A Tesla iniciou no mês passado a produção de baterias na sua primeira gigafábrica, localizada em pleno deserto do Nevada, cuja capacidade de produção será superior à instalada no resto do mundo, no que respeita à construção de baterias de iões de lítio. Agora, numa fase em que esta imensa unidade fabril americana, com 540 mil m2, ainda não está a trabalhar em pleno, o CEO da Tesla, Elon Musk, assume que pretende construir mais três gigafábricas. Até porque o negócio da marca norte-americana de veículos eléctricos não se fica pela produção de automóveis e das respectivas baterias, estendendo-se ainda ao fabrico de painéis solares e acumuladores de energia para residências – actividade a que se dedicava a SolarCity, que foi adquirida pela Tesla.

O anúncio de Elon Musk causou alguma surpresa, se não pelo lançamento em breve de mais fábricas de baterias e, provavelmente, de veículos, pelo menos pelo número de instalações previstas. Contudo, nada mais se sabe sobre o tema, excepção feita para a promessa de que a escolha das localizações ficará definida até final deste ano.

É boa notícia para Portugal?

Claro que sim. É certo que anda meio mundo atrás do investimento da Tesla, e não faltam governos a enviar representantes para pressionar Musk, como Michel Sapin, ministro da Economia francês, que realizou uma rápida incursão pela Califórnia em Janeiro para abrir as portas de França à gigafábrica da marca americana.

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Se há interesse a rodos e de todos, a verdade é que Portugal apresenta um naipe de trunfos com muito valor, desde o baixo custo de mão-de-obra às muitas horas de sol – a gigafábrica no Nevada é alimentada por painéis solares, sendo uma receita que deverá ser repetida nos novos locais –, passando pela presença de lítio no nosso subsolo em quantidades apreciáveis. E quanto mais instalações a Tesla pretenda construir, maior é a probabilidade de o nosso país vir a acolher uma delas.

O que é uma gigafábrica?

É simples. O termo “giga” – uma unidade de medida que representa 1000 milhões de watts, neste caso – tem a ver com a capacidade de produção de baterias que, no caso das instalações no Nevada, é de 35 gigawatts por hora (35 GWh), segundo o site da marca. Mas o “giga” tem aqui duplo sentido, pois pretende igualmente transmitir a imponência das instalações, uma vez que se trata da maior fábrica do mundo em área de implantação no solo.

A construção da fábrica do Nevada foi iniciada em 2014, começou a produzir em Janeiro deste ano e atingirá a máxima capacidade de produção em 2018, fabricando então mais baterias de iões de lítio do que todo o mundo em 2013, nas vésperas do lançamento da primeira pedra.

O objectivo para a Tesla é não só fazer as baterias de que necessita para os seus automóveis, como produzi-las em larga escala, de forma a reduzir os custos de produção. E a prova é que Musk anunciou em 2014 que a sua primeira gigafábrica iria reduzir o custo das baterias em 30%, por kWh produzido.

As contas batem certo?

Bem, aqui a coisa complica-se. A Tesla fabricou em 2016 cerca de 100 mil veículos (Model S e X), mas com o início da produção do Model 3 em Junho deste ano, o objectivo é incrementar consideravelmente este valor, uma vez que, no final de 2017, a cadência já rondará os 5.000 automóveis por semana. Em 2018, quando as linhas de produção atingirem o máximo de capacidade (de baterias e de carros, este ritmo duplicará para 10 mil por semana, o que permitirá atingir quase os 500 mil veículos por ano – o objectivo de Musk, para que a Tesla seja rentável.

O Model 3 já está em pré-produção e começará a ser fabricado em série em Junho, para satisfazer as 400 mil encomendas. Será o modelo com o preço mais acessível, mas igualmente o de maior produção, pelo que dele depende o futuro da Tesla

Numas contas rápidas, a gigafábrica terá capacidade à justa para alimentar de baterias os 500 mil automóveis/ano – dá uma média de 70 kWh por unidade –, mas dificilmente poderá acompanhar a expansão para outros mercados, como o europeu, onde o Model 3 poderá ser a cereja no topo do bolo. Daí que sejam necessárias novas gigafábricas.

Onde poderão surgir as gigafábricas?

À excepção de Musk e dos restantes membros do board da Tesla, ninguém sabe. Mas houve algumas movimentações estratégicas. A primeira consistiu em rebaptizar a fábrica de painéis solares já existente em Buffalo, no estado de Nova Iorque – e que pertencia à SolarCity – como Gigafactory. Isto permite ao CEO da marca americana esgrimir junto de Donald Trump o argumento de que os EUA já possuem duas gigafábricas da Tesla. Mas não é impossível que tenha de lhe “oferecer” mais uma, maioritariamente para exportação, sobretudo Canadá e Japão, dado o seu compromisso com a nova administração de criar mais postos de trabalho nos EUA. As restantes duas instalações serão destinadas à Europa e à Ásia, os países com maior potencial de crescimento, especialmente o país do Sol Nascente.

E de onde vem o dinheiro?

O anúncio da construção de três novas gigafábricas teve lugar numa conferência de imprensa (que pode ouvir aqui) cujo tema principal era o anúncio dos resultados da Tesla no 4º trimestre do ano transacto e o balanço de 2016 (que pode ver em detalhe aqui). Depois de ter anunciado lucros de 22 milhões de dólares no 3º trimestre, devido à venda de créditos ecológicos, a marca regressou aos prejuízos no último trimestre do ano (121,3 milhões de dólares). E assim se manterá até que o Model 3 chegue em força ao mercado, ou seja, em 2018.

Daí que Elon Musk tenha reconhecido, nesta conferência de imprensa que, se bem que a Tesla recorra a fundos próprios para tudo o que envolve a produção do Model 3 – para o que contou com a “ajuda” de cerca de 400 mil clientes que colocaram encomendas, avançando com um sinal de 1.000 dólares por veículo – poderá ter de recorrer a financiamento que lhe permita avançar com os investimentos agora anunciados.

Mas nada disto parece afectar o valor das acções da Tesla, que continuam em alta, com alguns analistas a admitirem que a proximidade de Musk com o presidente Trump – de quem já é conselheiro em duas áreas e que visita com alguma regularidade nas Trump Towers – desempenha um papel positivo nesta valorização.