Ouve-se o apito, tudo para e já está: Pedro Proença substitui Luís Duque na presidência da Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP). E nem teve tempo para aquecer, já que o antigo árbitro, reformado desde janeiro, apresentou a candidatura ao cargo apenas seis dias antes das eleições. Foi o suficiente para reunir 32 votos em 55 possíveis (58,8%) e superar os 23 que Duque obteve (41,8%)

A votação estava agendada para decorrer entre as 14h30 e as 17h30, mas um atraso deu-lhe a volta. As urnas apenas abriram uma hora depois do previsto e, quando o fizeram, todos os 37 clubes inscritos nas eleições votaram no seu candidato preferido. A tomada de posse de Pedro Proença será já na quinta-feira, 30 de julho.

As contas não terão obrigado a tirar a máquina de calcular da gaveta, já que eram simples: o voto de cada um dos 18 clubes da primeira liga valia por dois (+2), e um vindo de alguma das 24 equipas da segunda liga valia apenas por um (+1). Logo, cada candidato trabalhou no duro para cair no goto do maior número de clubes da principal divisão, de modo a colocar mais peso do seu lado da balança.

O que Proença quer: um All Star Game, uma Liga Ibérica e Boxing Day

Como qualquer candidato, Pedro Proença tinha um programa. Intitulado “Credibilizar a Liga, criar valor e internacionalizar”, o documento, com 28 páginas, tem logo uma ideia original — criar uma espécie de Liga Ibérica. Esta competição, que teria de contar com o sim da La Liga e dos clubes espanhóis, já que esta liga colocaria taco-a-taco os melhores classificados de ambos os campeonatos. Em termos de bola a rolar, Proença pretende também que, presumivelmente, no final de cada época, se realize um All Star Game, um jogo amigável entre os melhores jogadores do campeonato.

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E haverá mais, porque o novo presidente da Liga tem a ideia de implementar o que há décadas se faz por Inglaterra, o Boxing Day, ou seja, colocar uma jornada do campeonato a ser jogada um ou dois dias depois do Natal.

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(alguns slides do programa com que Pedro Proença foi eleito presidente da Liga de Clubes.)

Depois as prioridades passam por “adotar as práticas de sucesso das principais ligas europeias”, lê-se num slide no qual constam os símbolos da Premier League, Bundesliga e La Liga. Isso passará pela centralização dos direitos televisivos, ou seja, pela negociação única de um contrato para a transmissão televisiva dos jogos da Liga, criando um bolo de receitas que será depois fatiado irmãmente por todos os clubes do campeonato. A introdução da tecnologia da linha de baliza é outros dos pontos que Pedro Proença, ex-árbitro, quer concretizar, além de uma alteração do processo de remuneração dos árbitros — que passará a ter em conta o “mérito profissional”, o “desempenho” e a “experiência”, e não apenas o escalão em que o homem do apito se encontra, como hoje acontece.

Outras novidades, estas para piscar o olho ao adepto, passarão, por exemplo, pela introdução de wi-fi (gratuito?) em todos os estádios da primeira liga, criar uma Liga TV, com conteúdos próprios que sejam comercializados no estrangeiro e que ajudem a promover o campeonato português, ou até inventar uma aplicação para smartphones e uma Fantasy League (liga virtual para adeptos).

Como se chegou a isto?

Desde o início que os clubes sabiam que Luís Duque, na liga, seria como um bombeiro. O antigo dirigente do Sporting foi eleito em outubro de 2014 para apagar os fogos que Mário Figueiredo, o antecessor, ateara — contas da Liga a tremerem e o campeonato nacional desprovido de patrocinador. Em menos de oito meses, Duque renunciou ao salário de presidente da Liga de Clubes, mexeu-se, teve reuniões, fez telefonemas e foram surgindo novidades.

Ao patrocínio da NOS à primeira liga, em fevereiro (com 18 jornadas então realizadas na versão 2014/2015 do campeonato), seguiu-se, em julho, o dos CTT à próxima edição da Taça da Liga. Os clubes gostaram, aplaudiram a estabilidade recém-conseguida e, depois, alteraram os estatutos da LPFP. Foi esta alteração, votada e decidida em Assembleia Geral, que obrigou Luís Duque a demitir-se quando já todos sabiam, de antemão, que ele se iria recandidatar ao cargo para continuar o trabalho interrompido. Aí, de repente, apareceu Pedro Proença.

Não chegou a apitar nem a mostrar cartões. Seis dias antes das eleições, o árbitro que passou a ex-árbitro em janeiro anunciava que era candidato à presidência da Liga de Clubes. A surpresa foi alguma. Proença mantivera-se enigmático desde a retirada das lides do apito e, até então, a sua voz apenas se ouvira para falar do Conselho da Arbitragem da Federação Portuguesa de Futebol ou da sua nomeação, no início de julho, para o Comité de Arbitragem da UEFA.

Porto, 23/07/2015 - Entrega das listas da candidatura à Presidência da Liga Portuguesa de Futebol Profissional, na sede da Liga no Porto. Luis Duque, candidato à Presidência da Liga Portuguesa de Futebol Profissional. ( Global Imagens )

Antes da eleição, o Expresso dizia que Luís Duque tinha garantido o apoio do Benfica, Sporting de Braga, Boavista, Tondela, Oriental, Farense, Desportivo das Aves e Famalicão. Já Pedro Proença, o árbitro que mais nas vistas deu na histórias dos homens do apito portugueses, que esteve numa final da Liga dos Campeões e, em 2013, foi considerado o melhor árbitro do mundo, tinha do seu lado o FC Porto, Sporting, Estoril, Moreirense, Marítimo e União da Madeira.

Ou seja, há dois grandes de um lado e um do outro. Jorge Nuno Pinto da Costa, líder dos dragões, chegou a criticar Duque por não ir às reuniões com a Federação Portuguesa de Futebol (FPF), por, alegadamente, não as achar interessantes. “Não tem o mínimo de condições”, resumiu o presidente do FC Porto, dizendo ainda, em entrevista ao Jogo, que os patrocínios da NOS e da CTT foram conseguidos por Joaquim Oliveira, presidente da SportTV e da Controlinveste — e que Luís Duque apenas se “limitou a assinar”. Já Bruno de Carvalho disse e reafirmou que a presença de Duque na Liga de Clubes era “uma afronta ao Sporting”.

Do outro lado havia o Benfica, único dos grandes que, através do seu canal de televisão, compete hoje com a SportTV pela compra dos direitos de transmissão televisiva dos principais campeonatos europeus — além da Premier League inglesa, a estação encarnada já garantiu também a Ligue 1 francesa e a Séria A italiana. Luís Filipe Vieira, presidente do Benfica, considerou “notório” que Pedro Proença “só aparece [como candidato] por intermédio do FC Porto, para fazer o confronto com o presidente da FPF, nomeadamente no que diz respeito a pretensas alterações no Conselho de Arbitragem”.