A Comissão Europeia admitiu esta segunda-feira que a solução encontrada para o Banif exige uma ajuda de Estado que pode chegar aos 3000 milhões de euros. Este valor é superior aos 2.255 milhões de euros, referidos ontem num comunicado do Banco de Portugal para o apoio público associado à venda e resolução do Banif.

O ministro das Finanças, Mário Centeno, começou por explicar a diferença entre as duas contas com a ajuda de Estado já dada ao banco e que ainda não tinha sido aprovada por Bruxelas que abriu uma investigação aprofundada. Agora, a Comissão aprovou esta ajuda (que incluía uma injeção inicial de capital de 700 milhões de euros) dada no final de 2012, elevando a soma total aos tais três mil milhões de euros.

No entanto, em esclarecimentos posteriores ficou claro que os 3000 milhões de euros resultam apenas da resolução aplicada no fim de semana e incluem para além dos 2.255 milhões de euros referidos no domingo à noite, 422 milhões de euros de auxílio adicional associado à transferência dos ativos de má qualidade do banco para um veículo especial que será detido pelo Fundo de Resolução, diz o comunicado da Comissão Europeia. Há ainda 323 milhões de euros de garantias concedidas pelo Estado que se destinam a cobrir potenciais alterações recentes no valor dos ativos vendidos ao Santander Totta.

Bruxelas fala numa “margem adicional de segurança” que assume a forma de uma garantia de Estado para acautelar eventuais desvalorizações da parte do Banif que vendida ao Santander Totta.

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A conta final do Estado e dos contribuintes pode superar os 3800 milhões de euros considerando o aumento de capital já realizado pelo Estado no final de 2012 de 700 milhões de euros e os instrumentos de dívida CoCos destinados ao Banif e que ficaram por devolver. Valem 125 milhões de euros.

O ministro das Finanças, Mário Centeno, manifestou confiança na possibilidade deste custo ficar abaixo, graças à venda e rentabilização dos ativos que ficam no veículo detido pelo Fundo de Resolução. O principal ativo para venda é a seguradora Açoreana.

O Santander vai comprar o Banif por 150 milhões de euros, mas a solução envolve um apoio público de 2255 milhões de euros, adiantou este domingo o Banco de Portugal. Em comunicado, o supervisor esclarece que a alienação foi realizada no contexto de uma medida de resolução, na sequência das “imposições das instituições europeias e a inviabilização de uma venda voluntária.”

O impacto no défice

Do montante de apoio público, 1766 milhões de euros virão do Estado e 489 milhões de euros vão sair do Fundo de Resolução que já assumiu a fatura com a resolução do Banco Espírito Santo. O fundo será financiado pelo Estado para este efeito e beneficia ainda de uma garantia pública adicional no valor de 750 milhões de euros.

O fundo é financiado pelos bancos do sistema nacional, mas é uma entidade pública, pelo que a fatia de custos que assume irá pesar também nas contas do Estado. O número vai fazer aumentar o défice em mais de 1 ponto percentual do PIB (Produto Interno Bruto) de 2015, mas o ministro das Finanças assegura que não contará para os procedimentos dos défices excessivos devido à natureza da operação.

Mais tarde, uma nota dos técnicos do Parlamento, a UTAO, dará uma outra versão. O custo da solução para o Banif entra no défice de 2015, mas como se trata de um apoio ao sistema financeiro pode justificar o adiamento por um ano do encerramento do Procedimento dos Défices Excessivos do qual Portugal deveria sair do final do ano passado.

A aplicação da medida de resolução resulta da constatação por parte do governo de que todas as propostas de compra apresentadas implicavam “um auxílio do Estado adicional, o que determinou que a alienação fosse fosse feita num contexto de resolução”.

As regras europeias definem que os investidores devem estar na primeira linha da assunção de custos de uma resolução bancária, mas no caso do Banif o maior acionista é o Estado que tem 60% do capital desde dezembro de 2012.

Ainda de acordo com o comunicado do Banco de Portugal, esta solução resulta das opções acordadas entre as autoridades portuguesas, as instâncias europeias e o Banco Santander Totta, para a delimitação dos ativos e passivos”. A solução garante a total proteção das poupanças das famílias e empresas que estão no Banif, incluindo depósitos e obrigações seniores”, diz o supervisor.

A opção foi tomada em função da proteção dos depositantes, dos emigrantes portugueses, dos trabalhadores e da economia regional, explica o primeiro-ministro. António Costa reconhece que a solução “tem um custo muito elevado para os contribuintes”, mas é a que melhor defende os interesses nacionais, assegurou numa comunicação feita ao país no domingo à noite.

Costa culpa anterior governo. Demora levou a solução de custos elevados

O primeiro-ministro revela que foi confrontado com situação de urgência, que era conhecida há mais de um ano pelas autoridades portuguesas. Desde janeiro de 2013, que o Estado detém a maioria do capital do Banif e sabia que estava obrigado a apresentar um plano de reestruturação. Segundo Costa, há mais de um ano que as autoridades portuguesas foram notificadas e, depois da rejeição de vários planos, a Comissão Europeia fixou um prazo, março deste ano, para apresentação de um “plano credível de reestruturação do Banif”.

