Passaram uma época a defender as mesmas cores mas, no Mundial, estão em lado diferentes da barricada. Esta terça-feira, Bélgica e França disputam o acesso à final do campeonato do Mundo, num encontro que contará com caras bem familiares em ambas as equipas, habituadas a remarem para o mesmo lado ao invés de medirem forças. Mas é o que vai acontecer com 20 dos 46 atletas presentes na ficha de jogo da meia final realizada no Saint Petersburg Stadium: em duelos mais ou menos diretos, irão defrontar companheiros de clube que, desta feita, estarão do outro lado do campo. 

E o duelo até começa no banco: Didier Deschamps, selecionador nacional francês, foi campeão do Mundo em 1998 numa seleção francesa que contava com… Thierry Henry, a ex-estrela que hoje se senta no banco belga como adjunto de Martinez. Mas, se o seu papel será importante até ao início do jogo, quando se der o apito inicial, todas as atenções recairão sobre os jogadores. E, dentro de campo, para além de intervenientes de superior qualidade, não faltarão possíveis encontros individuais para seguir em paralelo ao resultado que ditará o destino conjunto de cada seleção.

E é nesta altura que recorremos à opinião de quem sabe do que fala. Na sua coluna no jornal inglês The Guardian, Marcel Desailly, ex-internacional francês e uma das caras mais marcantes do Chelsea pré-Abramovich, destaca um duelo em particular: Fellaini vs. Pogba. Companheiros de equipa no Manchester United, percorreram caminhos diferentes no Mundial para, ao dia de hoje, chegarem a uma meia final comum. O médio belga começou a prova no banco, falhando a titularidade em jogos onde a Bélgica se concentrava nos processos ofensivos, como os encontros com a Tunísia ou o Panamá. Saltou para o onze frente à seleção inglesa, para voltar a sentar-se frente ao Japão – aí, Fellaini entrou aos 65′ e marcou aos 74′ o golo que daria o empate à Bélgica, antes de Chadli confirmar a reviravolta frente aos nipónicos. 

Pogba e Fellaini fizeram muitas vezes dupla no meio-campo do Manchester United. No Mundial, serão adversários (Créditos: Getty Images)

Nos quartos, voltou a ser titular contra o Brasil e foi preponderante na consistência apresentada pelo meio campo belga. “Taticamente, a Bélgica parece mais equilibrada com o Fellaini num papel de contenção. Teve um grande jogo contra o Brasil e é um jogador muito melhor do que muitas pessoas pensam”, defendeu Marcel Desailly, acrescentando: “O Brasil nunca o conseguiu ultrapassar. Tem pés rápidos para um jogador tão grande”. Pelas características do encontro e semelhanças entre a capacidade ofensiva gaulesa e canarinha, é de prever que Martinez volte a lançar Fellaini ao lado de Witsel e De Bruyne, fortalecendo o meio campo belga. 

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Já Pogba foi sempre dono e senhor do meio-campo francês. A estrela que se transferiu da Juventus para Manchester é uma das figuras basilares da França de Deschamps e encontrará em Fellaini um dos maiores obstáculos deste Mundial. “Escrevi antes que o Pogba precisava de controlar a sua exuberância natural para o bem da equipa e penso que ele tem feito isso extraordinariamente bem nas últimas duas partidas, frente a Argentina e Uruguai”, afirma Desailly, continuando: “De uma forma inteligente, ele percebeu que a França pode contar com o Mbappé e o Griezmann para desbloquear jogos e que, assim, o seu papel é dar equilíbrio à equipa, num meio campo a dois com o incansável Kanté”.

Por falar em Kanté, a formiguinha trabalhadora deste meio campo gaulês é outro dos atletas que se irá cruzar com companheiros de equipa neste duelo francófono. Do outro lado da barricada estarão Hazard e Giroud, também eles jogadores do Chelsea, dispostos a levar a melhor sobre a equipa de Kanté. O médio francês e Hazard até poderão protagonizar alguns duelos individuais, já que é previsível que o mago belga surja no raio de ação defensiva de Kanté várias vezes ao longo da partida. Na baliza belga encontra-se Courtois, guarda-redes titular do Chelsea, que estará preparado para defender toda e qualquer tentativa de golo vinda do companheiro Giroud. Entre Bélgica e França, os duelos londrinos estarão ao rubro.

No Chelsea, Kanté corre o dobro para compensar as perigosas subidas de Hazard; frente à Bélgica, o francês terá de correr ainda mais se quiser apanhar o mago belga (Créditos: Getty Images)

Ainda em Londres, Lloris é o número da baliza do Tottenham e da seleção francesa, mas terá do outro lado três adversários especiais e, um deles, até sabe o que é marcar neste Mundial: Jan Vertonghen marcou o primeiro golo belga contra o Japão e terá a companhia de Toby Alderweireld e, talvez mais para a frente no jogo, de Moussa Dembelé. Todos eles jogam nos Spurs e serão protagonistas de reencontros em São Petersburgo.

Em Manchester, para além do supracitado duelo entre Fellaini e Pogba, Lukaku é um nome a ter em conta nesta meia final. O possante avançado do United é titularíssimo na frente de ataque belga e será a principal arma apontada à baliza de Lloris. Dos Red Devils para o City, De Bruyne será o motor do meio campo belga e olhará para o banco francês para encontrar o seu companheiro de equipa nos Citizens, o lateral esquerdo Benjamin Mendy. 

Foram vários os golos comemorados em conjunto entre por Meunier e Mbappé, mas no final da partida entre França e Bélgica só um terá razões para festejar (Créditos: Getty Images)

Umtiti e Dembelé, companheiros de equipa no Barcelona, poderão também protagonizar um duelo interessante, ao passo que o belga Meunier irá dar de caras com Mbappé, prodigioso avançado francês, que milita no Paris Saint-Germain, tal como o belga. Kimpembe e Aréola são os outros nomes do conjunto parisiense presentes nos 23 de Deschamps, mas será pouco provável que entrem em campo.

“Jogar contra o teu companheiro de equipa num jogo internacional, ou vice-versa, é uma situação estranha. Acontece e nem sempre é fácil para os jogadores. Lembro-me de um jogo contra o Thierry Henry em que ele me estava a dificultar a vida”, explicou Desailly, revelando: “Na celebração de um golo, sugeri-lhe calmamente que mudasse de flanco porque estava a ficar irritado e não queria correr o risco de o aleijar. Ele mudou e tudo se resolveu”. É pouco provável que Mbappé mude de lado só porque Meunier pediu ou que Hazard seja menos virtuoso com receio de que Kanté o aleije, mas a verdade é que serão vários os duelos e diálogos a ter em conta neste encontro entre franceses e belgas. E sabem o que se costuma dizer: “amigos, amigos, negócios à parte”. E não há negócio mais importante para estas duas seleções do que carimbar o acesso à final do Mundial.