A Comissão Europeia recebeu esta quinta-feira, dentro do prazo, a carta do Governo português com as respostas às dúvidas de Bruxelas sobre o projeto de Orçamento do Estado para 2017, e nela o Governo insiste nas suas contas, dizendo até que as estimativas para as receitas fiscais, nomeadamente para programas extraordinários como o perdão fiscal e o programa de reavaliação de ativos, são “muito conservadoras”. Governo promete, no fim, consolidação “socialmente inclusiva e amiga da economia”.

“O orçamento para 2017 põe no terreno um esforço de consolidação substancial e cumpre totalmente com as metas e os objetivos do Plano de Estabilidade e Crescimento”, começa a lê-se na carta divulgada esta sexta-feira pela Comissão Europeia, onde o ministro das Finanças insiste nas suas contas e procura justificar as divergências com questões metodológicas de cálculo do PIB potencial, usado para calcular o défice estrutural, a meta que Bruxelas efetivamente impõe a Portugal para o próximo ano.

No orçamento para 2017 o Governo prevê uma redução do défice estrutural (défice que o país teria se as condições de crescimento fossem as ideais) de 0,6% do PIB, mas Bruxelas pediu esclarecimentos sobre esta questão e, na carta enviada esta terça-feira a pedir informação, diz mesmo que, nas suas contas, o Governo consegue apenas um ajustamento ligeiro do défice estrutural. Para passar no crivo de Bruxelas, o Governo tem de ter um ajustamento de pelo menos uma décima do saldo estrutural.

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Leia aqui a carta do ministro das Finanças à Comissão Europeia

Nas explicações, Mário Centeno diz que a economia portuguesa enfrenta “desafios internos e externos significativos” que pesam na materialização do crescimento potencial e que, “como consequência”, isso fez com que “diminuísse o gap entre o crescimento potencial e o crescimento real em 2016″. Ou seja, a economia estará a crescer (crescimento real), de facto, muito perto do que estaria a crescer se tivesse todos os seus recursos a serem utilizados em pleno (crescimento potencial). Entre os fatores citados estão a estabilização do setor bancário e o tempo que as reformas estruturais demoram a produzir resultados.

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Não obstante, argumenta o ministro das Finanças, a evolução registada este ano não justifica “uma revisão em baixa do produto potencial” — quanto mais baixo for o potencial de crescimento, menor terá de ser o valor nominal do ajustamento estrutural, já que a meta é uma variação em função do PIB potencial, que aqui seria mais baixo. Os indicadores que o governante aponta para isto são: a estabilização do setor bancário (“que se iniciou quando o Governo tomou posse mas que demora tempo a ter consequências na economia real”), as reformas estruturais, “as atuais e as passadas, que ainda estão em fase de maturação”, e o abrandamento externo da economia.

Aliás, o Governo diz mesmo que a estimativa da Comissão é incorreta, devido à forma de calcular o crescimento potencial, e que essa forma “enviesada” de calcular o PIB potencial tem implicações significativas na posição das finanças públicas portuguesas.

Centeno diz ainda que as estimativas de receita fiscal são muito conservadoras, defendendo que a cobrança poderá ser superior à prevista na proposta do Orçamento do Estado para 2017. E cita dois casos: a reavaliação extraordinária dos ativos das empresas, que poderá gerar uma receita anual de 125 milhões de euros durante três anos, sendo que este o Governo diz que já conseguiu um encaixo superior ao previsto em “vários milhões”, e o encaixe com o PERES (Programa de Redução do Endividamento ao Estado) que o Executivo estima em 100 milhões de euros por ano – 1.090 milhões no total – que compara com os 1.230 milhões de euros encaixados com o perdão de dívidas ao fisco e segurança social aprovado em 2013 pelo anterior Governo e cujos efeitos se produziram todos num ano.

Trata-se das cartas dos cinco Estados-membros aos quais o executivo comunitário pediu, com alguma urgência, informações suplementares sobre os respetivos planos orçamentais para o próximo ano (Portugal, Bélgica, Chipre, Finlândia e Itália). Bruxelas enviou também cartas a Espanha e Lituânia, mas nestes casos a solicitar que sejam enviados anteprojetos orçamentais atualizados e em conformidade com as regras assim que estiverem em funções os novos governos.