Há imagens que dizem tudo: Brahimi, a estrela, atirou-se para o chão após ouvir o apito final; Otávio, o marcador do golo, baixou a cabeça e assim ficou; Nuno Espírito Santo, o treinador, foi o primeiro interveniente do jogo a sair em passo acelerado para o balneário; Pinto da Costa, o presidente, estava de ar desolado de mãos nos bolsos; Fernando Gomes, administrador da SAD, olhava para o vazio; Luís Gonçalves, o responsável pelo futebol, limpava os óculos com uma expressão resignada; na bancada, uma adepta não conseguia controlar o choro. O FC Porto não foi além de um empate a uma bola frente ao Marítimo, o quinto nos últimos sete jogos. Matematicamente ainda pode ser campeão? Sim. Mas olhe-se para as primeiras linhas deste texto: ainda alguém acredita?

Ficha de jogo

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Marítimo-FC Porto, 1-1

32.ª jornada da Primeira Liga

Estádio do Marítimo, no Funchal

Árbitro: Jorge Sousa (Porto)

Marítimo: Charles; Patrick, Zainadine, Raúl Silva, Luís Martins (Brito, 30’); Erdem San, Alex Soares (Deyvison, 79’), Fransérgio; Edgar Costa (Djoussé, 66’), Coronas e Keita

Treinador: Daniel Ramos

Suplentes não utilizados: Abedzadeh, Éber Bessa, Jean Cléber e Abdul-Basit

FC Porto: Casillas; Fernando Fonseca (Rui Pedro, 85’), Felipe, Marcano, Alex Telles; Rúben Neves (André Silva, 76’), André André, Herrera; Otávio (Corona, 71’), Brahimi e Soares

Treinador: Nuno Espírito Santo

Suplentes não utilizados: José Sá, Boly, Óliver Torres e Diogo Jota

Golos: Otávio (28’) e Djoussé (69’)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Felipe (53’), Raúl Silva (63’) e Patrick (83’)

Ainda antes de tudo começar, o FC Porto já cometia uma gaffe: nas costas da camisola do estreante Fernando Fonseca lia-se “Fernado”. Mas verdade seja dito, se alguém foi poupado nas letras, o miúdo não se poupou em nada. E foi dos pés dele, quem diria, que nasceu o primeiro remate: foi lá à frente de forma destemida, depois de tabelar bem com Herrera, cruzou atrasado mas André André chutou por alto, por alto (11’).

Não, não é gralha. Quando se olhou para as opções iniciais de Nuno Espírito Santo, que deixou um capital de 30 golos no banco (entre André Silva, Diogo Jota, Rui Pedro, Corona e Óliver Torres), não era preciso ser adivinho para se perceber que a matriz de jogo traria um FC Porto versão fato-de-macaco no corredor central (com Rúben Neves, Herrera e André André) e um FC Porto versão fato de gala nas alas (com Otávio e Brahimi). O que ficou confirmado? André André – tal como Herrera – foi como o nome e valeu por dois. E qual foi a surpresa? O perigo veio da direita e não da esquerda, onde o argelino tinha nas suas costas o lateral que mais golos dá nesta Liga.

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Havia trabalho, havia intensidade, havia entrega. No entanto, e quando estamos à entrada de uma semana de greves e tolerâncias de ponto, as duas equipas iam fazendo boicote às balizas: no lado do FC Porto, aos 23’, só um passe de rutura de Brahimi para Soares obrigou Charles a qualquer coisa (neste caso, uma saída de grande arrojo ao chão); da parte do Marítimo, que já se tinha ficado a queixar de um possível penálti de Felipe sobre Keita no início da partida, só um remate em jeito de fora da área de Alex Soares, aos 25’, mostrou Casillas na TV.

O jogo não atava nem desatava até que Otávio se recordou das palavras de Deco, que esta semana, em entrevista ao jornal O Jogo dizia que o brasileiro, para brilhar, teria de jogar no meio. Meu dito, meu feito: após insistência de Herrera na área, o médio canarinho aproveitou uma bola cortada de forma deficiente na área para inaugurar o marcador com um remate cruzado, aos 28′. Já tinha marcado na Taça de Portugal e na Champions, estreou-se no Campeonato. E só não houve mais estreias até ao intervalo porque Charles, de forma instintitiva com os pés, travou a única oportunidade flagrante desperdiçada na primeira parte por… Fernando Fonseca (41′).

Já o segundo tempo seria diferente. Não que o Marítimo tenha conseguido um caudal ofensivo avassalador capaz de encostar o FC Porto às cordas, longe disso, mas soube ser eficaz quando surgiram as chances. Ou a chance: Djoussé, acabado de entrar, aproveitou um canto para subir mais alto ao segundo poste e cabecear picado para o empate (69′). 40% dos golos dos insulares nasceram de cantos. Os dragões falharam essa aula. Mais uma “gaffe”.

Otávio, estourado, saiu. Ficaram Brahimi, que passou um jogo inteiro a fazer fintas lindíssimas mas sempre na direção do local onde estavam mais adversários; Corona, que entrou, teve dois cruzamentos venenosos e não mais tocou na bola com perigo; e Soares, que rubricou a exibição mais desastrada desde que chegou ao clube. Ainda entraram André Silva, que ficou perto de marcar de cabeça, e Rui Pedro, que cabeceou nos descontos à figura de Charles. O jogo acabou no registo de uns a chutarem para a frente com fé em Deus e outros a mandarem a bola para o mato porque era jogo de Campeonato. Terminou assim, empatado.

Daniel Ramos, um dos treinadores-revelação da Primeira Liga, continua sem perder em casa desde que assumiu o comando dos insulares; o FC Porto continua sem vencer fora o Marítimo, num jejum que se arrasta desde 2012. Brahimi, numa entrevista publicada esta semana na revista Dragões, dizia que o problema dos azuis e brancos, nomeadamente na receção ao V. Setúbal, foi a falta de cabeça. Que, mais uma vez, se notou. A equipa de Nuno Espírito Santo é perspicaz na forma como percebe onde erra mas pouco eficaz na correção do erro. E com isso, ao quinto empate em sete encontros, deve ter abdicado de vez do título. Que, caso o Benfica ganhe os próximos dois jogos, pode chegar no dia em que o Papa visitará Fátima: 13 de maio.