Os escadotes montados junto às árvores, as paletes de madeira empilhadas e algum barulho de máquinas provam que a construção dos 130 pavilhões que compõem mais uma edição deste ano da Feira do Livro do Porto estão a ser finalizados. O festival literário, cuja programação inclui cinema, concertos, debates, exposições, leituras, oficinas e spoken words, vai arrancar a 6 de setembro e prolongar-se até 22 de setembro, nos Jardins do Palácio de Cristal.

Dez livrarias, 46 editoras e 21 alfarrabistas, cinco distribuidoras e algumas instituições que desenvolvem projetos de edição integram a lista de expositores de um evento que terá Nuno Costa Santos como escritor residente e Eduardo Lourenço como escritor homenageado. Como já vem sendo hábito, cada edição a Feira do Livro do Porto homenageia um escritor português, batizando uma tília com o seu nome na Avenida das Tílias. Depois de Agustina Bessa-Luís, Vasco Graça Moura e José Mário Branco, chega a vez do professor e filósofo ser distinguido.

Feira do Livro do Porto regressa em setembro e homenageia Eduardo Lourenço

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Nuno Artur Silva, argumentista, dramaturgo e antigo administrador da RTP, é o comissário responsável pela programação. “No ano passado, estive cá como convidado numa performance com a Capicua e o André Tentúgal, longe de imaginar que regressaria agora como programador”, afirmou ao Observador.

Focar a programação da feira “no pensamento e nas ideias” de Eduardo Lourenço e não exclusivamente na sua vertente mais literária, foi uma das premissas do responsável, “numa altura em que se debate muito a identidade das comunidades”. Uma das homenagens à obra do filósofo e ensaísta de 96 anos, o documentário “Labirinto da Saudade”, realizado em 2018 por Miguel Gonçalves Mendes, vai passar pela Feira do Livro do Porto em formato conversa/espetáculo. O momento contará com a presença de Pilar Del Rio e Álvaro Siza Vieira, que também participaram no filme, e Noiserv (projeto musical de David Santos), que aqui apresentará um mini-concerto especialmente criado para a feira.

Um dos pontos altos do calendário vem do Brasil. Arnaldo Antunes, músico e poeta conhecido por ser um dos elementos dos Tribalistas, irá partilhar a sua visão artística, social e política sobre o que se vive do outro lado do Atlântico. Num universo também virado para a política, José Eduardo Agualusa, Rui Zink, Isabela Figueiredo e a escritora venezuelana Karina Sainz Borgo irão compor um painel sobre o papel do escritor contemporâneo e a experiência da escrita em tempos conturbados.

No ano em que se comemora o centenário do nascimento de Sophia de Mello Breyner e Jorge de Sena, a correspondência trocada entre ambos será a principal matéria prima de um espetáculo intimista marcado pela leitura ao som de piano. Também Agustina Bessa-Luís, que morreu em junho, será recordada em jeito de provocação pela escritora Hélia Correia. Os 50 anos de vida literária do autor portuense Mário Cláudio darão o mote para uma retrospetiva da sua obra.

Literatura e uma viagem à Lua

Além destes eventos, o comissário Nuno Artur Silva realçou também um debate com Viriato Soromenho Marques, Miguel Poiares Maduro e Bernardo Pires de Lima sobre a importância da discussão sobre o que é hoje a Europa e as suas possibilidades de futuro. Ao Observador, o programador sublinhou as comemorações dos 30 anos da queda do Muro de Berlim, os 20 anos do Euro e “o momento muito especial” atual marcado pelo Brexit e pela crise italiana. O humorista Hugo Van Der Ding irá falar sobre a forma como vemos a Europa, explicando, por exemplo, o que têm em comum Carlos V, Napoleão, Hitler e Jean Monnet.

Os 50 anos da chegada do homem à Lua e os 500 anos do início da circum-navegação de Fernão de Magalhães são outras das comemorações que serão assinaladas, permitindo “olhar o mundo como um todo”. O historiador José Manuel Garcia irá recordar a viagem épica do navegador português, o primeiro a dar a volta ao mundo. Já o debate “Lua: um gigantesco salto para a humanidade com cambalhotas à retaguarda” contará com a presença de Júlio Isidro, o homem que fez o relato do acontecimento na rádio.

A literatura gay em Portugal e a falta de atenção que esta tem recebido serão introduzidos numa lição dada pelo escritor e investigador Eduardo Pitta no dia 8 de setembro, domingo, na Capela de Carlos Alberto. No âmbito da poesia, que continuará este ano a ser uma das grandes apostas do evento, haverá uma conversa entre José Luís Barreto Guimarães e Jorge Sousa Braga, dois poetas portuenses contemporâneos. Além de lerem poemas, Barreto Guimarães e Sousa Braga falarão sobre a sua experiência com este género literário. A habitual iniciativa Quintas de Leitura acontecerá desta vez no Auditório da Biblioteca Almeida Garrett. O recital a várias velocidades terá o músico PZ como um dos protagonistas.

O clima e o futuro ambiental do planeta serão motes de reflexão em dois momentos — um com Nuno Ferrand, diretor da Galeria da Biodiversidade – Centro de Ciência Viva do Porto e outro com Arminda Sousa Deusdado, autora do magazine semanal da RTP “Biosfera”. O programa da Festa do LIvro do Porto inclui ainda cinco exibições de filmes inspirados nas inquietações do pensamento de Eduardo Lourenço no contexto europeu e oficinas de leitura, escrita ou ilustração para os mais novos.

Mais de 88 mil euros de investimento numa “feira que é muito mais do que uma venda de livros”, garante Moreira

Numa conferência de imprensa realizada esta terça-feira, Rui Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto, avançou que o orçamento desta edição da Feira do Livro foi de 62 500 euros para a programação, 88 mil euros de investimento em estruturas e mobiliário e cerca de 15 mil euros em animação. As 87 inscrições que a organização considerou, correspondem a um total de 130 pavilhões, “uma dimensão que queremos preservar anualmente sob pena de estragarmos o espaço”, referiu. Em relação a 2018, ano em que o evento recebeu 300 mil visitantes, a autarquia conta com nove novos participantes, sete editoras, uma livraria e uma nova distribuidora.

Como ficou a Feira do Livro do Porto sem a APEL

Esta é a sexta vez que a feira vai decorrer nos Jardins do Palácio de Cristal. O evento é organizado pela autarquia, depois de esta ter interrompido, em 2013, a parceria que tinha com a Associação Portuguesa de Editores e Livreiros (APEL). “Não quisemos ficar dependentes da APEL, mas não há um conflito nesta matéria. Nós não estávamos interessados em sustentar aquele modelo e a APEL também não estava interessada nas nossas condições”, começou por explicar Rui Moreira esta terça-feira, acrescentando que a autarquia pretendia “fazer um modelo diferente” e “uma feira que fosse mais do que uma venda de livros”. Em declarações aos jornalistas, Rui Moreira fez um balanço positivo “da dimensão transversal”conseguida nos últimos seis anos, concluindo que enquanto for presidente este modelo se manterá.

O programa completo da Feira do Livro do Porto, que decorre de 6 a 22 de setembro, pode ser consultado aqui