790kWh poupados com a
i

A opção Dark Mode permite-lhe poupar até 30% de bateria.

Reduza a sua pegada ecológica.
Saiba mais

i

MIGUEL A. LOPES/LUSA

MIGUEL A. LOPES/LUSA

Tribunais mudam mas não saem do mesmo Citius

Plataforma criada no Citius, depois dos problemas detetados a 1 de setembro, já recebeu 40 mil processos e 28 mil são novos. Técnicos avisaram que o sistema informático vai estoirar em quatro anos.

Moradas trocadas. Réus desaparecidos. Testemunhas insuficientes. Um desastre. Os problemas detetados no Citius a 1 de setembro, no primeiro dia da entrada em vigor do novo mapa judiciário, levaram a ministra da Justiça a anunciar um Plano B. Quarenta mil processos já podem ser consultados por magistrados, funcionários judiciais e advogados, mas o sistema está longe da perfeição. A equipa que o gere avisou que em quatro anos vai haver um colapso e vai tudo abaixo. E para colocar de pé a Plataforma Informática, anunciada por Paula Teixeira Cruz em início de mandato, são precisas cerca de duas legislaturas, ou seja, quase oito anos. Quando é que os tribunais deixam o Citius e ficam no sítio?

17915855.jpg

O ensaio da migração eletrónica, em junho, correu bem

As bases do sistema informático onde são colocados os processos cíveis, de família e menores e algumas gravações e notificações dos processos-crime não nasceu por concurso público. Partiu da iniciativa de um grupo de oficiais de justiça curiosos, que por acaso sabiam programar. Na altura, nos finais dos anos 1990, o parto do sistema deu-se numa sala alugada pelo Ministério da Justiça em Coimbra. Foi ali que a equipa o batizou de “Citius/Habilis” e que o desenvolveu em Vbase 6, uma linguagem de programação entretanto caída em desuso. A ideia era a de ter um sistema onde fosse possível colocar os processos digitalizados, permitindo uma consulta mais simples e prática.

A linguagem de programação do Citius já estava "descontinuada". Equipa foi embora e não deixou livro de instruções.

O Governo de José Sócrates, que sempre defendeu o uso das novas tecnologias, aprovou uma lei que generalizava o uso do sistema. Corria o ano de 2009 quando todas as comarcas passaram a usar o Citius. Um sistema que já na altura dava problemas. “Chegava a ficar uma semana inteira sem funcionar”, conta ao Obervador uma fonte do Ministério da Justiça. De tal forma que muitos funcionários começaram a chamar-lhe “o bruxedo”.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Em novembro de 2012, quando o Instituto de Gestão Financeira e de Infra-estruturas da Justiça (IGFIJ) se fundiu com o Instituto das Tecnologias de Informação da Justiça (ITIJ), a equipa que fez nascer o Citius demitiu-se em bloco. Não concordavam com a nova direção. “Eles foram pressionados para justificar as ajudas de custo. Um oficial de justiça que ganha cerca de 1.200 euros, naquele serviço chegava a ganhar cinco mil euros com ajudas de custo”, disse a mesma fonte. Da equipa de doze oficiais que geriam o sistema, dois ficaram. Mas não conheciam assim tão bem como tudo funcionava. Os outros levaram o segredo da máquina com eles.

processos tribunais, mapa judicial,

40 mil processos já estão nesta nova aplicação

No dia em que a nova equipa do IGFIJ chegou à sala, em Coimbra, para entrar no sistema, pôs as mãos à cabeça. Havia máquinas. Ou, melhor, computadores. Mas não havia manuais de instrução. Tiveram que estudar tudo para perceber como mexer no sistema. O berço do Citius acabaria entregue ao seu dono. A equipa decidira criar um servidor central, algures em Lisboa. Em vez de existirem 340 bases de dados, uma para cada tribunal, passaram a haver 23, uma para cada comarca. Em janeiro de 2013, todo o sistema de justiça passava por cabos de fibra óptica dedicada. Todos? Não. A Procuradoria Geral da República, por uma questão de separação de poderes, decidiu ter o seu próprio sistema. Aquele que ainda recentemente foi atacado por hackers.

Técnicos tinham pedido dez dias de testes. Tiveram três

A ministra da Justiça, Paula Teixeira Cruz, chamou-lhe Plano B. E espera que em outubro o caos instalado nos tribunais esteja resolvido. O Plano B chama-se, na verdade, V3. E é uma aplicação instalada no Citius para receber os processos do V2, a versão que era utilizada antes da entrada em vigor do novo mapa judiciário. Durante o mês de agosto fizeram-se testes de migração para que tudo estivesse em ordem a 1 de setembro. E chegou a estar. Das 00h00 de 27 de agosto até às 9h00 de 1 de setembro, os 2,7 milhões de processos entraram todos no sistema. (Fala-se em 3,5 milhões, mas esse número inclui processos terminados, prontos a serem levados para o arquivo). A chuva de erros e de problemas começou depois.

Equipa técnica pediu dez dias à ministra da Justiça para fazer testes antes de 1 de setembro. Paula Teixeira da Cruz não concordou.

