O PS bem tenta, mas não tem sorte com os seus heróis estrangeiros.
Primeiro foi François Hollande. Ia acabar com a austeridade, pôr Merkel na ordem, e relançar o crescimento. António José Seguro agarrou-se a Hollande, apenas para o ver, em menos de dois anos, afundar-se como o mais impopular presidente de França, até ao momento em que, já desesperado, Hollande substituiu finalmente, através da Lei Macron, a bandeira do “poder de compra” pela da “competitividade”.
Agora, foi Alexis Tsipras. Para não variar, também ele ia acabar com a austeridade, pôr Merkel na ordem, relançar o crescimento. António Costa correu para apanhar a boleia – só que desta vez não foram precisos meses, mas apenas uns dias para ver Tsipras, aliado à extrema-direita anti-semita, a desdizer-se e a recuar, enquanto o seu ministro das finanças lembrava que, afinal, até defende a “hegemonia da Alemanha” (e isto, antes de o BCE deixar de aceitar dívida grega).
O grande receio de António Costa, porém, é acabar como o PASOK. Nas várias eleições gregas desde 2009, o PASOK caiu de 43,92% dos votos para 4,68%. Segundo António Costa, isso aconteceu porque o PASOK aderiu à austeridade e se aliou à direita. Ora bem, quando queremos tirar lições da história, convém termos a história certa. António Costa não tem.
Em Outubro de 2009, o PASOK ganhou as eleições com maioria absoluta pelo truque de ignorar os sinais da iminente bancarrota da Grécia. O PASOK recusou a austeridade e as reformas, e prometeu, em vez disso, injectar 3 biliões na economia. Ia ser tudo alívios e facilidades. Meses depois, estava a pedir ajuda à UE e ao FMI. Nem então, porém, o PASOK deu a mão à austeridade. Ao mesmo tempo que assinava memorandos, Papandreou inventava maneiras de os contornar, como o célebre referendo no fim de 2011. Entretanto, divisões e cisões destruíam a maioria do PASOK e impuseram um governo interino e eleições antecipadas. Foi nestas eleições, em Maio de 2012, ainda sem qualquer aliança com a direita (porque a participação no governo interino não resultou de uma aliança), que o PASOK sofreu o colapso histórica (13% dos votos) que determinou o resto da história. Depois, já foi só um resto do partido que finalmente alinhou com a Nova Democracia (mas mesmo assim, ao princípio, sem os seus líderes no governo).
O PASOK não desapareceu pelas razões que Costa imagina, mas pelas razões contrárias: pela incapacidade de protagonizar o ajustamento e a reforma da Grécia, e pela preferência por quimeras e malabarismos que, como era previsível, acabaram por o desacreditar totalmente.
O PS ainda não é o PASOK por sorte. Em 2009, também venceu umas eleições a negar a “austeridade”, para depois andar de PEC em PEC. Em 2011, deixou um país arruinado, mas teve a sorte de haver uma coligação de direita que, com mais ou menos dificuldade, executou o bastante do memorando para equilibrar as contas. O PS, dispensado de ajudar, pôde fazer de cigarra da anti-austeridade, ajudado ainda pelo modo como o velho PCP e a velhinha UDP (sob o pseudónimo de BE) bloqueiam o desenvolvimento de “Syrizas” ou de “Podemos”. Mas não é difícil imaginar o PS transformado num PASOK. Basta-lhe ir às eleições de 2015 com o programa do PASOK de 2009 ou o do Syriza.
A Grécia ou Portugal não têm economias para sustentar os seus “modelos sociais”. Restam-lhes três alternativas: ou reformam a economia para competir nos mercados internacionais, que é por onde podem crescer sem engendrar dívida; ou convencem a Alemanha a pagar as contas; ou abandonam o euro e aceitam uma descida tremenda de nível de vida. Para esta última opção, não há “base social de apoio” (como a esquerda radical gosta de dizer), e é por isso que os Hollandes e os Tsipras acabam, sem querer, na lei Macron ou no elogio patético da “Alemanha hegemónica”.
Não tem de ser assim. Como diz Jeffrey Sachs, “grandes défices e a subida do peso da dívida no PIB não têm nada de progressista”. O PS, porém, não se tem mostrado capaz de elaborar uma proposta fundada nessa constatação. Parece intimidado pelo radicalismo absurdo que tem obrigado a esquerda a deixar à direita causas como a estabilidade monetária, a liberdade de iniciativa, ou agora, em nome do politicamente correcto, até a liberdade de expressão. Costa tem medo: receia que, se admitir a conveniência do ajustamento e a necessidade de reformas, acabe por legitimar a direita e por ceder a coroa da anti-austeridade, com que espera ganhar as eleições, ao PCP e à extrema-esquerda. Mas é precisamente esse medo que pode pôr o PS na via sacra do PASOK.