Quando Cristiano Ronaldo foi expulso em Valência e saiu em lágrimas, ninguém sabia ao certo o castigo que o avançado poderia levar. Um jogo, dois jogos, três jogos? A questão nem passava tanto pela ausência do avançado das opções da Juventus – faz sempre diferença ter um jogador que foi considerado cinco vezes o melhor do mundo, mas digamos que o plantel de Massimilano Allegri não é propriamente magro em quantidade e qualidade… – mas sim pela presença ou não no jogo da terceira jornada. Que lá foi confirmada: o português falhou a receção ao Young Boys (3-0 com hat-trick de Dybala) mas ficou habilitado para participar num dos jogos que, face a todo o simbolismo, era dos mais aguardados desta fase de grupos da Champions.

As conferência de imprensa de antevisão realizam-se na sala 7 de Old Trafford, como é normal nos encontros europeus. É lá que estão imagens gigantes de antigas glórias que representaram o Manchester United com aquela camisola, casos de George Best, Eric Cantona, David Beckham e, como não poderia deixar de ser, Cristiano Ronaldo. Junto da imagem do português, algumas das frases que foram sendo proferidas e que o tornaram no Deus que é hoje para os red devils: “A sua velocidade e a sua potência são incríveis”, “É uma máquina de fazer golos, quer sempre mais”, “Faz coisas que mais ninguém faz”. Perante este contexto, José Mourinho, hoje treinador dos ingleses que orientou o avançado três anos no Real Madrid, prestou também a sua vénia. “O que acho dele? Creio que está a um nível em que não precisa deste tipo de perguntas nem de respostas. É um dos melhores jogadores de todos os tempos, ninguém pode dizer nada de muito diferente. Tão simples como isso”, atirou.

Cristiano Ronaldo: “Eu sei que sou um exemplo, dentro e fora do relvado”

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Do outro lado, além de Allegri, falou… Cristiano Ronaldo. Perante tudo o que foi escrito nas últimas semanas, poderia pensar-se que o capitão da Seleção preferia passar ao lado da antevisão do encontro mas foi ele, ou Ele em terras de Sua Majestade, que projetou o jogo. E também foi sobre isso que menos falou: do caso da alegada violação em 2009 nos Estados Unidos à crise que assola o Real Madrid na primeira época sem o número 7, o avançado não fugiu a nenhuma pergunta. “Sou um exemplo a 100% fora e dentro de campo. Estou sempre a sorrir, sou feliz. Jogo num clube fantástico, tenho uma família maravilhosa, quatro filhos, tenho tudo! O resto não me perturba, a verdade vem sempre ao de cima nestes casos”, destacou, antes de comentar de forma emotiva este regresso a Old Trafford: “No dia do sorteio vieram-me logo à memória os títulos que ganhei no Manchester United, os incríveis adeptos do clube e uma pessoa que jamais esquecerei, Sir Alex Ferguson”.

Ronaldo deu conferência na sala 7 de Old Trafford, onde tem uma imagem sua a encher quase uma parede (Jan Kruger/Getty Images)

Paul Pogba, referência do meio-campo do Manchester United, ia rever a antiga equipa, Juventus. Mas a única coisa que se falava era mesmo o regresso de Cristiano Ronaldo a Old Trafford pela sua nova formação. E com algumas histórias à mistura, como por exemplo o dia em que o avançado então no Real Madrid visitou os red devils e Ferguson pediu para o speaker apresentar primeiro a equipa da casa e só depois os visitantes com o número 7 em último lugar, tentando mexer com a cabeça do cinco vezes Bola de Ouro. Claro está que não resultou – foi dele o golo da vitória que decidiu a eliminatória.

Desta vez não houve troca mas nem por isso deixou de aparecer um fenómeno paralelo logo aos 3′: um adepto decidiu não esperar pelos últimos minutos e invadiu o relvado, numa ação que lhe correu mal mas que acabou com José Mourinho às gargalhadas com o homólogo italiano, Massimiliano Allegri. No entanto, não haveria muitas mais razões para o português rir nos minutos seguintes perante o domínio na posse, na circulação e no controlo do jogo pela Vecchia Signora, que surpreendeu com uma nuance tática onde não era Ronaldo que andava mais na zona central do ataque mas sim Dybala. E seria mesmo a Jóia, como também é conhecido, a inaugurar o marcador e a celebrar com a habitual mascarilha feita com a mão (17′).

