A relação com o seu antecessor Mariano Rajoy, os bastidores da moção de censura que o derrubou e as suas conversas nos corredores da política espanhola nos últimos anos. A dois meses das eleições legislativas em Espanha – as terceiras em menos de quatro anos –, estes são os temas que o primeiro-ministro Pedro Sanchez decidiu partilhar com o público num livro que estará à venda a partir desta terça-feira.

Em “Manual de Resistencia”, o secretário geral do PSOE destaca as reuniões que manteve com Rajoy na véspera da celebração do referendo para a independência da Catalunha, a 1 de outubro de 2017,  e da consequente aplicação do artigo 155, que determina que a gestão da Catalunha continue a ser feita a partir do governo central em Madrid.

Sanchez explica que naquele ano, durante o mês de agosto, encontrou-se várias vezes com o então presidente do governo Mariano Rajoy para garantirem que “o PSOE se oporia a qualquer tipo de referendo ilegal ou referendo unilateral que quebrasse a ordem constitucional”. Diz que o PSOE defendeu inequivocamente o Estado e que o próprio Rajoy lhe garantiu dar “grande importância à transmissão da normalidade à opinião pública internacional” para não inflamar a “vitimização independentista”. Ainda assim, Sanchez conclui que no final daquele mês Rajoy ainda pensava que era possível “redirecionar o debate político após o 1-O [1 de outubro]”. Algo que pareceu a Sanchez “uma ilusão”, como escreve o El Español.

Catalunha. O dia depois da independência

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Em público, Mariano Rajoy defendeu sempre a aplicação do Artigo 155 e chegou a justificar que o aplicou por ser “o Presidente de Governo de Espanha!”, sendo a única forma de restabelecer “a ordem legal e democrática”. “Foi isso que aconteceu e não outra coisa. Penso que isso se entende muito bem”, disse em público meses mais tarde. Mas não foi sempre essa a sua convicção, segundo revela agora o seu sucessor Pedro Sanchez no livro: “Nem ele me falou na altura em aplicar o artigo 155 nem eu o vi com grande ânsia em fazê-lo. Acordámos que atuaríamos de forma coordenada e ele comprometeu-se a consultar-nos nos passos que o Governo desse”.

O governante descreve o processo da independência da Catalunha como um ciclo de mais de cinco anos em que Rajoy “sempre preferiu reagir aos atos independentistas em vez de tomar uma iniciativa”. E reconhece que a questão catalã que chegou a aproximá-los, fazendo-os ganhar confiança, acabou por afastá-los. E essa cisão começou logo no dia 1 de outubro, o dia do referendo. “Rajoy afirmava que não ia haver urnas e enganou-se”, diz. A atuação das forças de segurança naquele dia na Catalunha e os passos que o Governo deu de seguida — acossado por casos de corrupção no seio do governo que foram sendo tornados públicos — acabou por distanciar os dois políticos e levar Sánchez a chefiar o Governo, apoiado pelos partidos nacionalistas e pelo Podemos, depois da moção de censura.

No livro, Sanchez revela também algumas conversas com o líder do Ciudadanos, Albert Rivera, que rotula como uma pessoa “não fiável” por causa do seu comportamento na moção de censura que derrubou Rajoy. “Na segunda-feira que antecedeu a moção falo com Pablo Iglesias. Ao mesmo tempo, envio uma mensagem a Albert Rivera para pedir-lhe que falássemos. Ele responde-me que o melhor era falar com o seu homem de confiança, José Manuel Villegas e José Luis Ábalos e que se houvesse algo mais importante falavam os dois depois. A mim parecia-me que uma mudança de Governo era o tipo de questão de máxima importância que devíamos abordar com os líderes dos respetivos partidos, mas enfim. Nesse mesmo dia, Rivera começa a contar à imprensa que não o tinha chamado porque queria fazer um pacto com os independentistas e romper Espanha. Intoxicação pura e dura. Depois de se ter negado a encontrar-se comigo, acusa-me de não o ter chamado: é o tipo de comportamento que converte as pessoas em não fiáveis”.