O Kosovo festejou esta quarta-feira com o seu “salvador” Bill Clinton o 20.º aniversário da intervenção da NATO, que pôs termo ao controlo de Belgrado sobre a sua antiga província do sul com maioria de população albanesa.

“Bem-vindo a casa”, proferiu o Presidente do Kosovo, Hashim Thaçi, dirigindo-se a quem ordenou o início dos ataques aéreos da NATO contra a Sérvia em março de 1999 justificados pela “guerra do Kosovo”, e concluídos em 9 de junho com a assinatura do acordo “técnico-militar” de Kumanovo.

Após três meses de bombardeamentos da NATO sem mandato da ONU, o então líder da Sérvia, Slobodan Milosevic, ordenou em 10 de junho a retirada das suas tropas. Dois dias depois, a NATO iniciava a sua operação militar no Kosovo (Kfor), num território com o estatuto de protetorado internacional.

“Amo este país e o facto de ter estado ao vosso lado contra a limpeza étnica e a liberdade vai permanecer uma das grandes honras da minha vida”, disse Bill Clinton perante cerca de 3.000 pessoas em Pristina, onde já tem uma estátua e o nome de uma avenida.

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No seu discurso na praça central Skenderbeu, acompanhado pela então secretária de Estado Madeleine Albrigth e por Wesley Clark, ex-comandante da NATO, Clinton exortou os kosovares a “nunca esquecerem os desafios” que têm pela frente. “É necessária numa nova forma de coragem e paciência para construir o futuro”, disse.

Apesar de ter autoproclamado a independência em 2008, o Kosovo e os seus 1,8 milhões de habitantes ainda não garantiram o pleno reconhecimento internacional. As forças da NATO permanecem no terreno, a par de uma missão civil da União Europeia, e as relações com a Sérvia permanecem muito tensas apesar dos esforços de mediação europeia.

O facto de os dois países serem dirigidos por políticos profundamente envolvidos nos acontecimentos de 1998-1999, que provocou mais de 10.000 mortos, também não ajuda. O Presidente sérvio Aleksandar Vucic era então um aliado próximo de Milosevic, enquanto o seu homólogo kosovar, Hashim Thaçi, liderava a rebelião dos separatistas armados albaneses do UÇK, de confissão muçulmana.

Duas décadas após a retirada da Sérvia de um território que ainda considera o berço da sua nacionalidade e o núcleo da sua religião ortodoxa, a economia permanece muito frágil, com elevados níveis de pobreza e desemprego e grandes deficiências no funcionamento das instituições democráticas, de acordo com os monitores internacionais.

Às operações militares sérvias durante o conflito, que implicaram mortes e deslocamentos forçados de populações, seguiu-se a perseguição dos albaneses às populações sérvia, cigana (rom) e de outras minorias, apesar de ainda permanecerem no território cerca de 120.000 sérvios kosovares, concentrados no norte ou remetidos a enclaves.

O principal problema consiste no “estado de limbo” do Kosovo em termos internacionais. Apesar de a independência de 2008 ter sido legitimada por 115 países, incluindo os Estados Unidos e a maioria dos países da União Europeia (UE), continua a não ser reconhecida pela Sérvia ou seus aliados, Rússia e China, e outros países com peso regional.

E o facto de cinco Estados-membros da UE não terem reconhecido o Kosovo, incluindo Espanha, tem ajudado a Rússia a manter uma situação de “conflito congelado” na região.

Em paralelo, prevalece uma sensação de abandono por parte da designada comunidade internacional. Os kosovares são os únicos cidadãos de um antigo Estado do bloco de leste que não possuem isenção de visto para viajarem em direção aos países da UE apesar da promessa feita a Bruxelas e que Pristina diz ter cumprido, ao assinar um acordo de demarcação de fronteira com o vizinho Montenegro após anos de pressões ocidentais.

A ausência de reconciliação entre Pristina e Belgrado é outro problema central sem resolução. O diálogo iniciou-se em 2011 mas foi interrompido em 2018 após o Kosovo ter imposto tarifas de 100% aos produtos provenientes da Sérvia e da Bósnia-Herzegovina, apesar dos apelos internacionais para levantar ou suspender a medida.

O Kosovo insiste no total reconhecimento do seu estatuto, que lhe permitiria um lugar na Assembleia geral da ONU, algo que continua a não ser aceite pela Sérvia.

Uma troca de territórios, que aparentemente implicaria a cedência pelo Kosovo de enclaves sérvios, ricos em minérios e água, e a entrega pela Sérvia do seu território do sul com maioria de população albanesa foi tentado em 2018 por Vucic e Thaçi.

Mas a ideia obteve uma forte oposição de diversos países europeus e parece ter sido abandonada.

Uma nova conferência regional prevista para Paris em 1 de julho e apoiada pela França e Alemanha deverá tentar convencer Pristina a suspender as suas medidas comerciais dirigidas à Sérvia, mas é pouco provável que conduza a um acordo global entre os dois países.