Não é habitual. Vê-lo sentado no banco de suplentes, fato-de-treino vestido, olhos sobre o relvado, atento, sereno, vendo os demais fazer aquilo que faz como poucos. “Ele” é André Silva, ponta-de-lança do FC Porto, titularíssimo até este domingo na Primeira Liga e goleador-mor dos portistas. E André foi suplente contra o Boavista. Enfim suplente.

Não que uma qualquer lesão o tenha impedido de jogar. Não que André tenha desaprendido de jogar da noite para o dia. Mas André precisava de descansar — afinal, ainda há muitos (e decisivos) jogos pela frente, incluindo os oitavos-de-final da Liga dos Campeões e o clássico diante do Benfica. Antes, o treinador Nuno não tinha como o fazer descansar. A alternativa a André era Depoitre, mas de “alternativa” o belga apenas tinha a posição que ocupa no relvado — e até o petiz Rui Pedro foi mais útil do que Depoitre desde o começo da época.

Chegado no Inverno, qual prenda no sapatinho de Nuno, Soares fez logo ver diante do Sporting (bisou no jogo do Dragão) ao que vinha. E vinha, está visto, para fazer o que quase só André sabia fazer até aqui, golos, e permitir que este “folgasse”. Em quatro jogos no campeonato (sempre lado a lado com André Silva lá na frente) fez cinco golos. Isto contando com o desta noite, claro.

E o desta noite chegou cedo, logo aos sete minutos. O golo de Soares, em si, foi “só” de encostar. Mas a jogada tem muito o que contar. E começou na técnica (de drible, de passe…) e visão de jogo de Óliver Torres. A bola cirandava a área do Boavista desde o começo do jogo. E os da casa recolhiam-se lá, dentes cerrados, concentração nos píncaros, evitando que o FC Porto criasse perigo e chegasse ao golo. Então, e descaído sobre a direita, Óliver recebeu bola, esperou que algum adversário, “lambão”, se chegasse ele, esperou que a defesa do Boavista subisse uns metros e se descuidasse nas costas… e esperou bem. Quando isso aconteceu, rodopiou, driblou um boavisteiro (Carraça de apelido e uma verdadeira “carraça”a mordiscar-lhe as botas) e isolou Corona na direita, o mexicano cruzou tenso e rasteiro para o segundo poste, onde Soares (mais veloz do que os centrais Lucas Tagliapietra e Carlos Santos, que entretanto haviam avançado no relvado) surgiria a desviar.

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Até à canela era pescoço. O mesmo é dizer que a primeira parte foi “rasgadinha”, disputada no limite, mas sempre com o FC Porto na mó de cima e sem que o Boavista rematasse. Quando o fizeram, os da casa quuuuuase chegaram ao golo. Talocha cruza (de muito longe, logo depois do meio-campo) para a área do FC Porto, Iván Bulos e Marcano saltaram, o central espanhol corta a bola, mas corta-a para o pior lugar: a entrada da área e o pé direito de Anderson Carvalho, que remata de primeira. A bola ainda bateu no relvado, subiu, outro guarda-redes seria traído pelo efeito desta, mas Casillas não é Casillas por acaso e defendeu. Que reflexos os do espanhol! Isto à meia-hora de jogo.

Logo depois, aos 34′, responderia o FC Porto. Se a defesa de Casillas foi de classe, a de Wagner não lhe ficou nada atrás. A jogada quem a inventou foi Brahimi, pela esquerda, driblando tudo e todos, Edu Machado e Iuri Medeiros primeiro, Carlos Santos a terminar, entrou na área, cruzou, a defesa do Boavista cortaria a bola às três pancadas na pequena área, mas esta sobrou para Soares, que encheu o pé. Foi um “tiraço”, com tudo, o remate do brasileiro. Mas acertou num “muro”, também natural de terras de Vera Cruz, que foi o guarda-redes boavisteiro. A defesa foi por instinto, é certo, mas nem todos o têm assim tão apurado como Wagner.

Chegaria o intervalo. E um “sururu” que só visto. Pouco antes do árbitro Fábio Veríssimo apitar, Corona foi derrubado por Talocha e ficou lesionado. Os dois travar-se-iam de razões na ida para o balneário. Corona viu amarelo. O treinador do FC Porto, Nuno, e o técnico de guarda-redes do Boavista, Alfredo, seriam expulsos na confusão que se gerou.

A entrada de Talocha foi realmente dura. Tanto que o mexicano Corona ficou no balneário ao intervalo e entraria para o seu lugar Jota. E o primeiro remate desde o recomeço (e tardou a ver-se um remate) foi mesmo do suplente. Brahimi trazia a bola (60′) na direção da área vindo da esquerda, perdeu-a, mas esta sobraria para Jota. Estava de costas para a baliza de Wagner, rodou, rematou logo dali, à entrada da área, mas o remate foi frouxo e o brasileiro encaixaria sem sobressalto.

Siga o cronómetro até aos 67′. Há cortes que valem golos. Ou melhor: evitam-nos. E este de Marcano foi tão in extremis quanto miraculoso. Num autêntico “charuto”, o lateral direito Edu Machado colocou a bola na área do FC Porto, Iván Bulos e o Boly saltaram, o avançado boavisteiro levou a melhor e amorteceu a bola para o Schembri, que a recebeu no pé direito e remataria depois com a canhota. Só não rematou (e Casillas estava em apuros, pois o remate de Schembri foi à queima-roupa) porque Marcano se esticou todo, lançou-se sobre relvado e tocou a bola no último instante para a linha de fundo.

Até final, mais uma expulsão no FC Porto: aos 82′, Maxi derrubou André Bukia e viu o segundo cartão amarelo. Esperar-se-ia uma reação do Boavista, mas quem esperou, por lá continua, no Bessa, à espera. O FC Porto venceu mesmo e voltou a aproximar-se do Benfica: um ponto separa o líder do perseguidor e segundo da tabela.