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HUGO AMARAL/OBSERVADOR

HUGO AMARAL/OBSERVADOR

Věra Jourová, comissária europeia: "Não vamos dar sanções apenas por dar"

Comissária europeia diz que Bruxelas está a falar com o Governo para perceber como é que o país pretende melhorar os números da economia. Garante ainda que TTIP vai respeitar consumidores.

Věra Jourová, comissária da Justiça, Consumidores e Igualdade de Género, afirmou que a discussão sobre a aplicação de sanções a Portugal foi “longa e difícil” e que a Comissão está em comunicação com o Governo para tentar perceber como é que Portugal “pretende melhorar os números e diminuir a dívida de forma sustentável”. A comissária disse ainda em entrevista ao Observador que “as mulheres pagaram o preço mais pesado da crise”.

Věra Jourová é checa e tem um dos portefólios mais abrangentes da equipa de Juncker, tocando nalguns dos temas mais quentes em discussão na União Europeia, nomeadamente proteção dos consumidores e a liberdade de circulação. A comissária garantiu que os consumidores não serão afetados pela conclusão do Acordo de Parceria Transatlântica de Comércio e Investimento (TTIP) e que o acordo firmado entre a UE e o Reino Unido para tentar evitar o Brexit, nomeadamente o travão de benefícios, vem “diminuir” a qualidade das condições para quem pretende trabalhar noutro Estado-membro. Leia a entrevista.

As sanções podem vir a efetivar-se contra Portugal?

Tivemos uma longa e difícil discussão sobre isto na reunião do Colégio de Comissários na semana passada e não estava só em cima da mesa Portugal. Estavam em causa outros países onde vemos que os números da economia no que diz respeito à disciplina orçamental não estão alinhados com as regras. Discutimos sobre estes números não de uma forma estática, mas de uma forma dinâmica já que, em Portugal, os números estão a melhorar. E, por isso, decidimos tomar a decisão final em julho. Entretanto, e apesar de não ser a minha pasta, sei que os meus colegas Valdis Dombrovskis e Pierre Moscovici estão envolvidos profundamente em conversas com o Governo português de forma a perceber como é que o país pretende melhorar os números e diminuir a dívida de forma sustentável. Não posso prever ou não se haverá sanções, mas uma das maiores dificuldades é que temos de obedecer às regras que estão instituídas para todos os Estados-membros. Tem de haver tratamento igual para todos, mas olhamos para cada país individualmente e para o seu progresso.

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A revisão dos números por parte do Governo português vai resultar em novas medidas de austeridade?

Não posso prever isso. Por isso é que foi dado mais tempo ao país, de forma a encontrar as medidas mais equilibradas para o país. A certeza que eu quero dar é que ninguém quer sanções pelas sanções, a ideia é colocar o país em linha com as metas orçamentais e que consiga melhorar o seu desempenho. Não vamos dar sanções apenas por dar.

Tem um portefólio muito alargado e entre as suas competências está a defesa dos consumidores. Um dos assuntos que mais preocupa atualmente os consumidores europeus é o TTIP. Pode garantir que os consumidores vão ser protegidos no acordo com os Estados Unidos? De que forma?

Temos padrões de qualidade muito elevados na Europa e queremos continuar a aprofundar isto. Seria uma decisão política muito má se os abandonássemos e não planeamos que isso aconteça. Posso garantir que a proteção de consumidores e o seu interesse vai manter-se, não sendo tocado por qualquer acordo internacional. É verdade que há debates sobre a comida e os químicos. Estes tópicos não fazem diretamente parte do meu portefólio, mas temos trabalhado com a comissária do Comércio, Cecilia Malmström, e ela sabe que não é só preciso manter a atual proteção dos consumidores europeus, mas também não impossibilitar que essa proteção seja ainda mais forte no futuro.

Qual é a sua principal preocupação no caso de saída do Reino Unido da União Europeia?

É muito difícil prever. Nós queremos que o Reino Unido fique e há muitos estudos que mostram que a saída teria um impacto grave no Reino Unido, mas também no resto dos Estados-membros. E não são só consequências económicas, mas também a nível de segurança para todos nós. A Comissão Europeia não vai participar na campanha, apenas expressa o seu desejo pela manutenção do país na União Europeia. Em caso de saída, haverá um período em que teremos de acordar a futura coexistência e cooperação. Este é um assunto que vai envolver também os Estados-membros e o Parlamento Europeu. Caso o Reino Unido fique, vamos trabalhar intensamente no acordo conseguido no Conselho e o meu portefólio abrange a liberdade de circulação e vamos preparar a proposta que vai dar corpo às condições do acordo, mas não vai tocar nas liberdades básicas deste princípio.

