a forma como essa ferramenta é usada, qual o sentido que os músicos querem dar às canções. É a nossa reação à nossa criatividade que faz de nós quem somos.

O vídeo de “NIV” parece mostrar histórias de quem procura ultrapassar as dificuldades de uma vida complicada. De alguma maneira, é o que os Lambchop fazem desde sempre, não?
Nunca tinha pensado nisso dessa maneira, mas talvez, sim… Por outro lado, havia uma piada a circular nos corredores da nossa editora nos EUA: “Os Lambchop, a tornar as coisas difíceis há 20 anos”. Ou seja, não há caminhos fáceis para nada, é isso que temos andado a dizer.

Tem ideia de como é que os fãs de Lambchop olham para a banda? Que tipo de relação estabelecem com a música? Provavelmente, qualquer uma destas opiniões não passa disso mesmo…
Gostava de conseguir olhar para nós e ver aquilo que os outros veem, estando de fora, mas sempre tive muitas dificuldades em fazer isso. E duvido que alguém o consiga. Mas estou sempre pronto para conhecer e conversar com quem quer que seja, com todos os que gostam daquilo que fazemos. Até porque no meio dessas pessoas há gente completamente distinta. Não há um fã-tipo de Lambchop e devo dizer que isso me parece notável.

A música dos Lambchop trata de melancolia, de esperança e da falta dela. Um tema muito americano por agora, não?
Bom, somos americanos, é impossível não relacionarmos aquilo que fazemos com tudo o que acontece à nossa volta. E que ninguém se engane: estes são tempos verdadeiramente estranhos. Com cada nascer do sol há um lunático grande e gordo a tentar tirar qualquer vestígio de esperança ao próprio sol.

FLOTUS parece surgir de muita música ouvida, de diferentes influências. Hip hop, por exemplo, é um dos géneros que aparece em muitos textos escritos sobre o álbum como referência para a composição das canções. Mas concorda com essa opinião?
Concordo, é verdade. Apesar de muitas vezes haver conclusões precipitadas por parte de quem escreve sobre música. E noutras situações, limitam-se a repetir o que foi dito várias vezes. Nada de mais, nunca nada vai ser perfeito, é a vida, acho… Mas aqui é mesmo tudo verdade. Especialmente na produção e na forma como as batidas e as palavras se relacionam. Costumo imaginar uma narrativa para cada disco e a partir daí as coisas vão surgindo.

Também com base na música que vai ouvindo.
Gosto de ouvir música, gosto muito, mas não sou um grande consumidor ou comprador. Estou sempre muito interessado no que é novo e excitante. E há muito para descobrir. Se juntar isso ao que gosto de ouvir desde há muito tempo, aquela música e aquele artistas que sempre me acompanharam, bom, então temos um grande problema. Faço o que posso, até porque já não tenho tempo suficiente neste mundo para ouvir tudo o que quero.

Lambchop ao vivo esta terça feira, dia 17, às 22h no Teatro Maria Matos, em Lisboa. Quarta, 18, às 21h30 no Auditório de Espinho.