Numa jogada de envolvimento, Ronaldo procurou o espaço e não a bola, cruzou da direita ao primeiro poste, Cuadrado não conseguiu desviar para a baliza e o argentino, com uma autoestrada aberta no centro da área, só teve de empurrar para o primeiro golo. E se o Manchester United já tinha entrado nervoso e até mais receoso em não permitir transições contrárias do que propriamente procurar as mesmas nas costas da defesa da Juve, a partir daí ficou pior: os italianos dominaram como quiseram até ao intervalo e só por intervenção de David De Gea e algum azar à mistura é que a vantagem mínima se manteve.

Rodrigo Betancur deixou um aviso inicial aos 22′ para defesa do guarda-redes espanhol e ficou mais perto do golo na sequência de um canto, quando cabeceou ligeiramente por cima da trave (30′). Depois, e na única tentativa do português ao longo da primeira parte, De Gea defendeu um livre direto para a frente como conseguiu e, na recarga, fez a defesa da noite a recarga de Matuidi (38′) que no seguimento do lance ainda voltou a ameaçar. Pouco depois, numa transição, Dybala conseguiu sair de novo em velocidade e rematou perto do poste (42′, quando as atenções dos defesas estavam centradas no movimento de Ronaldo). 67% de posse de bola, 8-1 em remates e os cinco jogadores com mais passes a serem os centrais e os três médios da Juventus contavam da melhor forma em números aquilo que se tinha escrito numa primeira parte de sentido único.

Mourinho já tinha dado nas vistas antes do encontro, quando se fartou de esperar no trânsito, não quis arriscar nova multa da UEFA, desceu do autocarro e foi o resto do caminho a pé para o estádio. “Já sabem que mudámos de hotel, fica ao virar da esquina. Os jogadores estão no autocarro há 45 minutos mas eu vim pelo meio dos adeptos e ninguém me reconheceu. Demorei dois minutos. Os jogadores não o conseguiram fazer em 45 minutos”, explicou. Perante o cenário da primeira parte, a ideia era precisamente a contrária – teria de dar nas vistas por uma qualquer solução estratégica ou recorrendo aos suplentes para poder inverter o rumo dos acontecimentos, claramente favorável aos transalpinos. Mas esta Juventus é realmente uma série candidata a meter-se na luta pela vitória na Liga dos Campeões.

Mourinho, farto do trânsito, abandona o autocarro e vai a pé para o estádio

Martial, com duas aproximações mais perigosas à baliza contrária (a segunda resolvida com um fantástico corte de Bonucci), ainda deu a ilusão de que algo diferente podia acontecer mas, se não fosse De Gea, tudo poderia ficar quase sentenciado aos 52′: remate na passada de Ronaldo ao ângulo e fabulosa defesa do guarda-redes espanhol, quase vingando o hat-trick do português (com algumas culpas próprias pelo meio) na primeira partida do Mundial da Rússia. O certo é que, com o tempo, foram os ingleses a colocar o jogo no único ponto possível para o empate, com maior risco de sofrer transições mas colocando um maior número de unidades nas ações ofensivas, incluindo zonas de pressão dos centrais a meio do meio-campo da Juventus.

Vontade não faltava aos red devils, mesmo de forma atabalhoada em algumas ocasiões, o que valeu assobios em Old Trafford. O certo é que, por linhas algumas vezes tortas, o Manchester United conseguiu encostar mais atrás os setores da Juventus e teve mesmo uma oportunidade flagrante, quando Pogba rematou colocado de pé esquerdo e acertou no poste direto da baliza de Szczęsny, que viria ainda a levar com a bola na cara antes de ser aliviado o perigo (75′). Martial, a um minuto do final do tempo regulamentar, teve o último remate de fora da área mas saiu fraco e fácil para o guarda-redes polaco.

Na conferência de imprensa antes do jogo, tudo foi notícia à volta de Ronaldo. Incluindo o relógio que trazia no pulso, da gama Caviar Tourbillon da marca Jacob & Co, avaliado de acordo com o jornal As em dois milhões de euros. No meio de tanto alarido, muitos esqueceram-se da outra Jóia que estava em campo, Dybala, o argentino que leva cinco golos nos últimos quatro jogos da Liga dos Campeões e que voltou a ser decisivo para a caminhada 100% vitoriosa da Juventus na prova aproveitando o posicionamento como falso ‘9’ como tantas vezes Guardiola fez no Barcelona com o compatriota Lionel Messi.