Os estrangeiros que mudaram para Portugal, ao abrigo do regime fiscal para residentes não habituais, beneficiaram de vantagens fiscais da ordem dos 166 milhões de euros no ano passado, em relação ao IRS pago em 2015. Este valor mais do que triplicou nos últimos três anos, passando de 52 milhões de euros em 2014, relativos ao imposto pago em 2013, para 166 milhões de euros no ano passado. Este montante representa um crescimento de 35% face aos 123 milhões de euros reportados em 2015, e que são relativos ao imposto liquidado no ano anterior.

O valor surge nas estatísticas de IRS até 2015, divulgadas pela Autoridade Tributária, onde está classificado como despesa fiscal. Na verdade, o montante não traduz uma despesa do Estado português, mas faz as contas à diferença entre o que seria cobrado se estes contribuintes pagassem as taxas normais para o seu rendimento, ou seja, se fossem portugueses. O impacto na receita fiscal da vinda destes residentes acaba por ser positivo, porque pagam impostos sobre rendimentos gerados em Portugal, por exemplo mais valias, para além das taxas associadas ao consumo. Há ainda impactos importantes nas economias locais, no mercado imobiliário e na reabilitação urbana.

O aumento deste valor acompanha o crescente número de residentes estrangeiros com direito a um regime fiscal favorável em Portugal. Dados fornecidos ao Observador pelo Ministério das Finanças mostram um crescimento constante nos novos residentes, sobretudo a partir do ano de 2014. Só no ano passado houve 6.000 novos pedidos, existindo neste momento registados 10.684 residentes não habituais.

Os rendimentos recebidos nos países de origem ficam isentos ou beneficiam de taxas mais baixas. A política fiscal mais agressiva de alguns estados-membros da União Europeia na captura de impostos de não residentes tem causado algum mal-estar entre os políticos europeus. Recentemente, foi noticiado o desagrado sobre este tema manifestado pela ministra das Finanças da Suécia ao colega português, Mário Centeno.

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O regime foi criado em 2009, mas tem vindo a ganhar cada vez mais adeptos, à medida que Portugal entra no mapa dos destinos procurados por este tipo de contribuintes muitas vezes reformados. E não apenas por razões fiscais. O clima, a segurança, a qualidade de alguns serviços e infraestruturas e o custo de vida relativamente baixo, são outros fatores que atraem cada vez mais estrangeiros.

O regime de residente não habitual só é atribuído a quem não tenha sido residente nacional nos últimos cinco anos e é válido por um período de dez anos não renovável que pode não ser seguido. Para beneficiar, é necessário permanecer por mais de 183 dias seguidos num ano no território nacional e possuir uma habitação (comprada ou alugada) que mostre a intenção de estabelecer em Portugal a sua residência permanente.

O regime dos estrangeiros residentes é o principal fator que explica a subida da despesa fiscal do Estado em IRS no ano de 2015, que cresceu cerca de 9% para 562 milhões de euros. Ainda mais significativos foram os acréscimos na despesa fiscal com a dedução do IVA suportado em fatura e os PPR (Planos Poupança Reforma), mas estas despesas têm menos relevância financeira.

Quociente familiar e reforma do IRS fizeram subir deduções e baixar receita

As deduções à coleta relativas ao ano de 2015 ascenderam a 3.201 milhões de euros, representando 31,7% do IRS liquidado. Este valor representa um crescimento de 15% face aos 2.791 milhões de euros verificados em 2014, o que coincidiu com a entrada em vigor das novas deduções para despesas familiares e gerais.

As estatísticas de 2015 mostram um ligeiro alívio na carga fiscal suportada pelos contribuintes portugueses com o rendimento dependente a baixar de 12,87% em 2014 para 12,23%. Estes valores não incluem, contudo, o impacto da sobretaxa de IRS que ainda está em vigor para os escalões de rendimentos mais altos.

O IRS liquidado caiu 4,15% para 10.088 milhões de euros em 2015. Esta evolução “é em grande medida explicada pelas alterações introduzidas pela reforma do IRS, com particular destaque para a introdução do quociente familiar e para o aumento dos limites das deduções à coleta”. O único escalão que não contribuiu para esta queda foi aquele que abrange os rendimentos mais altos, superiores a 250 mil euros, que registou um acréscimo de 10,15%.

Num universo em que 48,23% dos contribuintes não paga IRS, o grosso da receita do imposto é conseguido nos escalões acima dos 19 mil euros de rendimento bruto por ano, com os rendimentos entre 40 mil e os 100 mil euros brutos a contribuir com 40,6% da receita liquidada. Nestas categorias estão cerca de 342 mil famílias.