O Brasil acordou esta segunda-feira, um dia depois das muito antecipadas eleições presidenciais, com a certeza de que regressa às urnas no próximo dia 28 para decidir finalmente quem é o próximo Presidente brasileiro. Jair Bolsonaro conquistou 46% dos votos, Fernando Haddad foi o escolhido por 29% dos eleitores.

Os principais jornais brasileiros dedicaram os editoriais desta segunda-feira ao resultado das eleições presidenciais e abordaram o tema com preocupações similares. Folha de S. Paulo, O Globo e Estado de S. Paulo apontam principalmente duas ideias comuns: a “radicalização” do discurso e do eleitorado e a rejeição ao PT.

“A oposição ao PT é um dos vértices do espaço de radicalização que se abriu nestas eleições, entre direita e esquerda”, escreve o jornal O Globo, que acrescenta que “entrou em ação de maneira clara uma das características desta eleição, o voto antipetista” que, “se somado, deve representar hoje a força política mais poderosa no Brasil”. A Folha diz que “se as eleições municipais de 2016 já mostravam uma guinada conservadora do eleitorado, agora caminhou-se mais à direita — e com rejeição a líderes mais tradicionais”.

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O Estado de S. Paulo justifica a ideia de radicalização do discurso político com o facto de que, “pela primeira vez desde a redemocratização do país, não haverá um candidato de centro na etapa final da disputa”. O jornal, cujo editorial tem o título “Uma escolha muito difícil”, vinca que “a campanha, que deveria servir para iluminar um pouco mais as propostas em jogo, provavelmente servirá para aumentar ainda mais os antagonismos, as indefinições e as confusões que, afinal, garantiram a passagem de Bolsonaro e Haddad para o segundo turno”.

Além da descrição dos motivos que terão levado à polarização dos votos, os três jornais brasileiros guardaram palavras muito duras para as campanhas dos dois candidatos e para as propostas — ou a falta delas — que Jair Bolsonaro e Fernando Haddad apresentaram até este domingo. A Folha de S. Paulo descreve o discurso do candidato de Bolsonaro como “uma pregação tosca, de tons frequentemente autoritários, e um programa ultraliberal encampado na última hora” e refere que Haddad “se amparou exclusivamente no prestígio do líder único e imutável na legenda [Lula da Silva] — que não fez a autocrítica pela corrupção em seus governos nem soube oxigenar o seu pensamento económico”.

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“Por diversos motivos, não se debateram propostas objetivas. Em alguns casos, porque não foram formuladas. Ou, se existiam, deixaram de ser divulgadas”, acrescenta o jornal O Globo, que embora aponte Bolsonaro como “o exemplo mais evidente”, recorda que o candidato do PT herdou um programa eleitoral construído por e para Lula da Silva “com um viés de radicalismo com o qual Haddad parece não concordar”, como é o caso da convocatória de uma Assembleia Constituinte. Já o Estado de S. Paulo lembra que, “nas poucas vezes em que foi questionado sobre o assunto [propostas] durante a campanha, em entrevistas ou debates”, Bolsonaro respondeu com “frases feitas, com pouco sentido”, enquanto Haddad se propõe a “desfazer privatizações, restaurar o regime de exploração do petróleo que arruinou a Petrobrás e acabar com a reforma trabalhista, entre outras barbaridades”.

Folha de S. Paulo, O Globo e Estado de S. Paulo terminam os respetivos editoriais com conselhos e ressalvas para os eleitores: o primeiro garante que “um segundo turno radicalizado não será a melhor chance para que ambos demonstrem a sua capacidade de governar”; o segundo afirma que “a disputa entre Bolsonaro e Haddad simboliza a radicalização no choque entre direita e esquerda”; e o terceiro sublinha que “não é possível governar com base no rancor” e acrescenta que “quem se eleger governará todo o país, e não apenas a sua patota”. Apesar de tudo, O Globo é mais optimista sobre o que se tem passado: “Com alguns percalços — resistência do PT a se submeter ao Judiciário, declarações exóticas, algumas retificadas, da chapa Bolsonaro-Mourão —, o primeiro turno transcorreu como se espera num país estável institucionalmente”.