Imposições europeias empurraram Banif para a resolução

Passados nove meses da data limite, nada estava resolvido, o que conduziu a que as autoridades comunitárias colocassem a imposição às autoridades nacionais de apresentarem uma solução até ao dia de hoje (domingo), sob pena do Banif deixar de ter condições de continuar a operar no mercado. O Banco Central Europeu retirou o estatuto de contraparte do eurosistema ao banco, com efeitos a partir de segunda-feira e Direção Geral da Concorrência europeia não permitiu uma venda da posição do Estado com ajudas adicionais do Estado.

Terá sido esta imposição que empurrou o Banif por uma venda através de resolução, o que limitou o perfil dos compradores a bancos, neste caso o Santander e o Popular, e obrigou a reconhecer perdas muito elevadas na separação dos ativos tóxicos da parte boa, uma vez que estes ativos foram valorizados com um desconto muito elevado, próximo de um cenário de liquidação.

António Costa recorda que em janeiro entrariam em vigor condições mais gravosas para a resolução bancária, envolvendo a possível penalização de grandes depositantes — o Banif tinha mais de sete mil depositantes com mais de 100 mil euros, que representavam um terço dos depósitos do banco — o que exigiu a maior urgência na resolução do problema. Foi portanto, “nestas condições difíceis” que o banco foi vendido ao Santander Totta, o que não deixou de se refletir nos elevados custos desta operação.

A solução encontrada revelou-se entre as várias opções a que melhor serve o interesse público, protegendo a economia, sobretudo das regiões autónomas, os depositantes e a estabilidade do sistema financeiro. O primeiro-ministro garante que esta solução é definitiva, não ficando o Estado sujeito a perdas futuras. “Podemos esperar e estamos a trabalhar na maior recuperação possível dos custos” agora assumidos. A valorização com um grande desconto dos ativos que ficam na esfera pública, alimenta alguma esperança de retorno positivo, contrário ao que sucedeu com os ativos do BPN.

“Este governo faz questão de não iludir os contribuintes e reconhecer os custos desta solução e considera que os portugueses têm o direito ao cabal esclarecimento relativamente a todo este processo.”

O primeiro-ministro está disponível para prestar toda a informação ao Parlamento. Ainda não se conhecem os detalhes por trás do financiamento do Estado, de 1766 milhões de euros, que poderá ter como destino a cobertura dos ativos tóxicos associados à carteira de imobiliário, e aos respetivos créditos, que o Banif já tinha destacado.

António Costa diz que este processo suscita a necessidade de refletir com o Banco de Portugal e demais reguladores sobre o quadro de supervisão necessária para garantir a estabilidade do sistema financeiro. O primeiro-ministro reconhece que a resolução de um banco é “dolorosa” e mais uma vez “custosa para os contribuintes”. Mas remata que esta segunda-feira os balcões vão reabrir com normalidade sobre a responsabilidade de uma instituição bancária “conhecida e credível”.

Balcões e clientes do Banif vão passar para o Santander Totta

O banco vai manter a prestação normal de serviços financeiros e os clientes poderão realizar todas as operações nos balcões e canais eletrónicos. Os clientes e agências do Banif vão passar para o Santander Totta, o banco português controlado pelo Santander.

O Banif recebeu seis propostas de compra da participação do Estado de 60% do capital na sexta-feira. Os espanhóis Santander e Popular, o fundo Apollo, dono da Tranquilidade, e mais três fundos de private equity. Mas na reta final, já num cenário de resolução, só os dois bancos espanhois estavam na corrida.

Um veículo para ativos tóxicos

A solução está organizada em três eixos. A transferência da generalidade de atividade bancária passa para o Banco Santander Totta. Os ativos problemáticos serão transferidos para um veículo de gestão de ativos, o comunicado não esclarece quem ficará a ferir este veículo. No Banif ficará um conjunto muito restrito de ativos, que será alvo de futura liquidação. Esta classificação inclui as posições acionistas, os créditos subordinados e os créditos de partes relacionadas. Os herdeiros de Horácio Roque são os maiores acionistas privados do Banif, com cerca de 8% dos direitos de voto e 6,3% do capital.

Degradação acelerada de liquidez e risco de pagamentos

A ajuda de Estado ao banco estava ser investigada apela Comissão Europeia que demonstrou muitas dúvidas sobre a possibilidade de devolução dos apoios concedidos. Segundo o Banco de Portugal, estava em causa uma “provável declaração de ilegalidade do auxílio do Estado ao Banif”, o que criaria uma “gravíssima insuficiência de capital”.

O Banco de Portugal revela ainda que se registou uma “degradação muito acelerada nos últimos dias” da situação de liquidez do Banif, sob a pressão de uma corrida aos depósitos, e que havia riscos para a “manutenção do seu fluxo normal de pagamentos e satisfação das responsabilidades para com os clientes”. Sabe-se que depois da notícia da TVI, entretanto corrigida, que falava em encerramento do banco, o Banif perdeu cerca de 900 milhões em depósitos.

As ações do Banif, suspensas desde quinta-feira passada, foram entretanto expulsas do índice PSI 20, e não deverão a ser negociadas em mercado.