Exceção feita ao seu pai, conhece mais alguém com bigode? É como encontrar agulha em palheiro. Nem vale a pena tentar, esses tempos já lá vão. Aqui, em Portugal, e também no resto do mundo. Já lá vai o tempo de “levar um bigode”, expressão muito própria dos anos 60 e 70. Agora, ninguém leva um bigode. Na teoria (porque joga-se na retranca como se o futebol tivesse recuado no tempo). E na prática (porque, pura e simplesmente, não há bigodes nos relvados). Perde-se o costume. Vem esta estranha temática a propósito do Movember, um movimento nascido na Austrália, em 2004, que incentiva as pessoas (sim senhor, há mulheres a aderir) a deixar crescer o bigode no mês de Novembro numa ação a favor do cancro da próstata.

A ideia espalha-se rapidamente. Sai da Oceania e entra na Ásia, onde o bigode é tão raro como uma refeição sem pauzinhos. E aqueles que fazem por isso são suspensos por doping. Olhe lá o caso do japonês Ryohei Yamanaka, suspenso de agosto 2011 a abril 2013 por ter usado um creme para fazer crescer o bigode. Como o dito cujo tem esteróides anabolizantes, é apanhado nas malhas do doping e falha o Mundial-2011. Da Ásia expande-se para Europa, América e África.

Os cinco continentes conhecem de ginjeira o Movember. Só falta o futebol entrar na festa. Nesta situação, vemo-nos obrigados a pensar na relação, que não a de causa-efeito, tão-só a de casualidade, dos bigodes da história. E basta a nossa. A História de Portugal. Veja-se o exemplo de D. Afonso Henriques: não só expulsa a mãe, D. Teresa de Leão, com a vitória na batalha de São Mamede (um bigode à intransigência espanhola) como ainda se torna o primeiro rei de Portucale (com bigode, pois claro).

No futebol, então, há casos aos montes. Por cada momento futebolístico, sublime ou não, certamente único, há um bigode ligado a ele. Em 1966, quem é o selecionador de Portugal no Mundial de Inglaterra? O brasileiro Otto Glória. De bigode em riste. Fino, sim, mas um senhor bigode. No Europeu-84, em França, quem é o português eleito para a equipa ideal? Chalana, mais conhecido por Cyrano Bergerac, pelo proeminente nariz e aquele bigode inconfundível, visto a quilómetros de distância. Na qualificação para o Mundial-86, é preciso ganharmos em Estugarda, à então imbatível RFA. No meio-campo, arranca irresistível a locomotiva do Barreiro. Quem? Carlos Manuel, outro bigodeiro. E é golo, Schumacher (outro com bigode) nem a vê.

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No México, quem é o porta-voz da indignada equipa nacional? Bento. Ao seu lado, outro bigode (Ribeiro, do Boavista). Está bonito está. Em 1987, quem é o treinador português a levar o FC Porto à inédita conquista da Taça dos Campeões? Artur Jorge, com aquele bigode farfalhudo. No ano seguinte, quem falha o único penálti da final da Taça dos Campeões entre Benfica e PSV? Veloso, com aquela bigodaça ruiva. Sem tirar o pé do acelerador em termos de finais europeias, quem é o ex-sportinguista convicto a decidir o Milan-Benfica em 1990? Frank Rijkaard. Esse mesmo, o contratado pelo bigodes Jorge Gonçalves.

Em 1989 (Riade) e 1991 (Lisboa), quem é o mister das gerações de ouro? Carlos Queiroz, sem ponta aparada, o que fazia dele um português com aspecto de mexicano dos livros do Lucky Luke. O adjunto é Nelo Vingada – este sim, português de gema. Qual é a seleção portuguesa mais entusiasmante pós-Magriços? A do Euro2000, de Humberto Coelho, ainda com bigode. Qual é a seleção mais errática de sempre? A do Mundial-2002, treinada por António Oliveira, de bigode apoiado nas muletas. Para cortar com o sinistro passado, a federação aposta em que treinador? Scolari. Que chama Murtosa para adjunto. Juntos, estes dois bigodes animam Portugal (vice-campeão europeu em 2004 e quarto classificado no Mundial-2006).

Enfim, a lista é extensa e podíamos continuar por aí fora com mais exemplos, como o do árbitro António Rola, especialista e campeoníssimo nos 100 e 200 metros costas, num outro momento hilariante do nosso quotidiano (Estrela-FC Porto, em Fevereiro 1997). O grande problema é que agora já não há bigodes. Sejam fartos, à Shaolin, ou fininhos dos anos 20, à Kananga do Japão (lembram-se de Valdir, aquele avançado do Benfica de Autuori?). Olhamos para os jogadores de futebol lá fora e é só caras vazias. Tentamos afunilar a questão e olhamos para os titulares das 18 equipas da 1.ª divisão portuguesa – ex-Primeira Liga, ex-SuperLigaGalp Energia, ex-Liga Betandwin, ex-Liga Bwin, ex-LigaSagres e ex-xiribitatátatá – e mais do mesmo, sobretudo nos três grandes.

Tudo ao contrário de há duas décadas, onde o dito é presença assinalável nos estádios nacionais e, por consequência, nas lendárias noites europeias, invariavelmente à quarta-feira, como o Benfica de Bento; Pietra, António Bastos Lopes, Alberto Bastos Lopes e Álvaro; Veloso, Carlos Manuel e Shéu; Chalana, João Alves e César. Ou o Sporting de Meszaros; Gabriel, Virgílio, Barão e Festas; Zezinho, Nogueira, Freire e Romeu; Paulinho Cascavel e Ailton. Ou então o Porto de Mlynarczyk; Gabriel, Teixeira, Simões e Eduardo Luís; Frasco, Murça, Rodolfo e Costa; Seninho e Oliveira. Há para todos os gostos e feitios. Movember, aí vamos nós.

Eis um onze ideal de bigodes, com treinador e presidente incluídos

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