A investigadora e docente universitária Egna Sidumo defendeu esta quinta-feira que as negociações de paz em Moçambique, entre o governo e a oposição, devem garantir condições para haver eleições livres, de forma a evitar novos conflitos.

A ausência de responsabilização dos atores nos episódios de conflito e a falta de um processo de reconciliação nacional são outras lacunas, referiu.

“Um dos principais problemas que nos leva a ter conflitos são os resultados das eleições. Há condições para termos eleições livres?”, questionou, frisando que o país está a “escamotear a verdade em nome de uma paz que pode não ser douradora porque não resolve os principais problemas”.

Segundo refere, estão a cometer-se “os mesmos erros” da assinatura do Acordo Geral de Paz de 1992 e do Acordo de Cessação de Hostilidades Militares de 2014, porque são “consensos com linhas muito ténues”, referiu.

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“É inconcebível que, depois de eleições, os moçambicanos vivam sempre com medo de um novo clima de tensão”, lamenta a docente universitária e pesquisadora do Centro de Estudos Estratégico da Universidade Joaquim Chissano.

Nas mais recentes eleições, as autárquicas de outubro de 2018, observadores e partidos da oposição, Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) e Movimento Democrático de Moçambique (MDM), denunciaram episódios de irregularidades, refutados pelo partido no poder, a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo).

A apresentação de queixas nos tribunais foi travada na generalidade dos casos por questões legais, que impediu os denunciantes de verem averiguada a matéria de facto, e, num balanço final do processo eleitoral, a embaixada norte-americana em Maputo (membro do grupo de contacto para a paz) recomendou que sejam feitas emendas a tempo das eleições gerais de 15 de outubro deste ano.

Além de ser necessário estabelecer garantias de eleições livres, Egna Sidumo considera que a falta de responsabilização, mesmo que simbólica, dos atores dos últimos conflitos, contribui para que pessoas voltem a pegar em armas para resolver diferenças, na medida em que “se acomodam na ideia de que não há consequências”.

“Os dois acordos que tivemos foram todos acompanhados por leis de amnistia, que são importantes para a confiança no processo negocial, mas é preciso que as pessoas que cometeram irregularidades [dos dois lados] sejam responsabilizadas”, defendeu.

A investigadora entende ainda que o país precisa de uma reconciliação nacional que envolva todos os segmentos da sociedade moçambicana.

“Uma reconciliação nacional implica, primeiro, que as partes se reconheçam como parte do mapa político moçambicano, sobre o qual têm responsabilidades”, concluiu Egna Sidumo.

O atual processo negocial entre o governo moçambicano e a Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) arrancou depois do cessar-fogo declarado em dezembro de 2016 pelo principal partido da oposição.

Como resultado das conversações, foram feitas alterações à Constituição em 2018 para acomodar acordos sobre descentralização com os quais a Renamo aspira ganhar lugares na governação provincial e arrancou um processo (ainda em curso) de desmilitarização, desarmamento e reintegração dos guerrilheiros do braço armado da oposição.