Os presidentes russo e turco, Vladimir Putin e Recep Tayyip Erdogan, respetivamente, poderão reunir-se na próxima semana em Moscovo devido ao crescente aumento das tensões na Síria, anunciou esta sexta-feira o Kremlin.

Está atualmente em preparação um possível encontro ao mais alto nível em Moscovo, a 5 ou 6 de março”, declarou o porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, citado pelas agências noticiosas russas.

O avanço das forças de Bashar al-Assad na região de Idlib, último bastião rebelde e “jihadista” na Síria, originou uma crise entre Moscovo, o principal apoio de Damasco, e Ancara, que apoia diversos grupos rebeldes. A ofensiva de Damasco, apoiada pela aviação russa, suscitou fricções entre Ancara e Moscovo, que apesar das posições opostas na Síria têm reforçado a sua cooperação nos últimos anos.

Na quinta-feira, o exército turco registou as suas piores baixas num único ataque desde o início da sua intervenção na Síria em 2016, com a morte de pelo menos 33 soldados em ataques das forças sírias.

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De acordo com a Organização Síria de Direitos Humanos (OSDH), bombardeamentos de represália das forças turcas, entre a noite de quinta-feira e a madrugada desta sexta-feira, provocaram a morte de 20 combatentes do regime sírio. Erdogan e Putin mantiveram uma conversa telefónica esta manhã, onde manifestaram “séria inquietação” face à situação de Idlib, de acordo com um anterior comunicado do Kremlin.

Em 2018, os dois países concluíram um acordo em Sochi (sul da Rússia) que previa o fim dos combates e a instalação de postos de observação turcos na região de Idlib, mas que foi posto em causa nas últimas semanas, com as duas partes a rejeitarem responsabilidades pelo seu fracasso.

Desde 2017 já foram organizadas cinco cimeiras entre Erdogan, Putin e o Presidente do Irão, Hassan Rohani. A última cimeira entre os três dirigentes decorreu em setembro de 2019 em Ancara.

A tensão entre Damasco e Ancara aumentou de forma descontrolada no início de fevereiro, culminando em combates mortíferos entre soldados sírios e turcos na província de Idlib. Na noite de 3 de fevereiro, disparos de artilharia das forças sírias provocam oito baixas do lado turco, e Ancara respondeu com o bombardeamento de posições sírias e pelo menos 13 mortos. De acordo com a OSDH, os primeiros confrontos foram desencadeados após a chegada de uma coluna turca de 240 camiões blindados perto da localidade de Saraqeb, para reforçar os postos de observação turcos na região.

Em Damasco, o comandante das Forças Armadas qualificou de “agressão flagrante” a presença de forças turcas.

Os combates surgiram alguns dias após Erdogan ter acusado a Rússia de “não honrar” os compromissos bilaterais destinados a impedir uma ofensiva de envergadura das forças militares sírias no noroeste do país.

Os bombardeamentos do exército sírio, apoiado por Moscovo, intensificaram-se desde dezembro na região de Idlib, permitindo às forças de Bashar al-Assad retomar diversos setores na província.

Na sequência de novos confrontos militares sírio-turcos, com vários mortos, Erdogan ameaçou em 12 de fevereiro “atacar o regime [sírio] por todo o lado”, acusou Moscovo de envolvimento no “massacre” de civis e denunciou as “promessas que não são respeitadas”.

Por sua vez, Moscovo acusava a Turquia de nada fazer para “neutralizar os terroristas em Idlib”. Já os Estados Unidos, pela voz do representante especial para a Síria, James Jeffrey, afirmava que Washington está “em total acordo com a Turquia” um país que integra a NATO, para “defender os seus interesses vitais face ao afluxo de refugiados e lutar contra o terrorismo”.

Em 14 de fevereiro, é abatido um helicóptero do exército sírio, com a morte da sua tripulação. O disparo foi reivindicado pela Frente nacional da libertação, uma aliança de grupos rebeldes pró-Ancara. Três dias antes, a OSDH tinha atribuído às forças turcas o derrube de outro helicóptero sírio em Idlib, enquanto Erdogan assegurava a intenção de “não recuar o mínimo” face a Damasco.

Na sequência dos mais recentes e graves incidentes, a NATO manifestou a sua solidariedade com Ancara, mas sem assumir compromissos concretos.

Um alto responsável turco evocou ainda a ameaça de permitir a passagem de migrantes e refugiados acolhidos no seu país em direção à Europa. A União Europeia apelou a Ancara para respeitar os seus “compromissos” assumidos no pacto migratório concluído em 2016.