Será um dia intenso em reuniões para acabar de preparar o Orçamento do Estado, entre as mais públicas e as mais reservadas. Esta quarta-feira às nove da noite os ministros das Finanças, Mário Centeno, e da Segurança Social, Vieira da Silva vão dar as primeiras explicações aos deputados socialistas, disse ao Observador fonte oficial, num momento em que ainda estão por acordar alguns pontos da proposta com os parceiros da esquerda.

No grupo parlamentar, os dois ministros vão enfrentar dúvidas, sobretudo relativas às medidas que estão em estudo para compensar aumentos de despesa, como o aumento de pensões exigido pelos parceiros da esquerda. Para esse efeito, uma das propostas que está em cima da mesa — avançada na edição de sábado passado pelo jornal Público — é a da devolução da sobretaxa de IRS de forma faseada, para os escalões mais altos, em 2017.

A lei aprovada no final do ano passado definiu que a sobretaxa acabava a 1 de janeiro de 2017, mas o Governo estará a estudar a hipótese de fasear a devolução nos escalões mais altos, uma medida alternativa à introdução de novas taxas sobre o consumo, que têm sido também estudadas no âmbito deste Orçamento do Estado.

A ideia não é pacífica entre os partidos que apoiam o Governo no Parlamento. Por partes: no Bloco de Esquerda, Mariana Mortágua disse ao i e ao Expresso que a sobretaxa tem de acabar para todos já em janeiro; no PCP, João Oliveira, disse que “deve acabar imediatamente” porque é isso que está definido no decreto aprovado pela esquerda em dezembro do ano passado; no PS a teoria divide-se.

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“Politicamente insustentável”

Os socialistas escudam-se no facto de o Orçamento ainda não estar fechado para não comentarem a possibilidade deixada em aberto, ainda esta segunda-feira, pelo próprio primeiro-ministro. A partir da China, António Costa não desmentiu a notícia do Público e remeteu o fim da sobretaxa apenas para 2017. “Apenas” porque ao dizer 2017, Costa não baliza a medida. “É difícil justificar politicamente” a manutenção da sobretaxa, admite um deputado socialista que recorda a máxima tão repetida por António Costa no que toca a promessas eleitorais: “Palavra dada é palavra honrada”. O mesmo deputado também diz que esse pode ser o caminho para “permitir maior conforto orçamental em 2017. Mas isso tem de significar que não há mais taxas e taxinhas”, ou seja, mais novos impostos indiretos. O caminho inicialmente proposto pelo ministro das Finanças era não tocar em impostos diretos, o que implicaria mexidas nos indiretos.

Uma deputada socialista avança com outro argumento: “O aumento de impostos indiretos vai afetar todos os segmentos de rendimento, já manter a sobretaxa para escalões superiores de rendimento só afeta alguns” contribuintes. Outro deputado da direção da bancada mostra-se pouco incomodado com uma eventual manutenção da sobretaxa para alguns em 2017: “Não me choca nada o que tenha a ver com a sustentabilidade das contas públicas”.

O Orçamento ainda não está fechado, mas o Governo conta aprová-lo no Conselho de Ministros de quinta-feira — só aí já com António Costa de volta da China — e para o entregar na tarde do dia seguinte no Parlamento. Depois, nessa mesma noite, segue-se uma reunião da Comissão Política Nacional do PS para o debate interno da proposta, com o líder socialista. Entretanto, Mário Centeno ainda tem de fechar acordo com a esquerda, que até à tarde desta terça-feira não tinha certezas sobre algumas das questões mais importantes deste Orçamento: pensões, salário mínimo nacional, sobretaxa e impostos indiretos sobre o consumo. Todas elas estão ligadas.