Este acordo, nomeadamente o travão para os benefícios de trabalhadores, permite isso? Permite a liberdade de circulação como a conhecemos?

Não vai tocar na substância dos direitos dos europeus. As pessoas vão continuar a poder viajar a trabalhar noutros Estados-membros e ter boas condições para isso. Vai ser um trabalho delicado, porque há alterações previstas que vão diminuir a qualidade e as condições de quem viaja e trabalha. Estou convencida que vamos conseguir cumprir essas alterações e respeitar os direitos básicos dos cidadãos da União Europeia.

Věra Jourová, vera jourova, comissária europeia da justiça,

Věra Jourová, vera jourova, comissária europeia da justiça,

Está em Portugal para falar sobre a importância da proteção das crianças, mas em Portugal, devido ao impacto da crise, as medidas de austeridade provocaram dificuldades na vida das famílias que afetaram os mais novos. Como avalia o impacto da austeridade nas crianças?

Como comissária responsável pelo bem-estar das crianças, apoio as medidas de austeridade que não afetam nem as crianças nem os indivíduos mais frágeis das nossas sociedades. Os mais vulneráveis não podem pagar o preço dessas medidas, mas é isso que acaba por acontecer em grande parte dos casos. Isso não devia acontecer em Portugal, nem em nenhum outro Estado-membro. Têm de ser encontradas medidas mais equilibradas em que haja austeridade, mas em que o ónus recaia sobre aqueles que o podem suportar.

"Apoio medidas de austeridade que não afetam nem as crianças nem os indivíduos mais frágeis. Os mais vulneráveis não podem pagar o preço dessas medidas, mas é isso que acaba por acontecer"

Como é que se protege as crianças desse impacto?

A minha opinião é que as famílias não devem depender do Estado, nem da esfera pública, porque devem ser as famílias a educar em primeiro lugar e a dar a primeira assistência. Cabe aos Estado eliminar quaisquer riscos, criar condições para um nível de educação igualitário, assim como uma boa assistência social. Mas há outros tipos de proteção a ter em conta. Hoje em dia é importante proteger as crianças das armadilhas da internet. Temos um capítulo dedicado a ajudar os pais a protegerem as crianças nesse ambiente. Também é preciso melhorar a vida dos menores que cometem erros e que ficam a cargo do sistema judicial. Garantir que esses menores têm acesso a um advogado e não ficam nos mesmos estabelecimentos que os reclusos adultos, garante que eles não são estigmatizados até ao fim da sua vida. Estamos agora desenvolver uma diretiva que garanta a salvaguarda de menores suspeitos ou acusados de crimes.

Falou na importância do Estado Social na Europa. Acha que ainda é sustentável este modelo ou falhou completamente?

Os sistema de Segurança Social são da competência dos Estados, mas a União Europeia não se deve contentar em estabelecer apenas os princípios mínimos. Temos de lutar pela igualdade e contra a discriminação, mas cabe aos Estados-membros criar um sistema que equilibre também a redistribuição de riqueza. Não podemos obrigar os Estados-membros a fazer isto de uma certa maneira, mas acredito nesses princípios básicos de igualdade e que estão na nossa carta de direitos fundamentais.

Considera que a igualdade na Europa, nomeadamente entre homens e mulheres, foi abalada nos últimos anos? Com o que se deparou quando chegou à Comissão?

As mulheres pagaram o preço mais pesado da crise. Vemos as diferenças a aumentar no emprego com mais mulheres a perderem o trabalho, mas também percebemos que as mulheres foram as primeiras a recuperar conseguindo novos trabalhos e elas próprias a tornarem-se empreendedoras, criando o seu próprio posto de trabalho. Isso acontece muito nalguns países, as mulheres não esperaram que ninguém as fosse salvar. As mulheres adaptam-se melhor a tempos de crises e sentem a crise a chegar antes dos homens. As mulheres são sobreviventes. Outra coisa que me surpreendeu quando cheguei a comissária foram as estatísticas sobre a violência. Não só a violência doméstica, que é um problema grave em Portugal e Espanha, mas outros tipos de violência como perseguições na internet e abusos sexuais. Vemos aliás estas práticas a ganharem novos contornos ligadas à crise dos refugiados. Há um clima cada vez maior de ódio e as mulheres são as mais afetadas. Também estamos a trabalhar para que mais mulheres cheguem a lugares de poder nas empresas.

