Aumentar a representação no Parlamento Europeu“. Era este o objetivo do Bloco de Esquerda para estas eleições europeias. Assim mesmo: sem números, sem nomes. Apenas uma frase aberta, sem uma interpretação única e que permite fazer uma gestão mais cautelosa das expetativas. Partindo de um mau resultado em 2014, onde elegeram apenas um mandato, os bloquistas assumiram assim o objetivo mínimo: a eleição de um segundo eurodeputado para “fazer companhia” a Marisa Matias em Bruxelas. Tudo o que viesse depois de atingido esse desiderato seria bónus.

O Bloco de Esquerda estabeleceu o seu quartel-general para a noite eleitoral no Teatro Thalia, em Lisboa. Pouco antes das 19h00 já se tinha percebido que a plateia ia estar bem composta. Os sorrisos na cara dos responsáveis bloquistas deixavam antever o otimismo e a esperança com que o partido aguardava a chegada dos resultados. As sondagens que foram sendo publicadas ao longo da última semana previam a eleição de um segundo eurodeputado e, talvez, de um terceiro. “Faz a barba, ó Sérgio!”, ouviu-se na sala — uma referência para a possibilidade de Sérgio Aires, número três da lista do BE, também estar entre os eleitos.

A confiança tinha tomado conta dos ânimos da caravana do BE a meio da campanha e também dos apoiantes que se concentraram este domingo para acompanhar a noite de eleições. Quando as primeiras projeções surgiram  às 20 horas em ponto nas três televisões que estavam penduradas na parede da sala principal, houve aplausos e gritos de festejo. Confirmava-se que o BE tinha conseguido aumentar a sua representação em Bruxelas. Mas havia mais vitórias: afirmava-se como terceira força política em Portugal e ainda podia disputar o terceiro eurodeputado. A partir daqui a noite já estava ganha, restava apenas perceber qual seria a dimensão da vitória.

Numa sala privada, desde as 19h00, Marisa Matias e Catarina Martins estavam reunidas com o núcleo duro da candidatura para analisar os resultados e preparar as primeiras reações. Mariana Mortágua, Jorge Costa ou José Gusmão eram alguns dos bloquistas que iam acompanhando o resultado junto das dirigentes bloquistas. Por esta altura, temia-se a repetição das europeias de 2009, em que a disputa pelo último eurodeputado se estendeu pela noite dentro e só se confirmou no dia seguinte. Dessa vez o último mandato acabou por cair para o Bloco de Esquerda, que acabou por eleger o número três da lista, Rui Tavares.

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Com o site oficial das eleições aberto e com as projeções das televisões, iam-se fazendo contas. Retirou-se cedo a primeira conclusão: não era possível garantir a eleição do terceiro deputado. A primeira reação devia ser cautelosa.

[Difamações, frustrações e outras lamentações. A noite eleitoral num minuto]

O diretor de campanha, Jorge Costa, tinha como missão passar a mensagem de que o Bloco de Esquerda tinha tido uma vitória importante e que tinha contribuído para “a derrota profunda da direita”. Mais do que isso era impossível às 20h15, hora a que o deputado subiu ao palco para falar aos apoiantes. Sobre o terceiro eurodeputado todas as reservas eram poucas e, sempre que a questão fosse colocada, era importante recentrar os holofotes, colocando-os sobre crescimento do partido e o reforço da representação.

A aplaudir o discurso ao fundo da sala estava Ricardo Robles. O ex-vereador da Câmara Muncipal de Lisboa que pediu a demissão na sequência da polémica do seu prédio em Alfama tinha estado fora das ações públicas do partido desde então — julho do ano passado. O embaraço para os bloquistas tinha sido grande e nem à Convenção do BE de novembro o ex-autarca foi. Apareceu na noite eleitoral, tentando passar pelos pingos da chuva para não ser notado. E fê-lo numa noite escolhida a dedo: uma noite de vitória para o partido, em que a festa se ia sobrepor a qualquer estranheza com a sua presença e com a distância temporal devida. Com isto, o foco nunca se colocou sobre o seu reaparecimento público mas sim sobre o bom resultado do Bloco de Esquerda.

Ao longo da noite, Ricardo Robles foi sendo cumprimentado por várias pessoas e abraçado por outras. A sua receção também parece ter beneficiado do entusiasmo que a vitória do partido gerara sobre os apoiantes.

Com o avançar da noite, os números foram sendo mais sólidos e permitiam um novo olhar. Tinha chegado a altura de a própria candidata se dirigir à plateia. Recebida com bandeiras no ar e com a plateia a cantar o seu nome, Marisa Matias não teve como não começar o seu discurso com um agradecimento aos que votaram no partido, personalizados pela plateia que enchia a sala do Teatro Thalia.

“O Bloco de Esquerda afirma-se como a terceira força política em Portugal e consegue aumentar a sua representação. Cumprimos todos os objetivos que traçámos”, celebrou. “O mapa político está a mudar em Portugal e é inegável que houve uma derrota da direita nestas eleições”, acrescentou. Mais do que isto a candidata não podia dizer até porque os números ainda não determinavam se a vitória se cantaria a três ou a duas vozes.

A confirmação chegaria pela voz de Catarina Martins, já depois das 22h30. Por essa altura já se tinha percebido que a disputa pelo último mandato seria entre o PS, que poderia ir ao décimo, e a CDU, que tentava segurar o segundo e com ele a honra no meio da derrota. “Portugal vai ter Marisa Matias e José Gusmão no Parlamento Europeu a defender quem trabalhou e quem trabalha”.

Minutos depois, a sala ficou vazia, com as bandeiras em cima das cadeiras e as televisões ainda a emitir as suas emissões especiais, repletas de analistas que iam fazendo o rescaldo, escolhendo os vencedores e os vencidos desta noite. O BE ficou sempre no primeiro grupo. Por essa altura já não havia apoiantes para fazer recomendações, mas Sérgio Aires, afinal, pode manter a barba como está.