O sistema teve que ser inutilizado para os técnicos poderem intervir. Já tinham alertado a ministra de que o ideal era terem dez dias antes da entrada em vigor do mapa. Até ali, os testes tinham sido feitos em pequenas amostras de cada comarca e o sistema tinha aguentado. Mas a justiça não para. E a pressão sobre a ministra era grande. “Não aguentou o peso de tantos processos”, disse a fonte. As previsões do Governo para a resolução do problema começaram por ser de algumas horas, para passarem a ser 24 e depois de 48 horas. Até que se partiu para o Plano B.

As queixas caíram dos mais diversos setores: funcionários judiciais, advogados, magistrados. Alguns processos tinham perdido réus, os de família e menores davam erros, as testemunhas tinham moradas erradas, ou moradas onde já não viviam e que chegaram a ser substituídas no próprio Citius. “O que aconteceu é que os chamados metadados não chegaram ao outro lado porque a plataforma inicial tinha metadados diferentes”, disse a fonte.

paula teixeira da cruz, ministra da justiça, governo,

A ministra da Justiça foi chamada a explicar-se perante os deputados

Foi o que aconteceu com os processos com menores, em que o campo no número de identificação fiscal que agora é obrigatório, era preenchido com números aleatórios antigamente. “Quase nenhuma criança tinha número de identificação fiscal e os funcionários, para conseguirem passar para o passo seguinte no sistema, inseriam números aleatórios. Na passagem para o novo sistema, tudo isto esbarrou e deu erro”.

No Plano B, que a ministra anunciou esta semana na audição parlamentar de que foi alvo, e na qual os deputados da oposição voltaram a pedir que se demitisse, foi ainda consagrada a possibilidade de os magistrados de cada comarca descarregarem processos de um sistema para o outro. Desde 1 de setembro, a V3 já recebeu 40 mil processos (segundo atualização a que o Observador teve acesso na noite de quarta-feira) e só 12 mil processos eram daqueles que tinham que ser mudados de sistema. Todos os outros são novos. O volume processual é tão grande que a equipa do Instituo de Gestão Financeira e Equipamentos da Justiça (IGFEJ) já preveniu a ministra: o sistema é fraco e não vai suportar o volume processual. Tem morte à vista dentro de quatro anos, quando colapsar.

A Plataforma que não sai do papel

O despacho da ministra da Justiça é de 2011 e até diz que a situação é “premente”. A ideia de criar um sistema de informação da gestão processual em todas as jurisdições, de alta segurança e com graus diferenciados de acesso”, que integrem todos os serviços do Ministério da Justiça, no entanto, ainda não saiu do papel. É que o novo mapa judiciário teria que entrar em vigor em setembro de 2014 e não havia tempo. Fonte do Governo explica que houve logo impugnação do concurso para o caderno de encargos, que este terá de ser novamente lançado. “Um concurso internacional demora 18 meses. E o Citius não deverá aguentar mais de quatro anos”. Foi, aliás, isto que o Instituto já tinha dito à ministra.

Plataforma informática prevista na reforma judiciária levará duas legislaturas a ficar operacional.

Atualmente há uma equipa de 50 pessoas a aproveitar as noites para pôr as mãos (e os olhos) no Citius. Vinte são colaboradores externos, recrutados para reforçar a equipa. Quem trabalha com eles diz que estão a fazer tudo. É ali que comem e dormem. Depois, quando chega a manhã, vão tomar banho a um ginásio no Parque das Nações, em Lisboa, nas imediações do Campus de Justiça.

 

 

 

 

Assine por 19,74€

Não é só para chegar ao fim deste artigo:

  • Leitura sem limites, em qualquer dispositivo
  • Menos publicidade
  • Desconto na Academia Observador
  • Desconto na revista best-of
  • Newsletter exclusiva
  • Conversas com jornalistas exclusivas
  • Oferta de artigos
  • Participação nos comentários

Apoie agora o jornalismo independente

Ver planos

Oferta limitada

Apoio ao cliente | Já é assinante? Faça logout e inicie sessão na conta com a qual tem uma assinatura

Ofereça este artigo a um amigo

Enquanto assinante, tem para partilhar este mês.

A enviar artigo...

Artigo oferecido com sucesso

Ainda tem para partilhar este mês.

O seu amigo vai receber, nos próximos minutos, um e-mail com uma ligação para ler este artigo gratuitamente.

Ofereça artigos por mês ao ser assinante do Observador

Partilhe os seus artigos preferidos com os seus amigos.
Quem recebe só precisa de iniciar a sessão na conta Observador e poderá ler o artigo, mesmo que não seja assinante.

Este artigo foi-lhe oferecido pelo nosso assinante . Assine o Observador hoje, e tenha acesso ilimitado a todo o nosso conteúdo. Veja aqui as suas opções.

Atingiu o limite de artigos que pode oferecer

Já ofereceu artigos este mês.
A partir de 1 de poderá oferecer mais artigos aos seus amigos.

Aconteceu um erro

Por favor tente mais tarde.

Atenção

Para ler este artigo grátis, registe-se gratuitamente no Observador com o mesmo email com o qual recebeu esta oferta.

Caso já tenha uma conta, faça login aqui.

Assine por 19,74€

Apoie o jornalismo independente

Assinar agora