Věra Jourová, vera jourova, comissária europeia da justiça,

Věra Jourová, vera jourova, comissária europeia da justiça,

A Comissão tinha uma proposta para que esse número aumentasse. Como é que está a correr esse processo?

Não está a correr muito bem. Há o problema da introdução de quotas e as quotas são sempre vistas como impopulares. A diretiva que herdei diz que deve haver 40% de mulheres nos conselhos de supervisão em empresas cotadas em bolsa nos 28. Senão tomarmos medidas legislativas, isto só vai acontecer algures em 2070. E é por isso que continuo a promover esta medida, embora tenhamos uma maioria no Conselho da União Europeia que continua a bloquear esta diretiva.

Quais são os países que a estão a bloquear?

Estou a tentar convencer a Alemanha, porque preciso de um país grande. Espero conseguir convencê-los porque eles adotaram recentemente uma lei própria sobre este tema e o meu argumento é: “Agora que já têm a vossa lei, ajudem-nos para que todos tenhamos esta lei”. Mas as negociações ainda estão decorrer. Também precisamos da Holanda e da Dinamarca. Consegui convencer o meu Governo na República Checa, o que me surpreendeu, e também a Áustria. Mas ainda temos um longo caminho.

E no setor privado? Encontrou resistências?

Eu não quero esperar passivamente pelo resultado desta diretiva e tenho falado diretamente com as empresas sobre este tema. As maiores empresas dizem que elas próprias já adotaram as suas regras para fazer com que as mulheres progridam nas suas carreiras porque há provas de que é importante ter diversidade nos conselhos de supervisão e administração. E também devido às capacidades das mulheres e ao seu talento para saberem o que os clientes querem. Mas nem todas as empresas são assim e o que queremos é ter uma solução para toda a União Europeia. Mas eu também não quero que se crie um ambiente desigual para aceder a estes lugares. Quero que haja concorrência justa entre homens e mulheres. Se houver um concurso para um posto e os dois tiverem a minha experiência e capacidades similares, só aí é que se deve escolher em função do género menos representado. E as mulheres são sempre as menos representadas. Há também as diferenças nos salários, os tipos de trabalho que são muitas vezes segregados e a dificuldade de as mulheres defenderem as suas posições no trabalho.

Na sua opinião, ao que é que isso se deve?

Há muitos fatores e a discriminação tem de certeza um papel. Nós temos uma estratégia para a igualdade de género e compreendo que é um processo muito lento porque depende das tradições e estão enraizadas historicamente nos diferentes Estados-membros. Temos todos formas diferentes de pensar e fazer as coisas, mas penso que há medidas que podem tocar no dia-a-dia, nomeadamente um pacoto que estamos a trabalhar sobre a conciliação da vida familiar com a vida profissional.

Esse pacote inclui a licença de maternidade igual com duração igual em toda a União Europeia? Na Comissão anterior houve uma proposta que foi retirada pela atual Comissão porque não havia consenso no Conselho. Acha que agora haverá?

Tive de retirar a proposta porque dois terços dos Estados-membros já tinham as condições previstas nessa proposta já que estabelecia apenas o mínimo das semanas em que a mãe fica em casa e o mínimo que deve receber. Porque é que eu haveria de gastar tempo e recursos numa proposta que pouco resolvia? Estamos a trabalhar num novo pacote e não vai ser só sobre licença maternidade, queremos proteger o trabalho das mães, claro que queremos garantir a duração da licença, mas já temos bons padrões na Europa. Ainda estamos em fase de consulta e é por isso que ainda não tenho a certeza sobre os resultados. Queremos também garantir que todos os pais têm licença de paternidade no nascimento dos filhos, o que não existe em todos os Estados-membros.

De quanto tempo será essa licença?

Estamos a discutir a possibilidade de duas semanas. Também estamos a tentar que os homens partilhem mais as responsabilidades familiares propondo licenças parentais melhores, assim como licenças para cuidadores de familiares. Estas responsabilidades acabaram por recair muito sobre as mulheres.

"Quero que haja concorrência justa entre homens e mulheres. Se houver um concurso para um posto e os dois tiverem a minha experiência e capacidades similares, só aí é que se deve escolher em função do género menos representado. E as mulheres são sempre as menos representadas"
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